13 Setembro 2011
Os advogados de acusação querem demonstrar que o Vaticano sabia da tendência pedófila do padre e que vários de suas autoridades – incluindo papas – "conspiraram" para encobri-la.
A reportagem é de Andrés Alvarez Beltramo, publicada no sítio Vatican Insider, 12-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Estes são tempos difíceis para os Legionários de Cristo. Além de suportar a vergonha por causa dos escândalos do seu fundador, Marcial Maciel Degollado, e de enfrentar um profundo itinerário interno de reforma, a congregação deve responder à justiça nos Estados Unidos. Eles são acusados de negligência perante as cortes de Connecticut, em uma ação judicial que visa a pôr no banco dos réus altas personalidades do Vaticano.
Trata-se de uma denúncia apresentada no dia 27 de julho de 2010 por José Raúl González Lara (foto), filho biológico do falecido fundador e fruto de uma relação amorosa deste com a mexicana Blanca Gutiérrez Lara. Segundo o texto, González Lara (nascido em 1980) teria sofrido repetidos abusos sexuais entre 1987 e 1998 por Raúl Rivas, um dos pseudônimos usados por Maciel.
Esses ataques teriam provocado "medo" e "severas afetações emocionais" sobre o jovem, situações pelas quais ele exige uma compensação monetária, penas punitivas, assim como "qualquer outra sanção adequada".
Embora os abusos tenham ocorrido em um âmbito privado, quando o imputado se fazia passar por outra pessoa e não estava identificado como sacerdote, os demandantes, de todas as formas, consideram a Legião como negligente por não tê-los evitado.
Os advogados de acusação (da empresa de Jeff Anderson, que ganhou milhões de dólares em julgamentos contra a Igreja norte-americana), além disso, pretendem demonstrar que o Vaticano conhecia a tendência pedófila do padre e que várias de suas autoridades – incluindo papas – "conspiraram" para encobri-la.
Mas talvez poderão não ter sucesso desta vez. Apenas no dia 30 de agosto passado, o juiz Grant Miller, do Tribunal Superior de Hartford, concedeu a eliminação de quatro das sete acusações da demanda contra instituições dos Legionários tanto na Itália quanto nos Estados Unidos. Os outros três procederam.
Na realidade, a denúncia original incluía cerca de 12 acusações, das quais só sete envolviam diretamente órgãos da Legião. As cinco restantes se referiam ao patrimônio econômico de Maciel, razão pela qual os juízes não souberam a quem chamar em causa.
Cada uma das partes deu uma leitura particular da decisão de Miller: enquanto os representantes do instituto religioso expressaram sua satisfação pela remoção das acusações, os acusadores se disseram satisfeitos pelo avanço do processo judicial.
O partido que prosperou da denúncia corresponde a três acusações: "negligência", "retenção negligente" e "negligência em supervisão". Nessas seções, a denúncia acusou os legionários de conhecerem as tendências abusivas ter de seu fundador e de não terem agido para evitá-las, não promulgando normativas contra elas ou deixando de removê-lo do seu cargo. Os membros da congregação foram criticados por não terem se preocupado com as vítimas dos abusos sexuais, incluindo Raúl, para prevenir ou reduzir os danos.
A página seis da exposição de motivos da denúncia estebelece que "os legionários sabiam ou deveriam saber que Maciel tinha um filho, porque ele usou fundos legionários para manter Raúl e sua família. Os legionários sabiam ou deviam saber que Maciel usou propriedades ou instalações dos legionários para favorecer seus abusos sobre Raúl".
Nessa seção, o Vaticano e João Paulo II também foram envolvidos, argumentando-se que, em 1989, o ex-legionário Juan Vaca enviou uma carta pessoal ao papa para pedir sua dispensa de seus votos clericais para contrair matrimônio pela Igreja.
Essa carta teria incluído a história dos abusos sexuais cometidos pelo fundador contra ele e outros, enquanto em 1993 a Congregação para a Doutrina da Fé teria lhe concedido a dispensa, mas sem mencionar os episódios pedófilos.
"Entre 1950 e 2002, o padre Maciel, os papas anteriores, o Vaticano e seus oficiais conspiraram para ocultar o conhecimento dos crimes de Maciel, incluindo repetidos abusos sexuais de menores", afirmou-se.
Com base nesses argumentos e em algumas outras cartas, o escritório de advocacia de Lara – que em 2010 exigiu dos legionários 26 milhões de dólares para não revelar publicamente a sua história – já anunciou que buscará processar altas autoridades da Sé Apostólica.
Por sua vez, a estratégia dos defensores da Legião será guardar silêncio publicamente e demonstrar que, ao desconhecer a existência de um filho do sacerdote, não estavam em posição de evitar os abusos. Em todo o caso, a via judicial continuará, os demandantes poderão recorrer da sentença do juiz Miller e, em não o fazendo, se procederá para a recompilação das provas sobre os três pontos mencionados, com vistas a um julgamento.