21 Janeiro 2020
Em incógnito, mas claramente visível nos vídeos divulgados pelo Twitter, o arcebispo Carlo Maria Viganò, ex-núncio que acusou o Papa pedindo sua renúncia, deixou o esconderijo secreto onde se refugiara nesses últimos três anos e foi às ruas de Munique, juntamente com um grupo de católicos de vários países para protestar contra o Zentralkomitee der Deutschen Katholiken, o caminho sinodal iniciado pelos bispos alemães em dezembro para discutir questões complicadas, como a separação de poder na Igreja, o celibato sacerdotal, o papel das mulheres, a sexualidade.
A reportagem é de Salvatore Cernuzio, publicada por La Stampa, 20-01-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Antes e depois de Carlo Viganò
Foto: La Stampa
Barba branca e longa, óculos grossos, jaqueta com capuz e chapéu preto, a imagem do ex-representante do Papa nos Estados Unidos pareceu muito diferente daquela publicada na mídia nos últimos anos. A partir de agosto de 2018, quando, com um explosivo “cominicado" de cerca de vinte páginas, o prelado acusou Francisco de ter encoberto as irregularidades do cardeal Theodore McCarrick, ex-arcebispo de Washington - culpado de abuso contra jovens e menores e, portanto, destituído de seu cargo de padre pelo Papa em 2019 - pedindo clamorosamente sua renúncia. Um longo documento cujos limites logo ficaram evidentes, entre interpretações subjetivas e amplas omissões, que provou ser uma operação construída em gabinete com os mesmos ambientes (especialmente estadunidenses) desde sempre em oposição ao pontificado reinante. Os mesmos que alguns anos antes tentaram chegar a uma espécie de impeachment doutrinário após a publicação da Amoris laetitia.
Tais correntes pontualmente nos últimos anos relançaram as declarações de Viganò que, refugiando-se em um local secreto, ainda quis guardar para si um papel de protagonista da Igreja enviando cartas e comunicados à imprensa para comentar questões espinhosas ou atuais (sem esquecer a entrevista concedida ao Washington Post). A última vez que o prelado fez isso foi na semana passada, quando divulgou um memorial ácido contra monsenhor George Gänswein, secretário particular de Bento XVI e prefeito da Casa Papal, que nos últimos dias se expôs pedindo em nome de Ratzinger para retirar a assinatura do Pontífice emérito do livro com o cardeal Robert Sarah sobre o celibato intitulado "Do fundo do nosso coração". Em especial, Viganò denuncia o "controle exercido de maneira abusiva e sistemática" sobre o Papa emérito por Gänswein, antes do livro-gate aclamado pelas vertentes dos conservadores e agora criticado por ter atingido Sarah com suas declarações, de alguma forma atrapalhando a eleição que se desejava para ele no próximo Conclave.
Também nos últimos dias, na mesma rede político-midiática começaram a circular as notícias - nunca confirmadas - de uma suposta "caça ao homem" pelo Vaticano contra Viganò. Que, em suas inúmeras intervenções, deixou transparecer temer por sua própria vida. Provavelmente um risco não totalmente real, já que o ex-núncio decidiu partir para Munique e participar da manifestação da "Acies ordinata" na central Odeonsplatz, em frente à Theatinerkirche e à Feldernhalle, o prédio construído no século XIX para celebrar os heróis católicos da Baviera.
Também Viganò nas últimas horas é aclamado como herói nas redes sociais, onde as fotos e vídeos de sua presença tiveram grande difusão. Junto com o prelado, na primeira fila, também se veem o professor Roberto de Mattei, historiador e presidente da Fundação Lepanto, entre os críticos mais acalorados de Bergoglio, também considerado um dos homens de Steve Bannon na Itália; Michael Matt, diretor do jornal estadunidense Remnant; a baronesa Edwig von Beverfoelde, líder pró-vida alemã; John-Henry Westen, diretor do blog LifeSiteNews (o portal que mais do que qualquer outro apoiou a campanha Viganò) e Alexander Tschugguel, o jovem austríaco que saltou para as manchetes internacionais durante o Sínodo por roubar da paróquia de Santa Maria em Traspontina as estatuetas da chamada Pachamama jogando-as no Tibre. Todos nomes já presentes nas diversas iniciativas anti-Francisco, como a coleta de assinaturas para denunciar sua heresia, a confusão na Igreja e assim por diante.
Em Munique, os manifestantes, depois de recitar o Rosário por uma hora e cantar o Credo, lançaram um apelo aos católicos na Alemanha para se oporem à Kirchensteuer, o imposto sobre as religiões, a principal fonte de subsistência para a Igreja local. Um apelo também ao Papa para não ignorar as posições dos bispos alemães que, com seu percurso sinodal iniciado em dezembro, junto com representantes civis e laicos, desejam enfrentar uma discussão aprofundada sobre questões espinhosas, como padres casados, abertura a casais homossexuais, papéis de decisão das mulheres na Igreja, diaconato feminino, tomando depois as decisões vinculantes.
Temas cuja escolha despertou bastante apreensão no Vaticano, tanto que ao cardeal presidente, Reinhard Marx, em setembro foi enviada uma carta assinada pelo prefeito da Congregação dos Bispos, cardeal Marc Ouellet, e uma avaliação jurídica do presidente do Pontifício Conselho para Textos Legislativos, monsenhor Filippo Iannone, que levantavam dúvidas sobre a validade canônica do sínodo. O próprio Papa Francisco enviou uma longa carta ao episcopado alemão no último verão para lembrá-lo, em essência, de iniciar, sim, processos, mas em comunhão com Roma, sem transcender em "derivas funcionalistas ou reducionismos ideológicos, científicos ou manipuladores".
Na opinião de muitos, mesmo dentro da Cúria Romana, o caminho sinodal na Alemanha poderia levar a verdadeiras "rupturas" doutrinárias. Alguns chegam a temer o perigo do cisma com a constituição de "uma nova Igreja com rosto germânico-amazônico, separada da Igreja católica, apostólica romana". A tensão é alta, tanto que o grupo de "Acies ordenadas" - título tradicionalmente atribuído à Nossa Senhora para representá-la como exército posto em batalha de maneira ordenada e combativa - decidiu sair para a rua e protestar contra a suposta deriva que vê no cardeal Reihnard Marx, presidente dos bispos alemães, o principal responsável. Tanto que é definido em uma nota da associação como um "falso profeta".
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Alemanha, um grupo de católicos se manifesta contra o sínodo dos bispos. Nas ruas, também o ex-núncio Viganò - Instituto Humanitas Unisinos - IHU