19 Setembro 2018
Líderes religiosos nos estados Bálticos estão demonstrando esperança de que a visita do Papa Francisco à região no final de setembro encoraje ainda mais os países do longínquo noroeste europeu, à medida que continuam a lidar com a renovação social, quase três décadas após o surgimento do regime soviético.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 18-09-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Especialistas no exterior também estão otimistas que a presença de um líder religioso ocidental de alto nível transmita uma mensagem à liderança russa atual sobre os laços dos três países com o Ocidente, quatro anos depois da anexação ilegal da Península da Crimeia da Ucrânia pela Rússia.
“A visita do Papa a esses países confirma sua identidade ocidental”, disse Declan Murphy, antigo diretor do gabinete de assistência à Igreja dos bispos dos EUA na Europa Central e do Leste.
“Numa época em que a Casa Branca ameaça se afastar da OTAN, acho que a presença do Papa visitando esses países confirmará simbolicamente, mais uma vez, sua conexão como parte da Europa Ocidental”, disse Murphy, em referência às constantes ameaças do presidente dos EUA, Donald Trump, de sair da Organização do Tratado do Atlântico Norte.
Francisco visitará a Lituânia, a Letônia e a Estônia entre 22 e 25 de setembro. Todos os países, um bloco no Oceano Báltico, imediatamente a nordeste da Polônia e a oeste da Rússia, fez parte da União Soviética e hoje são membros da OTAN.
Heather Conley, vice-presidente do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais da Europa, Eurásia e do Ártico, disse que Trump tem “questionado” os valores destacados nos últimos 70 anos na política externa dos EUA.
Quaisquer declarações de Francisco durante a visita sobre “segurança e o direito à proteção dos Estados Bálticos... seriam muito bem-vindas”, disse Conley, que foi secretária de Estado assistente de 2001 a 2005.
“Obviamente, quaisquer declarações nesses sentidos teriam grande poder”, disse.
Será a 25ª visita de Francisco ao exterior, representando uma mudança drástica de ritmo do pontífice depois que a viagem à Irlanda, entre 25 e 26 de agosto, atraiu atenção global à história de abuso clerical e institucional da Igreja Católica no país.
A viagem aos países Bálticos seria como um retorno à forma diplomática para o Papa: poderia se considerar uma visita “nas periferias”, com grande diversidade de expressão religiosa.
Enquanto a Lituânia, o país mais ao sul dos três, tem uma comunidade católica de 77% dos 2,8 milhões de habitantes, os católicos são minoria nos outros dois países.
Na Letônia, ao norte da Lituânia, estima que os católicos compreendam 26% da população de quase 2 milhões de pessoas. Na Estônia, ao norte da Letônia, representam menos de 0,5% da população de 1,3 milhão.
O bispo da Lituânia Kęstutis Kėvalas disse que, ao visitar os Países Bálticos, Francisco está “realmente seguindo suas diretrizes e indo até as periferias”. Kėvalas, que foi indicado por Francisco em 2017 para gerir a pequena diocese de Telšiai, no noroeste do país, considera a Lituânia “um país entre leste e oeste”.
“Adoramos que ele vem nos visitar”, disse. “Para nós, significa que ele nos conhece e quer nos fortalecer.”
O Padre Pauls Kļaviņš, responsável pela Catedral de St. James, em Riga, na Letônia, disse que pensava que a visita de Francisco ao país ajudaria a renovar os laços com a Europa Ocidental e encorajar a pequena comunidade católica.
Ele também disse ter esperança de que o Papa possa apoiar os esforços de manter um diálogo entre as comunidades adversárias pró-Europa e pró-Rússia do país.
Destacou, ainda, que as questões relativas à relação da Letônia com a Rússia são “muito acaloradas e politizadas” e que tem esperança que Francisco “aborde a questão do diálogo, de que tem de haver diálogo entre diferentes partidos, diferentes grupos culturais”.
O único papa a visitar os Países Bálticos além de Francisco foi João Paulo II, em 1993, menos de dois anos depois da queda final da União Soviética.
Kėvalas, que nasceu na antiga capital da Lituânia, Kaunas, disse que apesar de a visita de João Paulo II ter levado a uma “extraordinária experiência de unidade e inspiração”, houve um abrandamento do espírito” desde então. “Esperamos que a visita de Francisco renove nosso espírito e fortaleça novamente nossa convicção na fé e no caminho da liberdade”, disse.
Kļaviņš, que também é professor no seminário interdiocesano da Letônia, destacou que seu país mudou drasticamente desde a visita de João Paulo II.
“Vinte anos atrás, as pessoas ainda estavam no alto da experiência de liberdade”, observou. “Agora, estão se reavendo com a realidade da economia global e a realidade da instabilidade financeira.”
“É mais difícil do que há 25 anos discernir o que é realmente essencial, o que é essencial em relação a escolhas católicas, escolhas humanas, escolhas de vida”, disse.
Francisco pode optar por abordar tais questões em diferentes momentos da visita. Talvez, mais especificamente, durante as reuniões separadas com os líderes políticos de cada país.
Ao chegar de Roma em Vilnius, capital da Lituânia, no dia 22 de setembro, o Papa encontrará a presidente Dalia Grybauskaite e o primeiro-ministro Saulius Skvernelis. Ele permanece no país até o dia 23, fazendo quase 100 km de ida e volta a Kaunas, onde celebrará uma missa pública e encontrará padres e religiosos.
Francisco fica em Vilnus na noite seguinte, mas em 24 de setembro vai à Letônia e retorna à Lituânia, de onde parte para uma visita a Estônia no dia 25, antes de voltar a Roma no final da tarde.
Na Letônia, deve encontrar o presidente Raimonds Vejonis e o primeiro-ministro Maris Kucinskis na capital Riga, antes de ir à vila rural de Aglona para uma peregrinação e missa pública na Basílica da Assunção, considerada o centro espiritual católico do país.
Na Estônia, o Papa deve encontrar a presidente Kersti Kaljulaid e o primeiro-ministro Juri Ratas na capital Tallinn, antes de encerrar a visita com uma missa pública.
Kėvalas disse que espera que Francisco fale às autoridades da Lituânia sobre o “maior envolvimento” no projeto de unidade europeia.
“Poderíamos ter um papel mais importante na Europa, e talvez no mundo, tentando ter mais coragem, pensando sobre os valores da vida cristã e ocidental”, declarou.
Murphy, que deixou o cargo na conferência dos bispos em 2016, disse que esperava que Francisco também falasse sobre a doutrina social católica e a encíclica de 2015 sobre o meio ambiente Laudato Si’, Sobre o Cuidado da Casa Comum nas reuniões com os líderes dos Países Bálticos e as comunidades católicas.
“O Papa vai vir e demonstrar sua forte presença e, espero, encorajar o episcopado de lá a ser mais ativo ao buscar a disseminação do pensamento social católico e as mensagens das encíclicas do Santo Padre”, disse Murphy.
Haverá dois eventos ecumênicos durante a visita de quatro dias de Francisco: uma oração em Riga no dia 24 de setembro e um encontro ecumênico com jovens em Tallinn no dia 25.
A oração deve ser a mais substancial, pois as populações católica e ortodoxa são praticamente divididas no país. Segundo uma pesquisa da Comissão Europeia de 2015, 26% das pessoas são católicas e 24%, ortodoxas.
O Padre Paulista Ronald Roberson, diretor associado da Secretaria para Assuntos Ecumênicos e Inter-religiosos da Conferência dos Bispos dos EUA, disse que “seria interessante acompanhar” a oração, pois a Igreja Ortodoxa Letônia está sob a jurisdição do Patriarcado de Moscou.
Observando que Francisco era o primeiro papa a encontrar o Patriarca Kirill de Moscou em 2016, Roberson disse que o encontro poderia “melhorar a situação” entre católicos e ortodoxos na Letônia.
Kėvalas mencionou que o segundo dia do Papa na Lituânia coincide com o 75º marco do massacre nazista de judeus no país, que ocorreu em 23 de setembro de 1943 e hoje é lembrado como o Dia Nacional da Lembrança do Genocídio dos Judeus.
Francisco vai marcar a ocasião na tarde do dia 23 por meio de uma oração no monumento aos judeus que foram vítimas num antigo bairro de Vilnius.
“É muito simbólico o Papa também prestar sua homenagem aos judeus na parada no local do bairro”, disse Kevalas.
“Dessa forma, ele também vai transmitir ao mundo a mensagem de que precisamos lembrar dessa tragédia... e que precisar ser mais sensíveis às outras religiões e povos, para que isso não aconteça novamente”, destacou.
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A próxima viagem do Papa sinaliza apoio a países na periferia da Rússia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU