27 Março 2019
"Precisamos valorizar os dons de Deus, a inteligência artificial merece toda a nossa atenção", afirma o arcebispo Vincenzo Paglia. O presidente da Pontifícia Academia para a Vida reuniu-se com o professor Luciano Floridi, professor de Filosofia e Ética da Informação na Universidade de Oxford e diretor do Digital Ethics Lab no Oxford Internet Institute, que nesta terça-feira na Universidade Roma Tre abriu uma conferência sobre os desafios e as oportunidades da cibernética, nas exposições da Maker Faire e da Data Driven Innovation. Nos próximos anos serão delegadas às máquinas cada vez mais atividades hoje consideradas humanas. Mas, segundo o professor Floridi, mais que de substituição de pessoas por máquinas, é importante falar sobre o suporte da inteligência artificial à ação do homem, com redução de custos, a partir dos consumos energéticos e da gestão otimal dos recursos. Um desafio decisivo para a humanidade ao qual a Santa Sé não se isenta.
A entrevista é de Giacomo Galeazzi, publicada por Vatican Insider, 26-03-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
D. Paglia, a Santa Sé está colaborando com cientistas e filósofos em vista de um pronunciamento sobre a inteligência artificial?
Nos últimos anos, a Pontifícia Academia para a Vida demonstrou um interesse específico em novas tecnologias, dedicando o biênio 2019-2020 à roboética e às questões ético-antropológicas ligadas às chamadas ‘inteligências artificiais’. Isso foi feito principalmente em atendimento ao que foi solicitado pelo Papa, que incentivou a Academia a entrar nos territórios da ciência e da técnica e percorrê-los com coragem e discernimento.
Qual é a posição do Vaticano sobre esta questão?
O Papa Francisco quis dedicar às tecnologias emergentes e convergentes todo um número da carta Humana Communitas que me escreveu por ocasião da XXV Assembleia da Academia. Nele, o Papa afirma: "Valendo-se dos resultados obtidos pela física, pela genética e pelas neurociências, bem como pela capacidade de cálculo de máquinas cada vez mais poderosas, agora é possível intervir profundamente na matéria viva". E também o corpo humano é suscetível a intervenções que podem mudar não apenas suas funções e desempenhos, mas também suas modalidades de relação, no plano pessoal e social, expondo-o cada vez mais às lógicas do mercado. Em primeiro lugar, segundo o Papa Francisco, é preciso entender as transformações epocais que se anunciam nessas novas fronteiras, para identificar como direcioná-las ao serviço da pessoa humana, respeitando e promovendo sua dignidade intrínseca.
Como o vosso aprofundamento em cibernética está progredindo?
Este processo solicitado pelo Papa exige que não sejam deduzidas respostas pré-fabricadas a partir de uma teoria preconcebida: mas, antes de tudo, escutar atentamente os fenômenos em sua complexidade para compreender como as novas descobertas da ciência e da técnica afetam a nossa humanidade. Sabemos bem que escutar não significa legitimar. Pelo contrário, significa entrar em contato com a realidade e tomar consciência da multiplicidade de projetos e de iniciativas que estão em andamento nesse campo. Algumas perspectivas às vezes nos surpreendem por sua audácia, por sua criatividade, por sua potencialidade, mas também pela diversidade de abordagens antropológicas que expressam.
Quais são as perspectivas desse diálogo entre ciência e fé, tecnologia e centralidade do homem? Não se estaria arriscando um novo caso Galilei?
No campo da pesquisa científico-tecnológica sobre robôs e sobre a chamada ‘inteligência artificial’ é por vezes implícita - e por vezes inclusive explícita - uma concepção do homem, de sua origem e destino, nem sempre compartilhável, ou seja, incapaz de assumir até o fim aquela diferença, que a Escritura nos entrega, entre o que na realidade nos é dado e recebemos como dom gratuito do Criador - Pai de todos - e quanto é, ao contrário, fruto de uma ação humana que transforma este dom.
É um juízo que implica uma avaliação bioética?
Parece cada vez mais claro que todo artefato não é apenas um instrumento transparente e neutro, mas incorpora a visão do mundo e do homem que o projetou. E isso nos desafia e nos incentiva a participar da empreitada científica tecnológica com gratidão, valorizando os dons de Deus. Entre os quais também devemos colocar a razão crítica, que nos permite governar todos os outros bens, interpretando e distinguindo o que está em conformidade com a sua promessa de bem e quanto difere dela.
Quais são os próximos passos neste processo?
Com a recente assembleia dedicada à roboética, começamos a dar os primeiros passos e, na mesma linha, prepararemos o caminho para o próximo encontro que acontecerá no ano que vem, falando sobre a chamada inteligência artificial. Fazemos isso também devido ao inesperado interesse que registramos sobretudo na adesão de um grande número de participantes, incluindo muitos jovens, como o próprio Papa ressaltou. Mas também as muitas solicitações que recebemos de órgãos da imprensa e da comunicação indicam a importância e o interesse despertados por esses argumentos e também o apreço pela maneira ampla e articulada como orientamos a discussão. Estas são questões profundamente sentidas no mundo atual e merecem toda a nossa atenção.
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"Estudamos a inteligência artificial. O Papa nos pediu", afirma D. Vincenzo Paglia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU