22 Junho 2021
"Mas Qumran também está envolvido com seus manuscritos, que por sua vez geraram uma espécie de romance detetivesco e até mesmo uma batalha acadêmica com mortos, feridos e vencedores. Ou os rolos-amuletos de prata descobertos perto de Jerusalém, ou o barco do lago de Tiberíades contemporâneo dos pescadores discípulos de Jesus, ou o túmulo de Caifás, ou o surpreendente mosaico de Megido, sem falar nos imponentes edifícios da época de Herodes e o nome de Pilatos encontrado durante uma escavação italiana em uma lápide no teatro de Cesarea Marittima", escreve o cardeal italiano Gianfranco Ravasi, prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por Il Sole 24 Ore, 20-06-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Erich H. Cline,
Archeologia biblica,
Queriniana, p. 190, € 20
Arqueologia e Bíblia. Erich H. Cline propõe uma viagem às escavações realizadas nas áreas citadas das Sagradas Escrituras e relembra os mistérios dos pergaminhos de Qumran, a tumba de Caifás e o mosaico de Megido. Agatha Christie sob a tenda na estepe desolada da Mesopotâmia talvez estava elaborando o enredo de um de seus romances dominados pelo detetive Hercule Poirot ou pela astuta Miss Marple. Lá fora, sob um sol implacável, seu marido, o arqueólogo Max Mallowan, estava às voltas, com uma estratificação ou com o inventário dos fragmentos de cerâmica que emergiam daquele solo árido. Quisemos recriar livremente uma cena que aproxima duas disciplinas que não são tão estranhas entre si, como se poderia suspeitar. De fato, vamos tentar folhear um pequeno volume intitulado Archeologia biblica [em tradução livre], do estadunidense Erich H. Cline, e passar logo para o último capítulo, o décimo segundo. O título não deixa dúvidas: "Descobertas excepcionais ou falsificações talentosas?". E eis que logo temos uma história semelhante a um thriller em três atos, marcado por reviravoltas, sobre três descobertas que vieram à tona nos últimos anos e que ofuscaram a mente até mesmo de alguns estudiosos, seguiram caminhos aventurescos, mobilizaram enormes recursos financeiros e eventualmente caíram sob a lâmina afiada da crítica rigorosa que pulverizou seu valor, relegando-os aos depósitos de materiais descartados.
Para o registro, é uma minúscula romã de marfim de 5 cm com uma inscrição falsa, que custou ao famoso Museu de Israel uns bons 550 mil dólares. Depois, há o ossário com a inscrição "Tiago, filho de José, irmão de Jesus", triunfantemente exposto em Toronto e que furtivamente foi feito desaparecer quando ficou provado que a gravação era moderna. Finalmente, a tabuinha do Rei Ioas com 15 linhas em paleo-hebraico, cuja história com o relativo flop ("falso bastante fraco") deixamos para o leitor acompanhar. Agora, se é verdade que vários Indiana Jones e jornalistas trilham por esse setor em busca de hipotéticos furos, é muito mais verdade que uma legião de estudiosos sérios com tenacidade e paciência escavam, catalogam, verificam e confiam a relatórios documentados as suas pesquisas.
O ensaio de Cline, nos capítulos anteriores, é de fato uma viagem fascinante pelas campanhas de escavação realizadas nos territórios mencionados na Bíblia. A tentação era forte: colocar-se à busca de confirmações dos dados bíblicos, às vezes usando as Sagradas Escrituras quase como um "guia de viagem", mas também desanimar-se remetendo aquelas páginas apenas à teologia. Na realidade, era necessário deslocar-se por uma crista delicada, lembrando sempre que a revelação bíblica é, sim, histórica e, portanto, se move por concretas coordenadas espaço-temporais e materiais, mas tem uma finalidade religiosa e sua hermenêutica é justamente de tipo teológico dos acontecimentos e dados.
As etapas que Cline impõe ao seu itinerário são muitas vezes marcadas pelos acontecimentos de nosso tempo: basta pensar apenas ao antes e depois da Guerra dos Seis Dias (1967) com o general arqueólogo Y. Yadin, ou na evolução da prática arqueológica a partir de escavações guiadas por intuições, cognições e investigações de mestres geniais (como W. Albright, I. Finkelstein, J. Garstang, K. Kenyon, W. Petrie, R. de Vaux), até a atual introdução de magnetômetros, georadares, medidores de resistividade elétrica e termoluminescência, fotografias de satélite e assim por diante. O panorama que no final é descortinado diante de nós por Cline é, no entanto, aquele que movimenta as páginas bíblicas: de Noé e o dilúvio (com a gafe de outra esposa, a do arqueólogo de Ur, L. Woolley) a Josué, Salomão, Nabucodonosor, nomes bem conhecidos dos leitores da Bíblia.
Joachim Jeremias,
Jerusalém no tempo de Jesus. Pesquisas de história econômico-social neotestamentário
Paulus
Mas Qumran também está envolvido com seus manuscritos, que por sua vez geraram uma espécie de romance detetivesco e até mesmo uma batalha acadêmica com mortos, feridos e vencedores. Ou os rolos-amuletos de prata descobertos perto de Jerusalém, ou o barco do lago de Tiberíades contemporâneo dos pescadores discípulos de Jesus, ou o túmulo de Caifás, ou o surpreendente mosaico de Megido, sem falar nos imponentes edifícios da época de Herodes e o nome de Pilatos encontrado durante uma escavação italiana em uma lápide no teatro de Cesarea Marittima. A lista poderia continuar, oferecendo revelações inéditas para o público geral e entrelaçamentos com atestados documentais e lendas, sempre "narradas" de maneira atraente, mas sem se deixar levar pelo sensacionalismo que, em vez disso, anima uma multidão de charlatães que se dizem arqueólogos e, infelizmente, também de jornalistas.
A novidade editorial de Cline pode ser acompanhada pela reimpressão de um clássico, o retrato histórico, social, político, religioso, urbano e até econômico de Jerusalém, desenhado por um dos maiores neotestamentáristas do século passado, Joachim Jeremias (1900 -1979), que galgou as cátedras das mais importantes universidades alemãs, de Berlim a Greisfwald, de Leipzig a Göttingen. Contra a tendência, inaugurada pelo racionalismo sete-oitocentista e revivida em nossos dias por seguidores como Fernando Bermejo-Rubio (L’invenzione di Gesù di Nazaret, Bollati Boringhieri), tendendo a dissolver todos os dados históricos dos Evangelhos, colocando em dialética história e teologia (considerada "ficção"), Jeremias prossegue com todo seu grande background como filólogo, historiador e exegeta, isolando um contexto global que é refletido e certamente reelaborado nos textos sagrados, sem se deixar levar pelo entrincheiramento apologético rígido ou, pelo contrário, pela lâmina devastadora da demitização.
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Memórias dos subterrâneos bíblicos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU