26 Janeiro 2019
“Cada um de nós é muito mais do que seus rótulos”. O Papa Francisco não tem dúvidas de que assim anima os jovens detidos no Centro de Detenção de Menores Las Garzas, de Pacora. É a primeira vez que um pontífice durante a JMJ confessa jovens detidos dentro de uma prisão. Isso aconteceu hoje no Panamá, onde denunciou: “Como dói ver quando uma sociedade concentra suas energias mais em murmurar do que em lutar para criar oportunidades e transformação”.
A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada por Vatican Insider, 25-01-2019. A tradução é de Graziela Wolfart.
O Pontífice percorreu 42 quilômetros de carro até chegar ao bairro de Pacora, onde atendeu confissões de 5 jovens detidos, 4 homens e uma mulher – obviamente sem imagens – e dirigiu uma saudação aos 450 que estão cumprindo pena ali e que participaram da liturgia penitencial. Antes de chegar até a prisão, o Papa percorreu um trecho no papa-móvel como sinal de proximidade com as pessoas que vivem nesta área da periferia.
Durante a homilia o Bispo de Roma disse: “’Ele recebe os pecadores e come com eles’”, acabamos de escutar durante o início do Evangelho. Com essa expressão pretendiam desqualificá-lo e desvalorizá-lo diante de todos, mas a única coisa que conseguiram foi salientar uma de suas atitudes mais comuns e distintas: ‘este recebe os pecadores e come com eles’.
“Jesus não tem medo de se aproximar daqueles que, por inúmeras razões, carregavam sobre suas costas o ódio social, como eram os publicanos – recordemos que os publicanos enriqueciam roubando seu próprio povo; eles provocavam muita, mas muita indignação – ou com o peso de suas culpas, erros ou equívocos, como os assim chamados pecadores”. Cristo se comporta assim porque “sabe que no céu há mais festa por um só pecador convertido do que por noventa e nove justos que não necessitam conversão”.
E enquanto “eles se limitavam tão somente a murmurar ou se indignar impedindo e fechando assim todo tipo de mudança, conversão e inserção, Jesus se aproxima, se compromete, põe em jogo sua reputação e convida sempre a olhar um horizonte capaz de fazer nova a vida e a história. Dois olhares bem diferentes que se contrapõem. Um olhar estéril – o do murmúrio e da fofoca – e outro que convida à transformação e à conversão – o do Senhor”.
Francisco destaca que “muitos não toleram e não gostam desta opção de Jesus, e mais, entre dentes no início e aos gritos no final, manifestam seu desgosto buscando desacreditar seu comportamento e o de todos aqueles que estão com ele. Não aceitam e recusam esta opção de estar próximo e oferecer novas oportunidades. Com a vida das pessoas parece mais fácil pôr rótulos e etiquetas que congelam e estigmatizam não só o passado como também o presente e o futuro das pessoas”, denuncia o Papa. “Rótulos que, definitivamente, a única coisa que conseguem é dividir: aqui estão os bons e lá estão os maus; aqui os justos e lá os pecadores”.
Esta atitude “contamina tudo – ataca – porque levanta um muro invisível que faz crer que marginalizando, separando ou isolando se resolverão magicamente todos os problemas. E quando uma sociedade ou comunidade se permite isto, a única coisa que fazem é cochichar e murmurar, entram em um círculo vicioso de divisões, críticas e condenações; entram em uma atitude social de marginalização, exclusão e de uma tal confrontação que lhes fazem dizer irresponsavelmente como Caifás: ‘Convém que só um morra pelo povo, e que não sofra a nação inteira’”. E normalmente “a corda arrebenta do lado mais fraco: o dos mais frágeis e indefesos”.
Francisco exclama: “Que doloroso ver quando uma sociedade concentra suas energias mais em murmurar e se indignar do que em lutar e lutar para criar oportunidades e transformação”. Ao contrário, “todo o evangelho está marcado por este outro olhar que não é nada mais e nada menos que o que nasce do coração de Deus. O Senhor quer fazer festa quando vê seus filhos que voltam para casa. Assim testemunhou Jesus, manifestando até o extremo o amor misericordioso do Pai”. Um amor que não tem tempo para murmurar, “mas que busca romper com o círculo da crítica supérflua e indiferente, neutra e imparcial e assume a complexidade da vida e de cada situação; um amor que inaugura uma dinâmica capaz de oferecer caminhos e oportunidades de integração e transformação, de cura e de perdão, caminhos de salvação.
“Comendo com publicanos e pecadores, Jesus rompe a lógica que separa, exclui, isola e divide falsamente entre bons e maus. E não o faz por decreto ou com boas intenções, tampouco com voluntarismos ou sentimentalismo, o faz criando vínculos capazes de possibilitar novos processos; apostando e celebrando cada passo possível”.
Assim “rompe também com outro murmúrio nada fácil de detectar e que “perfura os sonhos” porque repete como um sussurro contínuo: não vais poder, não vais poder. É o cochicho interior que aparece em quem, tendo chorado seu pecado e estando consciente de seu erro, não acredita que possa mudar. É quando se crê interiormente que aquele que nasceu “publicano” tem que morrer “publicano”; e isto não é verdade”, assegura o Papa.
Francisco mais tarde convida com força: “Amigos: Cada um de nós é muito mais do que seus rótulos. Assim Jesus nos ensina e convida a crer. Seu olhar nos desafia a pedir e buscar ajuda para transitar pelos caminhos da superação. Há vezes em que o murmúrio parece ganhar, mas não creiam nele, não o escutem. Busquem e escutem as vozes que impulsionam a olhar para frente e não as que jogam para baixo”.
A alegria e a esperança “do cristão – de todos nós, também do Papa – nasce de ter experimentado alguma vez este olhar de Deus que nos diz: tu és parte de minha família e não posso te deixar ao relento, não posso te perder no caminho, estou aqui contigo. Aqui? Sim, aqui”. E assim Jesus transforma “o murmúrio em festa e nos diz: “Alegrem-se comigo!”.
O Papa destaca também que “uma sociedade adoece quando não é capaz de fazer festa pela transformação de seus filhos, uma comunidade adoece quando vive do murmúrio que esmaga, condena e é insensível”. Uma sociedade é fecunda “quando consegue gerar dinâmicas capazes de incluir e integrar, de assumir e lutar para criar oportunidades e alternativas que dê novas possibilidades a seus filhos, quando se ocupa em criar futuro com comunidade, educação e trabalho. E se experimentar a impotência de não saber como, não se renda e volte a tentar”.
Antes de deixar a prisão de menores de Pacora, o papa Francisco se encontrou de maneira privada com um grupo de 450 jovens cubanos peregrinos na JMJ no Colégio Esclavas, próximo da Nunciatura apostólica. O Papa chegou no final da missa, deu a bênção e dirigiu uma breve saudação aos presentes. No encontro, que durou uns 10 minutos, participaram além dos jovens dois bispos cubanos. Anteriormente o Pontífice havia celebrado de maneira privada na Nunciatura apostólica. Da celebração haviam participado paroquianos e colaboradores da arquidiocese do Panamá.
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Pela primeira vez em uma JMJ o Papa atende confissões em uma prisão para menores - Instituto Humanitas Unisinos - IHU