10 Dezembro 2018
“A grande maioria dos padres gays, assim como os padres heterossexuais, tenta viver em celibato e servir ao povo de Deus nas paróquias de todo o mundo. A Igreja estaria perdida sem eles.”
O comentário é do jesuíta estadunidense Thomas J. Reese, ex-editor-chefe da revista America, dos jesuítas dos Estados Unidos, de 1998 a 2005, e autor de "O Vaticano por dentro" (Ed. Edusc, 1998), em artigo publicado por Religion News Service, 07-12-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Nada coloca mais rápido o papa na primeira página dos jornais do que o fato de ele dizer algo sobre a homossexualidade. Isso ficou evidente no início desta semana, quando relatos de um livro-entrevista com o Papa Francisco se concentraram no que ele tinha a dizer sobre os padres gays.
Alguns retrataram seus comentários como uma reversão da sua atitude mais tolerante em relação aos gays, exemplificada pela sua famosa declaração: “Quem sou eu para julgar?”.
Na verdade, nessa nova entrevista, ele simplesmente disse aos padres gays o que ele sempre dizia aos padres heterossexuais: observem o celibato ou vão embora.
Em seu livro “Sobre o céu e a terra”, escrito quando ele era arcebispo de Buenos Aires, Francisco observou que o celibato obrigatório para os padres católicos é uma lei que pode mudar. Muitos acreditam que ele está aberto ao celibato opcional, e espera-se que o assunto seja discutido durante o sínodo dos bispos para a região amazônica, que se reunirá em Roma em outubro do próximo ano.
Mas, no livro de 2010, ele também insistiu fortemente que o celibato deve ser observado pelos padres que assumiram esse compromisso.
Ele não jogaria fora todo padre que violasse o celibato. Lapsos individuais podem ser perdoados. Se um padre cai, escreveu Francisco, “eu o ajudo a voltar aos trilhos”. Com isso, ele quer dizer fazer penitência e praticar o celibato.
Mas um padre que é incapaz de observar o celibato deveria voltar para o estado leigo – é melhor um bom leigo do que um mau padre. Sem nenhuma namorada ao lado. Sem nenhuma empregada “com benefícios”. Sem nenhuma família oculta.
“A vida dupla não é boa para nós”, escreveu. “Eu não gosto disso, porque significa construir sobre a falsidade.”
Na nova entrevista, com um padre claretiano espanhol, Pe. Fernando Prado, Francisco diz o mesmo sobre os padres gays.
“Aos padres, religiosos e religiosas homossexuais, é preciso encorajá-los a viver integramente o celibato e, sobretudo, a serem requintadamente responsáveis, procurando nunca escandalizar nem as suas comunidades nem o santo povo fiel de Deus, vivendo uma vida dupla”, disse o papa. “É melhor que deixem o ministério ou sua vida consagrada antes de viver uma vida dupla.”
O notável nos comentários de Francisco não é que ele esteja reprimindo os padres gays, mas sim que ele está aplicando os mesmos padrões aos padres gays e heterossexuais. No passado, a posição dos papas era ou negativa ou ambígua em relação aos padres e seminaristas gays.
O Vaticano tendeu a evitar o uso de termos como “orientação sexual”, mas falou de uma “tendência profundamente radicada”. Alguns bispos, mesmo assim, interpretaram isso como uma “orientação homossexual” e, portanto, baniram do sacerdócio qualquer um que se considerasse gay.
Outros interpretaram a expressão “profundamente radicada” como algo parecido com “incontrolável” e, portanto, incapaz de observar o celibato. Nessa interpretação, “heterossexualidade profundamente radicada” também seria um problema. Se a tendência não fosse “profundamente radicada”, se ele pudesse viver uma vida celibatária, então o homem poderia entrar no seminário e se tornar padre.
Nessa entrevista, Francisco se situa firmemente no último campo. Ele continua usando a expressão “profundamente radicada”, mas também fala de padres homossexuais e de outros que fazem votos religiosos na Igreja, vivendo no celibato de maneira íntegra e responsável. Não se exorta um grupo de homens a viver no celibato se você acha que eles deveriam ser banidos do sacerdócio.
Ao mesmo tempo, Francisco deixa claro que não há espaço no sacerdócio para gays que não observem o celibato. Alguns pensavam falsamente que o celibato só se aplicava ao sexo heterossexual. Pior ainda, alguns padres e bispos atacaram seminaristas sexualmente, como foi denunciado em relação ao ex-cardeal Theodore McCarrick.
Mas a grande maioria dos padres gays, assim como os padres heterossexuais, tenta viver em celibato e servir ao povo de Deus nas paróquias de todo o mundo. A Igreja estaria perdida sem eles.
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Papa aos padres gays (e heterossexuais): sejam celibatários ou vão embora. Artigo de Thomas Reese - Instituto Humanitas Unisinos - IHU