12 Dezembro 2018
“O novo acordo China-Vaticano não está isento de questões não resolvidas. Uma das principais é encontrar uma compreensão apropriada da Igreja. Em suma, a Igreja é a Igreja dos diplomatas e dos funcionários, ou é a Igreja dos mártires e dos profetas? Ela se levanta contra isso ou concorda com isso? Em suma, é a Igreja do conforto ou das catacumbas?”
A opinião é do jesuíta estadunidense Paul P. Mariani, autor de Church Militant: Bishop Kung and Catholic Resistance in Communist Shanghai (Harvard University Press, 2011) e titular da cátedra Edmund Campion, S.J. no Departamento de História da Universidade de Santa Clara, nos Estados Unidos.
O artigo foi publicado em America, 07-12-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Há alguns meses, começou uma nova era para a Igreja Católica na China, quando o Papa Francisco assinou um histórico “acordo provisório” com a República Popular da China sobre a nomeação de bispos na China. O acordo rompeu um impasse de quase 70 anos entre Pequim e o Vaticano.
No fim de setembro, o papa também deu uma entrevista a bordo do avião sobre o acordo e enviou uma mensagem aos católicos da China e à Igreja universal explicando suas razões para dar esse passo ousado.
O conteúdo exato do “acordo provisório” será mantido em sigilo. Mas a America e outras publicações informaram que ele foi assinado em Pequim no dia 22 de setembro por representantes do Vaticano e do governo chinês. Parece que o governo chinês terá voz na escolha dos bispos, mas o Papa Francisco insiste que ele terá a palavra final (o processo exato de nomeação e exame dos candidatos não é claro).
Como parte do acordo, o Vaticano se reconciliará com sete bispos chineses “ilegítimos” (bispos ordenados sem o mandato papal). É o primeiro acordo público entre o Vaticano e a China desde que o Partido Comunista chegou ao poder em outubro de 1949.
O acordo foi saudado em alguns setores como um importante passo rumo à reaproximação e denunciado em outros como uma traição. A fim de entender melhor por que esse acordo incitou opiniões tão fortes, darei algumas informações históricas necessárias e, em seguida, delinearei algumas esperanças, riscos e perguntas não respondidas sobre o estado atual das relações sino-vaticanas.
A situação da Igreja na China completou um ciclo. A questão-chave do acordo é a nomeação de bispos, a mesma questão que preocupou a Igreja na China há 100 anos. Naquela época, todos os bispos da China eram estrangeiros. A maioria ocupava o cargo de vigário apostólico ou de prefeito apostólico, porque a hierarquia diocesana não estava totalmente estabelecida até 1946. Eles eram quase sempre escolhidos pela ordem religiosa ou pela sociedade missionária à qual pertenciam e eram ratificados através do protetorado francês, um papel que a França arrogava para si nos anos 1840, como guardiã dos interesses católicos na China.
Missionários visionários e até mesmo o Vaticano foram essencialmente excluídos do processo de tomada de decisão. Assim também os católicos chineses, que continuamente faziam abaixo-assinados a Roma (essas petições ainda estão arquivadas nos arquivos da ex-Congregação para a Propagação da Fé).
Finalmente, após a Primeira Guerra Mundial, o Vaticano começou a levar mais a sério a indigenização das Igrejas locais. Em 1919, ele enviou um visitador papal diretamente para a China. Suas principais tarefas eram dar ao Vaticano uma noção melhor do que estava acontecendo na China e, finalmente, encontrar candidatos locais para o episcopado.
Após anos de cuidadosa diplomacia, esses esforços deram frutos, e, em 1926, o Papa Pio XI, o “papa das missões”, consagrou os seis primeiros bispos chineses dos tempos modernos (em 1685, Gregório Luo Wenzao havia se tornado o primeiro bispo chinês, mas não havia outros desde então).
Ao consagrar esses bispos na Basílica de São Pedro, em Roma, Pio XI enviou um forte sinal: a indigenização do episcopado chinês havia começado. Ela continuaria aos trancos e barrancos pelos próximos 25 anos, até quando talvez a metade dos bispos da China eram chineses.
Eventos globais logo intervieram. A Segunda Guerra Mundial começou para a China em 1937, quando os japoneses realizaram uma invasão em grande escala. Ela foi seguida por uma brutal guerra civil, na qual o Partido Comunista Chinês saiu vitorioso. Em 1º de outubro de 1949, Mao Zedong enfrentou as multidões a partir da tribuna do Portão Tiananmen em Pequim e anunciou o estabelecimento da República Popular da China. A China “se levantou”.
Mao havia prometido por muito tempo reverter o legado do “colonialismo”. Mesmo antes de o Partido Comunista da China chegar ao poder, soldados matavam e torturavam padres, mais notoriamente durante a “marcha da morte” trapista de 1947. Quando o partido chegou ao poder dois anos depois, as igrejas cristãs, junto com outros “inimigos sem armas”, logo estavam na mira de Mao.
O Partido Comunista da China logo nacionalizou as propriedades da Igreja e expulsou os missionários católicos e protestantes. Esses desdobramentos só se aceleraram com a eclosão da Guerra da Coreia e com a escalada da Guerra Fria. Infelizmente para os católicos, o governo insistiu que a Igreja rompesse seus laços com o Vaticano “imperialista”. Ele queria que a Igreja estivesse firmemente sob o controle do partido.
Os católicos prescientes viram isso como o começo de um esforço para criar uma Igreja “católica” independente. O representante papal da época, o arcebispo Anthony Riberi, protestou veementemente. Ele sentia fortemente que a obediência ao papa não era simplesmente uma questão política, mas também doutrinal. Ele foi expulso da China em 1951. As relações sino-vaticanas foram bloqueadas em recriminações mútuas.
Além de laços diplomáticos rompidos, a situação da Igreja continuou a piorar. Em 1955, muitos bispos haviam sido exilados. Outros foram levados a julgamento e presos, um destino compartilhado por milhares de fiéis católicos. Mas o governo chinês continuou insistindo em estabelecer uma Igreja Católica independente de Roma.
Em 1957, ramos da Associação Patriótica controlada pelo governo foram estabelecidas em todo o país, e, no ano seguinte, o governo encenou a consagração de alguns bispos sem a aprovação papal. Ele continuou a fazer isso nos anos seguintes. Até o Papa João XXIII perguntou brevemente se a Igreja na China estava em cisma.
A vida dos católicos apenas piorou durante a Revolução Cultural, quando as construções da igreja foram saqueadas e os fiéis foram violentamente atacados. Os anos maoístas não foram nada bons para a Igreja. Os católicos chineses se referem a esses anos como uma jiaonan, uma perseguição sem precedentes. A China estava se fechando – cultural, econômica e politicamente – para grande parte do restante do mundo.
No fim de 1978, os ventos políticos mudaram novamente. Mao estava morto há dois anos, e o novo líder, Deng Xiaoping, iniciou uma era de reformas. A China embarcou em um programa de modernização e se abriu novamente ao mundo exterior. A religião também foi reabilitada. A política foi ratificada por um documento do Partido Comunista em 1982 e ainda fornece a estrutura básica hoje. Propriedades foram restauradas, lideranças religiosas foram libertadas da prisão, e o governo professou contrição pelo tratamento anterior oferecido aos fiéis.
O governo reconheceu que as políticas draconianas anteriores só tinham saído pela culatra e levaram a um grande ressentimento, e agora pedia que as autoridades não se antagonizassem aos fiéis, mas se unissem a eles sob o padrão de modernização. As Igrejas logo emergiram das sombras – assim como as perversas divisões entre as Igrejas “subterrâneas” e “patrióticas”.
O Papa João Paulo II viu alguns sinais de esperança. Quase desde o início de seu pontificado, ele demonstrou um grande interesse pela Igreja na China. Em 1983, ele escreveu uma carta pessoal a Deng pedindo “um contato direto entre a Santa Sé e as autoridades do povo chinês”. Suas aberturas não encontraram reciprocidade. Ele nunca conseguiu visitar a China.
O Papa Bento XVI encontrou as mesmas esperanças e frustrações. Em 2007, ele escreveu uma carta à Igreja na China expressando o desejo de um diálogo direto Estado-Estado com a China – ignorando, assim, a Associação Patriótica, uma organização obliquamente referenciada na carta como “incompatível com a doutrina católica”. Após um período inicial de alguma abertura, o governo chinês mostrou-se desinteressado em relação à carta. A situação logo voltou a ficar como de costume.
Mas tais frustrações públicas desmentem o fato de que, durante os anos 2000, o Vaticano e a China tiveram contatos indiretos, especialmente por causa da nomeação de bispos. Na realidade, muitos dos bispos que foram consagrados sem o mandato papal nas décadas passadas buscaram a reconciliação com Roma. Na maioria dos casos, ela foi concedida. Essa política teve tanto progresso que o Papa Bento XVI, em sua carta de 2007, reconheceu que a grande maioria dos bispos chineses havia se reconciliado com Roma.
Alguns questionaram essa política generosa de reconciliar bispos ilegítimos. Isso porque o governo ainda exigia sua fatia do bolo. Ele queria ferramentas flexíveis do Estado. Com medo, sob pressão ou oportunismo, esses bispos foram consagrados, mas sem o mandato papal (o cardeal Joseph Zen Ze-kiun, um forte crítico da política religiosa chinesa, classificou as consagrações ilícitas de 2007 como “atos de guerra”).
Mais tarde, porém, eles buscariam a aprovação papal e prometeriam lealdade ao papa. Depois, diriam ao governo que estavam comprometidos com o princípio da independência da Igreja chinesa em relação a Roma. O processo de pedir perdão e depois permissão mostrava a sua fragilidade.
De fato, as relações sino-vaticanas tiveram muitos altos e baixos nos 40 anos desde que a China começou as reformas com Deng, mudando em relação àquele que às vezes parecia um ciclo de 10 anos. O progresso havia sido feito e depois se deterioraria rapidamente. Assim, esse impasse de 70 anos parece ter sido rompido com a assinatura do acordo provisório.
O resultado final disso foi que, até pouco antes do recente acordo provisório, havia cerca de 100 bispos na China, 30 deles ainda não reconhecidos pelo governo. Alguns estão sob prisão domiciliar ou “desaparecidos”, enquanto outros atuam com alguma liberdade.
Os 70 restantes foram reconhecidos pelo Vaticano e pelo governo chinês. Mas isso deixou em aberto a questão espinhosa de que ainda havia sete bispos ilegítimos na China. Eles não procuraram nem receberam a reconciliação papal. É desnecessário dizer que esse é um estado altamente irregular para a Igreja. Nenhuma outra Conferência Episcopal do mundo tinha bispos legítimos e ilegítimos no mesmo corpo. O trigo e o joio estavam misturados.
Em fevereiro, a America relatou que os sete bispos pediram perdão ao papa e solicitaram a reconciliação com ele e com a Igreja universal. E agora, depois de revisar seus arquivos, o papa legitimou todos eles. Esse foi o principal fruto público do acordo provisório. Na visão de outros, o joio foi apenas renomeado como trigo.
Com o reconhecimento do papa desses sete bispos, o governo chinês parece estar ganhando muito. E o que a Igreja está ganhando? À primeira vista, parece que não muito. Até mesmo as simpáticas lideranças da Igreja chamam isso de um acordo imperfeito.
Mas há esperanças. Uma esperança é que esse acordo seja simplesmente o primeiro passo. Acordos futuros poderiam esclarecer todo um conjunto de questões secundárias para a Igreja na China. O fato é que a governança normal da Igreja tem sido difícil na China nos últimos 70 anos. Há problemas com as fronteiras diocesanas, por exemplo. O Vaticano ainda conta oficialmente um total de 144 dioceses (e outras divisões eclesiásticas), enquanto o governo chinês conta 98. Uma razão para essa discrepância é que as fronteiras e até mesmo os nomes de algumas províncias e regiões da China mudaram desde 1949.
Além da questão da legitimidade episcopal, as discrepâncias nas fronteiras diocesanas levaram a uma série de situações irregulares. Às vezes, os fiéis não sabiam quem era o bispo legítimo – ou havia bispos concorrentes na mesma região. A situação foi muitas vezes agravada porque até mesmo bispos aprovados pelo governo não declaravam publicamente se haviam se reconciliado com o Vaticano.
Tudo isso foi um grande golpe para a visibilidade da Igreja. Um princípio-chave da lei da Igreja é que os fiéis têm o direito de saber quem é seu bispo. No entanto, o Anuário Pontifício, publicado pelo Vaticano, continua reiterando as estatísticas de bispos e fronteiras diocesanas do início dos anos 1950.
No entanto, há muito mais esperanças do que simplesmente a racionalização das fronteiras diocesanas ou a atualização do anuário da Igreja (afinal, isso pode ser apenas minúcias).
A verdade incômoda é que, se uma Igreja tem diversas dioceses e bispos concorrentes, ela não é mais uma Igreja, mas sim duas. Uma esperança maior é que, ao regularizar essas estruturas, o Vaticano possa ajudar a trazer mais reconciliação. A Santa Sé provavelmente espera que o status dos 30 bispos não reconhecidos pelo governo chinês possa ser normalizado. Talvez eles poderiam ser autorizados a atuar mais abertamente e receber algum tipo de reconhecimento do governo. Esse seria um grande passo. O Vaticano já mostrou boa vontade. Talvez o governo chinês siga o mesmo caminho.
Outra esperança é a plena ligação diplomática entre o Vaticano e Pequim. Talvez um embaixador papal possa se estabelecer na China como há 70 anos. Discussões francas poderiam, então, continuar em um nível Estado-Estado entre a Santa Sé e a República Popular da China.
De fato, tal arranjo ajudaria também o lado chinês. Deve ser uma fonte de constrangimento para a China que ela seja um dos poucos países do mundo que não tem relações diplomáticas com o Vaticano. Essa é uma distinção dúbia compartilhada com o Afeganistão, a Arábia Saudita e a Coreia do Norte. Até o Irã tem uma nunciatura apostólica.
Além disso, os laços diretos entre a Igreja Católica e a China podem beneficiar o Papa Francisco também. Talvez o papa possa ser autorizado a visitar a China. Na verdade, essa seria uma grande conquista, embora estivesse aberta a muitos mal-entendidos, pois ocorreria em uma época de crescentes restrições à expressão religiosa na China.
Finalmente, como o Vaticano deixou claro, todos esses esforços estão destinados a ajudar na evangelização do povo chinês. Apesar do legado de perseguição, os católicos cresceram de cerca de três milhões em 1949 para cerca de 10-12 milhões hoje. No entanto, nos últimos anos, alguns comentaristas notaram que parece haver um nivelamento do crescimento católico na China. Isso é algo que eu também tenho ouvido de católicos na China. Compare-se isso com o crescimento robusto do protestantismo na China, de menos de um milhão em 1949 para talvez 60 ou mais milhões hoje.
O acordo provisório não está isento de riscos. Seria extremamente ingênuo pensar que o governo chinês quer resultados positivos para a Igreja. O governo chinês tem visto a Igreja clandestina como um espinho em seu flanco há décadas e, há décadas, tentou pôr essa Igreja de joelhos. Pequim provavelmente vê o acordo como uma maneira de controlar ainda mais a comunidade clandestina. Se o Vaticano está disposto a ser cooptado nesse projeto, então melhor ainda.
Então, o papa está vendendo a Igreja clandestina? Essa é uma questão que surge o tempo todo, feita até mesmo ao próprio papa. Os fiéis clandestinos ficarão feridos. Eles sofreram muito nas mãos do governo chinês no passado. Eles sofrerão agora nas mãos do Vaticano. Esses são alguns dos sentimentos que eu ouvi durante a minha recente viagem para a China.
O cardeal Zen, com quem eu tive a oportunidade de conversar, tem sido vociferante em seus ataques contra o acordo. Alguns católicos temem que eles sejam entregues aos lobos.
Da parte do papa, parece que ele está contando com a fidelidade contínua da Igreja clandestina. Eles enfrentaram os lobos no passado e certamente podem sobreviver a um acordo doloroso.
Outro risco é a coerência da política vaticana. Em suma, se o Vaticano não reconheceu esses sete bispos no passado, por que eles são repentinamente aceitáveis agora? Havia algo em sua conduta passada sobre o qual o Vaticano estava ciente?
O jornal Boston Pilot relata rumores de que dois deles eram conhecidos há muito tempo por terem famílias. Depois, há o caso de Dom José Ma Yinglin, bispo de Kunming. Ele é o presidente da Conferência dos Bispos da China (uma entidade não reconhecida pelo Vaticano) e passa muito tempo em Pequim ou na estrada, e não com o seu rebanho. Tudo isso levanta a questão: depois de séculos tentando sair do controle do poder do Estado, por que o Vaticano voltaria a esse estado de coisas? São esses os “pastores autênticos” que o Papa Francisco pede?
Em sua carta aos fiéis chineses, o papa se esforça para mencionar várias vezes que ele não deseja “burocratas” ou “funcionários” para a Igreja na China. No entanto, existe o perigo de que seja precisamente por isso que muitos desses homens foram escolhidos pelo governo.
Eles chamaram a atenção do governo, mas conquistaram também os corações e as mentes das pessoas? Enquanto o Vaticano lê seus arquivos, é o governo chinês que tem arquivos muito maiores sobre esses homens. Ele sabe quem vai fazer o seu jogo e quem é facilmente chantageado. Somos obrigados a perguntar: se esses bispos fizeram o jogo do governo no passado, por que eles não continuariam a fazê-lo no futuro?
Finalmente, o novo acordo não está isento de questões não resolvidas. Uma das principais é encontrar uma compreensão apropriada da Igreja. Em suma, a Igreja é a Igreja dos diplomatas e dos funcionários, ou é a Igreja dos mártires e dos profetas? Ela se levanta contra isso ou concorda com isso? Em suma, é a Igreja do conforto ou das catacumbas?
O Papa Francisco recentemente canonizou o arcebispo Óscar Romero, um prelado conhecido por defender profeticamente o seu rebanho contra um regime assassino. São Romero disse uma vez: “Uma Igreja que não sofre perseguição, mas desfruta dos privilégios e do apoio das coisas da terra – tenham medo! – não é a verdadeira Igreja de Jesus Cristo”.
Uma geração anterior de chineses foi instada pelas lideranças da Igreja a resistir ao governo comunista e às suas políticas religiosas intrusivas para romper com o papa. Muitos foram para a prisão, e outros, para a morte.
Agora, outra geração de católicos chineses é informada de que a Igreja clandestina e não registrada não é uma forma normal de proceder. Eles são instruídos a se engajar em encontros e não em confrontos. Onde está a coerência aqui? Ao pedir o engajamento na China, mas depois canonizando Óscar Romero, o Vaticano está enviando sinais contraditórios? Ou está simplesmente reconhecendo uma questão perene na Igreja? E tudo isso está acontecendo em um tempo de crescente restrição governamental sobre a religião na China. Os profetas estão sendo vendidos pelos diplomatas?
Sabe-se que, durante séculos, os governos europeus nomearam bispos em territórios sob seu controle ou influência. Isso foi reconhecido pelo Papa Francisco em uma entrevista a bordo do avião, após o acordo ter sido anunciado. Mas o Concílio Vaticano II insistiu que a Igreja agora tinha o “poder exclusivo de nomear e instalar bispos”. Ele decretou ainda que “para o futuro jamais se concedem às autoridades civis direitos ou privilégios de eleição, nomeação, apresentação ou designação de bispos”. Esse entendimento foi escrito no cânone 377 §5 do Código de Direito Canônico de 1983.
Será que o Vaticano está voltando as costas para essa política em prol de um bem maior? Talvez o Vaticano tenha determinado que há fortes razões pragmáticas para essa decisão, e que isso ajudará os fiéis. Se for verdade, isso tem o alto custo de ir contra a clara intenção do Vaticano II pela independência da Igreja em relação aos poderes temporais.
Ao anunciar o acordo, Greg Burke, diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, declarou que “o objetivo do acordo não é político, mas pastoral, permitindo que os fiéis tenham bispos em comunhão com Roma, mas, ao mesmo tempo, reconhecidos pelas autoridades chinesas”.
Se esse for o caso, então a decisão de assinar o “acordo provisório” pode muito bem ser uma decisão pastoral. Mas também é política.
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As apostas extremamente altas do acordo China-Vaticano. Artigo de Paul P. Mariani - Instituto Humanitas Unisinos - IHU