31 Março 2020
"Quanto mais tempo durar a pandemia de coronavírus mais tempo será necessário para a retomada da produção de bens e serviços e maiores serão os impactos sobre a economia. A opção não é entre saúde e economia, mas sim entre um isolamento forte com controle rápido do surto e retomada rápida da economia ou um isolamento fraco com retomada fraca e mais lenta e distante. Esta pandemia vai obrigar a humanidade a repensar as suas prioridades", escreve José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – Ence/IBGE, em artigo publicado por EcoDebate, 30-03-2020.
Eis o artigo.
Estamos chegando ao final de março de 2020 e o crescimento do número de casos e de mortes do novo coronavírus, em todo o mundo, se acelerou ao longo do mês. Entre os dias 01 e 15 de março o número de casos passou de 88,6 mil para 169,6 mil, representando um crescimento geométrico diário de 4,6% ao dia. O número de mortes passou de 3 mil para 6,5 mil nos primeiros 15 dias do mês (um aumento de 5,4% ao dia).
Mas entre os dias 16 e 29 de março houve aceleração do ritmo. O número de casos passou de 182,5 mil em 16/03 para 724,4 mil em 29/03 (um aumento de 10% ao dia) e, no mesmo período, o número de mortes passou de 7,2 mil para 32 mil (um aumento de 12% ao dia).
A China que foi o foco inicial da pandemia conseguiu estabilizar o número de casos na casa dos 80 mil e o número de mortes na casa dos 3 mil. Os Estados Unidos assumiram a liderança do número de casos e ultrapassaram a China. Entre os 12 países da tabela abaixo, os EUA possuem as maiores taxas de crescimento, tanto dos casos (23,6% ao dia), quanto de mortes (29,3% ao dia). A Itália, mesmo com redução do ritmo da pandemia em relação às semanas anteriores, ficou em segundo lugar no número de casos, mas disparou no primeiro lugar no número de mortes, com a maior taxa de letalidade (11 mortes para cada 100 casos notificados). A Espanha ficou em quarto lugar em número de casos, mas em segundo lugar em número de mortes (com a terceira maior letalidade).


A Coreia do Sul que iniciou o mês com o segundo maior número de casos caiu para a décima primeira colocação entre os países mais atingidos pelo surto de Covid-19 e é o país que apresenta o menor número de mortes e a segunda menor letalidade entre os 12 países da tabela acima. A Alemanha ultrapassou o número de casos do Irã – que ocupava o terceiro lugar em fevereiro – mas o número de alemães mortos é baixo e o país tem a menor taxa de letalidade (0,4% dos casos terminam em mortes). O Irã tem a segunda maior taxa de letalidade, a Espanha a terceira e o Reino Unido a quarta maior taxa de letalidade.
Nos primeiros 21 dias de março o número de casos de Covid-19 no Brasil subiu 35% ao dia, mas, na última semana (22 a 29 de março), reduziu o ritmo para 15,6% ao dia. Porém, não está claro se esta redução é fruto das medidas preventivas de isolamento social ou se, simplesmente, está havendo grande subnotificação devido à falta de insumos para a realização dos testes e exames. A primeira morte no Brasil aconteceu no dia 17 de março e chegou a 136 no dia 29/03, um ritmo de 27,4% na semana.
Pelo gráfico abaixo, nota-se que o Brasil (com crescimento diário de 30% nos primeiros 29 dias do mês) se destaca em relação a outros países em desenvolvimento. A Malásia que tinha apresentado uma taxa de crescimento muito grande nos primeiros 20 dias do mês de março, desacelerou um pouco o crescimento do número de casos, apresentando um crescimento geométrico diário de 17% entre os dias 01 e 29 de março. A Indonésia – que é o quarto maior país em termos demográficos – apresentou crescimento médio diário de 28% no mesmo período. E a Índia – que é o segundo país mais populoso do mundo – colocou toda a população em quarentena para deter a taxa de 22% ao dia ocorrida nos primeiros 29 dias de março.
Número de casos de coronavírus no Brasil, Malásia, Indonésia e Índia: março 2020
O surto de coronavírus já atingiu mais de 200 países e territórios. No dia 01 de março havia 1 país com mais de 10 mil casos notificados e outros 3 países com mais de 1 mil casos. No dia 29 de março já havia 11 países com mais de 10 mil casos e outros 34 países com mais de 1 mil casos, mostrando que a pandemia já é universal e cresce no mundo inteiro. Em síntese, na semana de 22 a 29/03, o número de casos de Covid-19 no mundo passou de 335 mil para 724 mil, representando um crescimento de 11,6% ao dia. Enquanto o número de mortes globais passou de 14,6 mil para 34,2 mil, representando um crescimento diário de 13%.
No mesmo período, os 12 países da tabela acima (que representam cerca de um terço da população mundial) apresentaram uma dinâmica do surto um pouco mais lenta do que a média mundial. Isto quer dizer, que estes países que saíram na frente na pandemia já estão em uma fase de desaceleração, enquanto o resto do mundo (dois terços da população) estão em fase de aceleração. Portanto, a expectativa é que o surto de coronavírus vá se agravar no mês de abril.
Um terço da população mundial está em quarentena, fato absolutamente inédito. Os países que possuem maiores casos em relação à população são: Suíça com 1.494 casos para 1 milhão de habitantes, Itália com 1.431, Espanha com 1.406, Alemanha com 607, França com 505, Holanda com 502, Irã com 385, EUA com 315, Reino Unido com 214, Coreia do Sul com 185, China com 57 e o Brasil com 16 casos notificados para 1 milhão de habitantes. Evidentemente, estes números crescem rapidamente e diversos países (com exceção da China, Coreia do Sul, etc.) caminham para ter pelo menos 0,1% da população com exames positivos.
Quanto mais tempo durar a pandemia de coronavírus mais tempo será necessário para a retomada da produção de bens e serviços e maiores serão os impactos sobre a economia. A opção não é entre saúde e economia, mas sim entre um isolamento forte com controle rápido do surto e retomada rápida da economia ou um isolamento fraco com retomada fraca e mais lenta e distante. Esta pandemia vai obrigar a humanidade a repensar as suas prioridades.
O fato é que as mudanças geradas pela Covid-19 serão dramáticas, permanentes e alcançarão toda a população mundial e todas as áreas de atuação. Provavelmente, em diversos aspectos, o impacto será comparável ao da Grande Depressão dos anos de 1930 associado ao impacto da II Guerra Mundial. Quem viver verá e poderá avaliar!
Referências:
ALVES, JED. A pandemia de Coronavírus e o pandemônio na economia internacional, Ecodebate, 09/03/2020. Disponível aqui.
ALVES, JED. “A recessão em 2020 é inexorável e a palavra-chave para as pessoas é sobrevivência”, Correio da Cidadania, 21/03/2020. Disponível aqui.
ALVES, JED. O crescimento da pandemia de coronavírus e a redução da poluição ambiental, Ecodebate, 24/03/2020.Disponível aqui.
WorldOmeteres. Disponível aqui.
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A pandemia de Covid-19 avançou rapidamente na última semana - Instituto Humanitas Unisinos - IHU