Liliana Segre, senadora italiana, e o exame sobre as derivas racistas "Aquele tema é um grito contra a indiferença"

Foto: Reprodução Youtube

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23 Junho 2018

A desigualdade e a senadora Liliana Segre: viaja pelo mundo, mas entre migrantes a serem rejeitados e o recenseamento dos ciganos sempre retorna para o mesmo ponto. Aos 509 mil alunos que enfrentam o último exame de maturidade no antigo padrão - a partir do próximo ano tudo vai mudar - para a prova de italiano ontem o ministério centrou-se sobre o tema que a senadora aborda nas escolas, contando quando era criança e acabou sendo levada para Auschwitz.

A entrevista com Liliana Segre é de Paolo G. Brera, publicada por la Repubblica, 21-06-2018. 

Havia trechos sobre solidão e bioética, propaganda e criatividade; mas dois eram dedicados às desigualdades e à proteção das minorias, evocadas com o artigo III da Constituição (Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei...) e com o trecho da expulsão da biblioteca do protagonista de O jardim de Finzi-Contini de Giorgio Bassani.

Eis a entrevista.

Você gosta dessas escolhas?

A atenção ao Finzi Contini no octogésimo ano das leis raciais me causa grande satisfação. Somente com um presidente como Mattarella torna-se possível escolher dois títulos como aqueles. Nunca ninguém tinha visitado as Fosse Ardeatinas como primeiro ato.

No trecho, é um bibliotecário de aspecto benévolo que ordena ao narrador de "evacuar". Às vezes o mal não se expressa com um rosto sombrio. Aconteceu a você?

Quando fui expulsa da escola, dias dramáticos para mim, o meu pai chamou a professora que eu tive na primeira e segunda série: venha, por favor, senhorita ... Nós morávamos perto da escola. Eu esperava que ela fosse afetuosa, mas ela ficou muito pouco e disse: "Mas o que isso tem a ver comigo? Não fui eu quem fez as leis raciais!" Depois ela me deu um abraço, saiu e eu nunca mais a vi nem ouvi falar dela. Ela não era "má", era uma pessoa comum. Era a banalidade do grande mal que me fez.

Você se lembra quando eles a fizeram se sentir "diferente"?

Para ir à escola particular em Milão em que meu pai me matriculara, eu passava pela rua Ruffini, em frente à escola primária onde havia estudado antes. As meninas que tinham sido minhas colegas de escola ou de aula me apontavam: "Aquela é a Segre, ela não pode mais vir aqui porque é judia". Lembro-me bem do silêncio do nosso telefone, de não ser mais convidada, da exclusão.

Depois há aqueles que viram para o outro lado, os "cinquenta pares de olhos" do texto de Bassani.

Os indiferentes. Os violentos me tiraram tanto, mas os indiferentes foram a massa que não viu, que não quis ver, que virou a cara. Os ‘não sei’, ‘não estava lá’, ‘não é minha culpa’.

É uma doença que ainda temos agora?

Claro que sim! Aliás, agora é mais culpada. Na época não ser indiferentes era uma escolha perigosa contra uma ditadura, por isso tenho tanto respeito pelos antifascistas e os soldados italianos que escolheram ficar nos campos quando poderiam estar em outro lugar. Hoje que não há escolha a fazer, na democracia, ser indiferentes é mais grave.

Quando você fala com os jovens, fala ao germe da indiferença?

Eu sempre peço para colocar a palavra" indiferença "no título. E no memorial do Holocausto, no famoso trilho 21 que os milaneses pouco conhecem, pensava-se em escrever ‘nunca mais’, ‘liberdade’, as palavras usuais; eu lutei como uma exaltada para que fosse escrito ‘indiferença’ em letras garrafais, e assim foi. Qualquer um que entra, a primeira pergunta que faz aos guias é "por que indiferença aqui onde há trilhos e vagões de deportação? Porque é por causa da indiferença que existem aqueles trilhos e aqueles vagões.

E não indiferentes, lembra de alguns?

A primeira é Susanna Aimo, que ficou 47 anos na nossa casa. Ela era a camareira, como se costumava dizer. Católica, cristã muito devota, ela se arriscava todos os dias para estar perto, como foi até o fim, dos meus avós. Quando foram deportados, por um milagre não a levaram também, já que estava abraçada na minha avó. Susana foi uma das justas que não foram homenageadas no Yad Vashem porque não pode salvar ninguém; mas ela, humilde, modesta e maravilhosa, era o retrato da não-indiferente. Foi uma sorte tê-la conhecido.

Você pediu para não receber perguntas "políticas". Mas a atualidade é agressiva com os migrantes, ciganos, minorias ...

A única vez que falei sobre isso no Senado, eu disse quem eu era. Quando um Estado ou a UE são indiferentes, se chegam a apontar o dedo contra as minorias que não podem se defender ... bem, então o que pode pensar alguém que foi minoria, e quem aconteceu tudo o que aconteceu comigo?

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