A opção Mourão: Kant contra Bolsonaro

Hamilton Mourão (à esquerda) e Jair Bolsonaro. (Foto: Alessandro Dantas/Fotos Públicas)

Mais Lidos

  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS
  • Dilexi Te: a crise da autorreferencialidade da Igreja e a opção pelos pobres. Artigo de Jung Mo Sung

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

20 Mai 2019

“Se me perguntassem num processo eleitoral em quem eu votaria se a opção fosse Bolsonaro e Mourão eu diria que em nenhum dos dois. Não votaria no primeiro por razões de sanidade mental, aliadas a outras razões políticas de princípio, vinculadas à questão democrática. E não votaria em Mourão, por motivos vinculados à questão democrática e às reformas que ele apoia”, escreve Tarso Genro, ex-governador do Rio Grande do Sul – PT, publicado por Sul21, 18-05-2019.

Segundo ele, “no concreto, todavia, poderá se configurar nos próximos meses uma nova linha divisória na nova política do país pós-golpe: você apoiaria uma solução ou o “impeachment” de um insano, em favor de um outro que não é?”

Eis o artigo.

O velho Kant não deixaria por menos se escrevesse sobre o presidente Bolsonaro. Usaria certamente a sua definição da “Crítica da Razão Prática” de “fanatismo moral”, para caracterizá-lo como pessoa que pensa estar fazendo o bem, “por inspiração, por entusiasmo, por um impulso que naturalmente satisfaça sua própria natureza”, que tem o direito de “substituir a virtude, que é a intenção moral em luta” (…) pela “santidade, de quem se crê possuído pela pureza perfeita das intenções da vontade”. O fanático moral se imagina um santo e portanto se julga um ser superior que pode celebrar a tortura, adorar a morte e chamar de idiotas àqueles que a ele se opõem dentro do rito democrático.

O Presidente vai, cada vez mais, para o isolamento e não se corrige. Porque a sua inspiração e entusiasmo ao que tudo indica não conseguem adquirir racionalidade política. A esfera das políticas de estado na democracia é a esfera dos contratos, das oposições de pensamento, das sínteses superiores para debelar impedimentos: é a esfera da luta e dos consensos, onde os organizações e instituições políticas e as pessoas, perseguem objetivos pautados por determinados princípios. Quem escolhe declinar de demonstrar escolhendo se apresentar – sem demonstração possível – como santidade e pureza, foge dos caminhos da razão e pode chegar (ou já chegou) à loucura.

O que espanta foi a escolha irracional, seguindo a trilha da autoflagelação, que as classes dominantes fizeram açoitadas pela mídia oligopólica, ao tentar promover seus interesses “reformistas”, imaginando que Bolsonaro – sempre transtornado e alheio a qualquer formulação política coerente – pudesse resultar em algo positivo para os seus negócios. Somente pessoas com graves limitações de cognição política poderiam pensar que o atual Presidente poderia unir e melhorar o país, para termos um pouco do reconhecimento global que recuperasse algo do prestígio que Lula nos legou.

A opção Mourão começa a se apresentar como factível no cenário político, e não é uma invenção da oposição. O Vice-Presidente tem feito seguidas manifestações de sensatez mínima para se opor a Bolsonaro, porque a doutrina da Escola Superior de Guerra – que ele certamente aprendeu – valoriza extremamente a “paz social”, seja ela obtida de forma autoritária, seja ela conseguida pelas vias democráticas. No presente, Bolsonaro tanto é uma má possibilidade de obtê-la de forma autoritária, como o é pelo consenso mínimo que uma democracia com líderes respeitados pode construir.

O Presidente disse, no seu país preferido, que a imprensa brasileira é um ninho de esquerdistas e os seus milicianos virtuais ou reais apontam a Rede Globo como comunista. Talvez isso possa inocular neste pessoal um pouco de senso prático kantiano pelo menos, e eles comecem – como alguns jornalistas já começaram – a se dar conta que se o insano chegar ao poder absoluto eles vão conosco para as trevas da violência sem limites, onde a tortura e a morte não são apenas bravatas de fanáticos.

Se me perguntassem num processo eleitoral em quem eu votaria se a opção fosse Bolsonaro e Mourão eu diria que em nenhum dos dois. Não votaria no primeiro por razões de sanidade mental, aliadas a outras razões políticas de princípio, vinculadas à questão democrática. E não votaria em Mourão, por motivos vinculados à questão democrática e às reformas que ele apoia. No concreto, todavia, poderá se configurar nos próximos meses uma nova linha divisória na nova política do país pós-golpe: você apoiaria uma solução ou o “impeachment” de um insano, em favor de um outro que não é? É bom ir pensando sobre isso.

Leia mais