01 Março 2021
Espécies como Jatobá e Ipê já são historicamente alvo de exploração madeireira na Amazônia.
Aproximadamente 44 mil árvores foram cortadas ilegalmente na região dos rios Mamuru e Arapiuns no Pará em 2020. Esse gravíssimo dano ambiental foi exposto nos noticiários no final do ano com a conclusão de uma operação policial e militar de apreensão de madeira. Agora em fevereiro de 2021 fomos surpreendidos pela informação de que a Justiça Federal de Belém havia condenado os policiais federais envolvidos na operação.
A reportagem é de Pedro Martins e Florêncio Almeida Vaz, publicada por Amazônia Real, 25-02-2021.
Acima, foto da operação ‘Handroanthus GLO’, na divisa dos estados do Amazonas e Pará, que resultou na maior apreensão de madeira da história (Foto: PF)
A operação policial e militar de fiscalização ambiental ocorrida em dezembro de 2020 na Foz do Rio Arapiuns, no município de Santarém, Oeste do Pará, chamou atenção pela quantidade de Ipês, madeira de alto valor de mercado, apreendida em balsas próximo à cidade de Santarém. Junto com a Polícia Federal do Amazonas, os militares seguiram em apreensões de madeira por todo o Baixo Tapajós, resultando em uma das maiores operações de combate à exploração madeireira em razão da quantidade de toras encontradas.
O volume de Ipês apreendidos levou a Operação a ser denominada de “Handroanthus”, nome científico do Ipê Amarelo, espécie florestal encontrada em boa parte da América latina e que na Amazônia encontra refúgio nas áreas mais protegidas da Bacia do Rio Tapajós. No entanto, o que acontecia na região não estava nítido nem com a alta tecnologia aplicada na operação que contou com o uso do Planet para complementar os dados de monitoramento do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe).
Fundamentada na Garantia da Lei e da Ordem através do Decreto nº 10.539 editado um mês antes da Operação no Rio Arapiuns e que autorizou o uso de forças armadas nas operações ambientais até 30 de abril de 2021, a Operação “Handroanthus” atingiu as Glebas de terras estaduais direcionadas historicamente pelo planejamento governamental para exploração madeireira. A região é de ocupação tradicional de povos indígenas, comunidades extrativistas e ribeirinhas que foram se tornando reféns da exploração madeireira dentro e no entorno de seus territórios.
Planos de manejo foram identificados na região pelo sistema de Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS), ou seja, havia a articulação para que essas madeiras passassem por fraude no sistema de fiscalização destruindo a floresta em torno de rios que alimentam a bacia do Tapajós.
As autoridades envolvidas nas operações de combate à exploração madeireira prestaram declarações informando que em geral as organizações criminosas de madeira aparecem se beneficiando de fraudes nos DOFs (Documentos de Origem Florestal) para esquentar madeira. O documento é emitido pelo Ibama e por dois estados que possuem sistemas próprios, Pará e Mato Grosso. Esses dois Estados são os que apresentam maior taxa de exploração do Ipê.
No entanto, a impressão de que o Governo está fazendo seu papel com a fiscalização ambiental é falsa. Vejamos que espécies como a Maçaranduba, Muiracatiara, Cupiuba e o Jatobá como o próprio Ipê (Handroanthus serratifolius) já vinham historicamente sendo objeto de exploração ilegal na região, a exemplo do que ocorria do PA Corta Corda, onde em 2014 a Madesa Madeireira Santarém foi condenada a recuperar a área degradada pela exploração de árvores nativas, dentre elas o Ipê.
Conhecido pela beleza das flores amarelas, o Ipê também é madeira muito alta durabilidade e aspectos estéticos que levaram a sua comercialização para países da Europa. Até 2019, o Ipê estava em uma lista de espécies ameaçadas da Convenção Sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagem – CITES (Decreto nº 3.607, 21 de setembro de 2000), mas a partir de relatório apresentado pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Ipê foi retirado dessa lista.
Em entrevista para o Jornal Nacional, o professor Edson Vidal da ESALQ/USP afirmou que “o Ipê é considerado hoje um novo mogno, é uma espécie das mais valiosas que a gente tem hoje na Floresta Amazônica. Então, principalmente devido a isso que ele está sendo exaustivamente explorado. É a abertura de um caminho para isso, não tenho nenhuma dúvida, para o desmatamento”.
Segundo dados do relatório técnico do Ibama de 2018, o maior exportador de Ipê para os EUA foi o Brasil, com 87% do total, seguido pelo Paraguai, com 11% e demais países com apenas 2%. Como o Ipê é proveniente de florestas naturais, sua exploração depende de planos de manejo.
De acordo com o Serviço Florestal Brasileiro “entre 1998 e 2018, para quatro espécies selecionadas. O ipê apresentou o maior preço médio, US$ 212,43/m³ em 2018”. Para o ano de 2020, o Imazon indicou que houve uma superestimativa do valor comercial do Ipê. Ou seja, além da procura no mercado internacional, o setor madeireiro superestimou o valor para maior rentabilidade durante a pandemia de Coronavírus. Isso está diretamente relacionado ao aumento da exploração ilegal do Ipê no Estado do Amazonas, como concluiu o Ministério Público Federal após a Operação Arquimedes para apreensão de Ipê ilegal em 2019 no Amazonas.
Em janeiro, caminhões carregados de Ipê foram apreendidos na Flona Tapajós (PA), no município de Belterra. O aumento do valor comercial do Ipê e a crescente investida de organizações criminosas em sua exploração agravam a vulnerabilidade dos territórios indígenas e extrativistas no Tapajós. Não só estão fora do aproveitamento legal e sustentável da madeira, como tem seus territórios invadidos por esses grupos criminosos, evidentemente violentos, como indicou em seu relatório em 2019 a Human Rights Watch, sobre “Máfia dos Ipês” no Brasil.
As duas apreensões em dezembro de 2020 e em janeiro de 2021 demonstram que a exploração ilegal de madeira se acelera na região, pois já estava em pandemia, com aumento do número de casos, o que levou a inclusão de todo Baixo Amazonas, no Oeste do Pará, a bandeira vermelha em 16 de janeiro e ao lockdown em 01 de fevereiro e novamente a bandeira vermelha em 18 de fevereiro. A comercialização de madeira é um dos serviços essenciais mantidos durante o lockdown, mas a fiscalização tende a diminuir. Com a confirmação da nova cepa de Covid-19 e o número de mais de 600 mortos em Santarém, paira a certeza da impunidade.
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Não tem lockdown para as madeireiras ilegais: a derrubada de Ipês continua em 2021 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU