Cuba é uma ditadura? Artigo de José I. González Faus

Foto: Geoff Livingston/Flickr

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16 Julho 2021

 

“Que Cuba é uma ditadura parece-me inegável. E ademais, uma ditadura sem êxito (ao contrário da China). Mas também era uma ditadura antes da revolução castrista, quando era definida como um bordel dos EUA. Ficaria outra pergunta por fazer: o bloqueio a um país que queria sair de uma ditadura, é outra ditadura? E sobre isso, o que debatem os que acreditam ser democratas?”, escreve José I. González Faus, jesuíta espanhol, em artigo publicado por Religión Digital, 14-07-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

 

Eis o artigo.

 

A pergunta de se Cuba é uma ditadura se parece com aquelas que faziam os fariseus a Jesus, satisfeitos porque, independente do que respondesse, ficaria mal. Por isso merece uma primeira resposta similar a que Jesus dava nestes casos: “por que me tentais, hipócritas?”. Por que olhais para Cuba com o olho alheio e não enxergais as ruas do próprio país e os que dormem nelas?

Que Cuba é uma ditadura parece-me inegável. E ademais, uma ditadura sem êxito (ao contrário da China). Mas também era uma ditadura antes da revolução castrista, quando era definida como um bordel dos EUA. Que a Revolução fracassaria já previu Marx no século XIX quando avisou que era impossível a revolução em apenas um país (acrescentemos: muito mais se esse país é uma ilha e essa revolução se faz em épocas de globalização). Ficaria outra pergunta por fazer: o bloqueio a um país que queria sair de uma ditadura, é outra ditadura? E sobre isso, o que debatem os que acreditam ser democratas?

Digo os “que acreditam” porque democracia significa poder do povo. E nosso sistema é propriamente “poder do dinheiro”. Luis Inácio Lula da Silva já disse bem claramente: “eu tenho o governo, mas não o poder”. E esse poder é o que o lhe golpeou depois, da maneira mais tranquilamente imoral. Francisco também disse claramente que um sistema onde o poder tem dinheiro é um sistema que “mata” e que cria “exclusão”. E não basta com pesar que “como não me mata, já está bem”: porque isso pode ser uma forma tácita de se reconhecer cúmplice.

Assim estamos: liberdade e justiça social são um par necessário, como acontece com nossas mãos e nossas pernas. Um sistema onde um dos dois está faltando será um sistema de um manco. Liberdade sem justiça social é uma forma de ditadura. Justiça social sem liberdade é outra forma de ditadura. Neste caso, será uma ditadura partidária; no outro, uma ditadura dos poderes anônimos do dinheiro.

Talvez os Castros devessem saber dizer o mesmo do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica: “Sou socialista, mas não sou burro”. E quem acalma a consciência proclamando que Cuba é uma ditadura, teria que ler as palavras de um dos livros sapienciais da Bíblia, escrito 200 anos antes de Cristo: “Que paz pode haver entre a hiena e o cão? E que paz pode haver entre o rico e o pobre? Os leões caçam os asnos selvagens, e os ricos caçam os pobres” (Ec 13, 18-19).

E se não, leiam Thomas Piketty, no Le Monde, em 12 de junho: “os oligarcas pagam menos impostos estruturalmente do que o resto da população”. Que é outra forma de ditadura.

 

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