16 Agosto 2017
Investigado no inquérito do ministério público de Trapani sobre o navio Iuventa da ONG alemã Jugend rettet, padre Mussie Zerai voltou a denunciar a situação dos migrantes que estão na Líbia. A denúncia foi feita através do blog de sua agência Habeshia. O sacerdote, que nasceu em Asmara e nos últimos dias foi alvo de uma série de ataques (ser cúmplice dos traficantes, as mesmas acusações lançadas pelo regime ditatorial Asmara ao qual ele faz oposição) alardeados em manchetes sobre seu empenho humanitário em favor dos refugiados, principalmente da Eritreia, escreve que "O bloqueio de navios das ONGs a 97 milhas da costa africana, ordenado pelo governo de Trípoli com o aval, aliás, com os aplausos da Itália e da EU, fecha o círculo ao que mais se parece com uma guerra contra os migrantes no Mediterrâneo".
A reportagem é de Paolo Lambruschi, publicada por Avvenire, 15-08-2017.
Padre Mussie, que denuncia as detenções desumanas na Líbia desde 2008, aumenta as críticas.
Ele reforça que "o Tribunal Penal Internacional abriu uma investigação sobre o que está acontecendo com os migrantes na Líbia nos chamados 'centros de acolhimento' e sobre determinados incidentes envolvendo a própria Guarda Costeira da Líbia, aventando até mesmo a hipótese de crimes contra a humanidade", e salienta que "todos que forem artífices dessa política de restrição à imigração e de fechamento total e todos que a defenderem – passando por cima, entre outras coisas, do fato que a Líbia sempre se recusou a assinar a Convenção de Genebra sobre os direitos dos refugiados – irão se tornar cúmplices de todos esses horrores, e cedo ou tarde serão chamados a prestar contas, inclusive diante de um tribunal de justiça".
Zerai reflete sobre a situação no Mediterrâneo que, após esses últimos dias tão convulsionados, subitamente voltou ao patamar de quatro anos atrás. Ele sempre rejeitou as acusações de ter mantido contatos via chats secretos com os traficantes de pessoas e afirma que sempre enviou e-mails à ACNUR, à Guarda Costeira italiana e de Malta e para algumas ONGs para relatar a localização de embarcações ou botes em dificuldade. Os refugiados enviavam pedidos de socorro ao seu celular, escrito até mesmo nas paredes das prisões líbias e Zerai sempre o informou a qualquer um que pudesse intervir. Isso é o que ele vai explicar aos magistrados que estão conduzindo as investigações. Mas, agora, o que vai acontecer no mar?
De acordo com Zerai “a situação das ajudas para os barcos carregados de refugiados que pedem asilo e refúgio na Europa é similar a que existia logo após a abolição do projeto Maré Nostrum quando, em virtude dos navios terem que partir de centenas de quilômetros de distância para responder aos pedidos de ajuda, houve uma imediata multiplicação das vítimas e dos sofrimentos”.
Não por acaso, "primeiro os Médicos Sem Fronteiras e depois também a Save the Children e a Sea Eye, decidiram suspender as operações de resgate no mar". De acordo com o padre eritreu, "a decisão de dar ‘carta branca’ para a Líbia para que ela, procedendo a verdadeiros bloqueios em massa, assuma o trabalho sujo de parar os refugiados e os migrantes antes mesmo que possam embarcar ou a poucas milhas da costa, é o capítulo final da política" que, iniciada com o Processo de Rabat (2006) continuou com o processo de Khartoum (novembro de 2014), com os acordos de Malta (novembro 2015) e o pacto com a Turquia (março de 2016), “cujo objetivo e estender até o Saara as fronteiras da Fortaleza Europa, rechaçando para fora dessa barreira milhares de pessoas desesperadas em busca apenas de salvação contra guerras, perseguições, fome, miséria e prendendo na armadilha do caos líbio aqueles que conseguem entrar ou são interceptados no mar e levados à força de volta para a África".
Zerai faz um apelo "para a comunidade internacional e sociedade civil da Europa, para que contestem as escolhas das instituições políticas da UE e dos estados membros e incitem a uma reformulação radical, revogando todas as decisões de bloqueio, estabelecendo canais legais de imigração e reformando o sistema de acolhimento, hoje distinto de país para país".
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"O círculo se fecha, é guerra aos migrantes”, constata Padre Mussie Zerai - Instituto Humanitas Unisinos - IHU