O presidente dos leigos católicos alemães critica o documento do Vaticano sobre a paróquia: “Absurda ausência de senso de realidade”

Foto: Vatican News

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12 Agosto 2020

O documento do Vaticano sobre as reformas na paróquia e o papel dos laicos é um tema de discussão. O presidente do ZdK (Zentralkomitee der deutschen Katholiken, Comitê Central dos Católicos Alemães) leu e não consegue endossar alguns aspectos.

A entrevista com Thomas Sternberg é editada por Verena Tröster, publicada por Domraio.de, 21-07-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevista.

Vamos nos concentrar no essencial: o que há, concretamente, nesse documento?

É um longo documento. São 34 páginas. Em onze capítulos e 124 parágrafos há uma longa discussão sobre um tema, em particular também sobre a questão da fusão das paróquias. Mas, junto, também se abordam os serviços nas comunidades, a questão dos laicos, e se apresenta uma imagem de padre sem nenhum sentido de realidade.

Nos movimentos de reforma das dioceses, é precisamente disso que se fala, por exemplo também em desonerar os párocos de certas incumbências, atribuindo-as aos laicos. A atribuição de responsabilidades aos laicos é fundamental. Já existem laicos que desempenham funções gerenciais. O que acontecerá com essas estruturas que já foram organizadas, se agora for aceito esse documento?

Bem, em primeiro lugar, esse documento em seus capítulos recorre sobretudo ao direito canônico. O direito canônico de 1983 era um direito no qual as instâncias participativas do Concílio eram consideravelmente limitadas. O problema é que o que está naqueles artigos do direito canônico não coincide há tempo com a realidade pastoral das nossas comunidades.

Por exemplo, lá – e também aqui nesse documento – está escrito que todos os organismos são apenas consultivos ou de apoio, que devem apoiar e aconselhar o pároco, figura idealizada como pastor. Mas isso não leva em conta a situação efetiva, já que nós, na Alemanha, estabelecemos ao nível do nosso direito canônico que os conselhos das Igrejas e os conselhos administrativos do patrimônio são órgãos de decisão conjunta. São órgãos de tomada de decisão, não órgãos consultivos.

Você deve ter ficado surpreso quando leu o texto. Como reagiu?

Os primeiros cinco capítulos abordam o problema dos novos desafios. Ali podem ser lidas sugestões bastante razoáveis. Nada mal. Depois, há algo sobre a questão das fusões das paróquias em áreas muito grandes. Também aí encontro muitas coisas interessantes: fala-se que devem ser considerados os casos individuais, que não se pode agir da mesma forma em todos os lugares. É tudo muito compreensível.

Mas quando se passa aos ministérios e aos laicos, pergunto-me: que imagem estranha é essa? Como se agora os laicos pressionassem para assumir responsabilidades e deveres litúrgicos ... Mas não é assim! Devemos buscar a participação. Precisamos buscar pessoas comprometidas. E se hoje tivéssemos que procurar pessoas que devem ser eleitas para depois fazerem parte de um organismo que se limita a falar, onde o pároco pode observar o que existe na comunidade, então devo dizer que isso não existe. Um pároco que trabalhasse dessa forma em sua comunidade logo enfrentaria o fracasso.

O que você acha que levou o Papa Francisco a divulgar tal documento? Por exemplo, ele conhece o contexto aqui na Alemanha ou não?

Sim, penso que, se olharmos para a Alemanha, um dos motivos foram as queixas de grupos de padres da diocese de Trier que reclamaram com sucesso em Roma contra a dissolução das suas paróquias. A diocese de Trier queria transformar as suas 884 antigas paróquias em apenas 32 com um simples “canetaço”, o que naturalmente significaria que centenas de párocos seriam destituídos do seu serviço e deixariam de ser párocos. Os párocos teriam se defendido - e tenho a impressão de que o documento, também levando isso em consideração, reforça a posição dos párocos e diz que eles têm razão em querer permanecer párocos depois de nomeados. Não é possível reduzi-los a auxiliares de uma hora para outra. A coisa em si não está totalmente errada.

Mas, acima de tudo, o documento carece de senso de realidade no que diz respeito à figura do padre. É delineada uma imagem onde o rebanho se alinha atrás do pastor e então também faz alguns serviços acessórios. E isso é um absurdo, já que não há mais padres. Nós simplesmente não os temos.

E também tenho a certeza de que o que é dito sobre a direção da paróquia, simplesmente por causa da realidade, será diferente, porque os párocos, os padres não pretendem manter aquela imagem de comunidade que está delineada no documento – se alguma vez existiu – e isso também é preciso ser dito. Não, eu creio que esse documento não irá deter os processos de reforma que estão ocorrendo em todos os lugares. Está muito longe da realidade.

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