18 Agosto 2018
"É chocante que, após décadas de revelações de abuso sexual de crianças, ainda não haja uma responsabilização clara para os bispos. Nós devemos exigir mudanças", afirma em editorial o National Catholic Reporter, publicado em 17-08-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
Nota do editor: O editorial a seguir foi escrito e aparecerá na edição impressa de 24 a 30 de agosto do NCR, no dia anterior ao cardeal Daniel DiNardo, presidente da Conferência do Bispos Católicos dos EUA, revelar que os bispos estavam convidando o Vaticano para conduzir uma visitação apostólica ao país para conduzir uma "investigação completa" sobre questões em torno do cardeal arcebispo Theodore McCarrick, que os bispos tomarão medidas para criar canais para relatos mais fáceis de abuso e má conduta por parte dos bispos e que os bispos irão pressionar por melhor procedimentos sob a lei canônica para resolver queixas feitas contra bispos.
Recebemos o anúncio de ontem como um bom primeiro passo para resolver a crise que envolveu a Igreja Católica. É particularmente encorajador que os bispos tenham listado "liderança substancial de leigos" como um dos critérios para atingir seus objetivos. Isso também é um passo ao longo do caminho.
A declaração do Cardeal DiNardo é dirigida a "Irmãos e Irmãs em Cristo" e termina este pedido: "Deixem-me pedir-lhes que nos mantenham firmes a todas essas resoluções." Os bispos devem saber que estaremos assistindo.
Com o que aprendemos sobre o abuso de menores e seminaristas perpetuados por Theodore McCarrick e sua paralela ascensão através das fileiras da igreja, juntamente com o contundente relatório do grande júri da Pensilvânia que narra em detalhes vívidos o estupro de crianças e a cultura de segredo que permitiu que o abuso continuasse por décadas, o que os católicos estão sentindo?
Raiva e nojo não parecem palavras fortes o suficiente. Revulsão? Horror? Traição?
As revelações dos últimos dois meses tornam inegavelmente claro que é hora dos leigos reivindicarem a propriedade desta igreja. Nós somos o corpo de Cristo, nós somos a igreja. É tempo de exigirmos que os bispos assumam suas verdadeiras vocações como servos do povo de Deus. E eles devem viver assim.
Neste momento, parece que os leigos podem fazer muito pouco para efetuar as mudanças necessárias para solucionar as grandes questões que afligem a igreja agora - carreirismo, abuso de poder, falta de transparência, nenhuma responsabilização. O fato é que, hoje, os leigos em nossa igreja têm pouco poder.
Dito isso, como qualquer organizador comunitário diria, temos o poder do coletivo. Agora mais do que nunca, nós - os leigos - precisamos falar com uma voz unida. Nós devemos transformar nossa raiva em determinação.
É chocante que, após décadas de revelações de abuso sexual de crianças, ainda não haja uma responsabilização clara para os bispos. Nós devemos exigir mudanças.
Primeiro, dizer aos nossos bispos que não confiamos mais neles, individual ou coletivamente. A confiança que podemos ter tido agora está destruída.
Em segundo lugar, dizer aos nossos bispos que recuperar nossa confiança requer reforma no funcionamento da igreja como instituição.
Nas próximas semanas e meses, a U.S. Conference of Catholic Bishops (Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, em tradução livre) estudará as questões que surgem do caso McCarrick. A conferência indicará comitês, autorizará estudos e fará planos. Precisamos exigir, e ter, participação leiga total em todas as comissões e grupos de estudo, e devemos ter total transparência de tudo o que esses comitês e grupos veem e fazem.
Além disso, devemos exigir, e ter, participação total dos leigos em quaisquer tribunais, conselhos ou equipes de visitação resultantes desses esforços. Não nos contentaremos com uma representação simbólica ou meras "funções consultivas".
Se a lei canônica não permite o envolvimento laico que procuramos, respondemos: Que a lei mude.
Além disso, as mulheres devem ser tão representadas quanto os homens nestes grupos de estudo, comissões, tribunais e conselhos. Recomendamos especialmente reservar lugares nestes grupos para mulheres religiosas. Há muitas líderes de congregações de mulheres que são mais do que qualificadas para servir em qualquer um desses órgãos, particularmente aquelas nos EUA que aguentaram anos de escrutínio do Vaticano sob a visitação apostólica e a avaliação doutrinária da Leadership Conference of Women Religious (Conferência de Liderança das Mulheres Religiosas, em tradução livre).
De fato, se o esforço que o Vaticano dedicou a tais exames sem fundamento tivesse se concentrado em limpar a casa de bispos e padres abusivos ou cúmplices, quanto mais adiantados poderíamos estar na cura do câncer do abuso sexual que enfraquece a igreja entre seus seguidores e corrói sua posição moral no mundo?
O que aflige a igreja hoje - como demonstra o grande júri da Pensilvânia - resultou da falta de responsabilização dos bispos e superiores religiosos. Qualquer católico tem o direito de peticionar seu bispo, um superior maior, o núncio apostólico, os dicastérios em Roma, até mesmo o papa. Mas desde o nível local até Roma, não há processo transparente e confiável para garantir que as queixas sejam recebidas, e muito menos que sejam aplicadas.
Sabemos, por exemplo, que os funcionários da Congregação para a Doutrina da Fé se recusaram a reconhecer que receberam cartas de vítimas de abuso sexual de clérigos. Tal atitude perpetua uma cultura de impunidade que deve mudar.
Da próxima vez que você for à missa e ajoelhar-se naquele silêncio que envolve a igreja pouco antes da liturgia começar, faça uma oração por esse corpo ferido e surrado que chamamos de igreja. Ore por uma renovação e inspiração do Espírito Santo, e ore por uma reforma do nosso sistema falido. Então olhe para a esquerda e para a direita. Ajoelhando-se ao seu lado está provavelmente o aliado mais forte que você tem na reconstrução de uma igreja que tanto precisa ser reformada.
Isso afeta todos nós - o povo de Deus. Está mais do que na hora de nós, os leigos, exigirmos mais de nossos líderes da igreja.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O corpo de Cristo deve reivindicar sua igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU