Quantas mancadas cometeste, São Pedro! Mas é por isso que Jesus te escolheu. Artigo de Roberto Benigni

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13 Dezembro 2025

"Pedro é assim: igualzinho a nós. Deixa-se dominar pelo medo! Ele tem fé, sim, porque no início caminha… mas ainda é pouca, como Jesus o repreende. E tem dúvidas! Assim é a fé no início: cheia de dúvidas. Todos nós as temos, como Pedro, mas vou lhes dizer mais: quem não tem dúvidas não tem fé! Parece uma contradição, mas é verdade: não se duvida do teorema de Pitágoras, mas pode-se duvidar de Deus, muito! Aliás, deve-se!"

O artigo é de Roberto Benigni, ator e diretor de cinema italiano, publicada por Corriere della Sera, 10-12-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo. 

A aventura de São Pedro é uma aventura gloriosa, todos nós o sabemos. O primeiro dos apóstolos, o maior, escolhido por Jesus para fundar sua Igreja...

Mas sua história também é repleta de desandadas, dúvidas e quedas. Além disso, tenho um monte de histórias para contar sobre Pedro: gafes, mancadas... de todos os tipos. Preciso contá-las, porque aquele Pedro dos começos é belíssimo, quase desperta ternura.

O Evangelho de Mateus nos conta isso perfeitamente, no episódio de Jesus caminhando sobre as águas. Todos vocês o conhecem, não é? É uma das imagens mais belas e poderosas do Evangelho. Quantos artistas ao redor do mundo já a retrataram! A história da arte está repleta.

Mas prestem atenção no que Pedro faz. Pedro está pescando com os outros discípulos no Mar da Galileia, enquanto Jesus está em uma colina próxima, rezando, depois de pregar para as multidões. De repente, desaba uma tempestade. Enquanto o barco é sacudido pelas ondas e pelo vento, os apóstolos veem uma figura vindo em sua direção, andando sobre a água. Vocês conseguem imaginar? Um homem andando sobre a água! Todos ficam assustados e gritam assustados: "Meu Deus, quem é? Socorro, é um fantasma!"

Ao que Jesus lhes diz: "Não tenham medo, sou eu!" Pedro, ao ouvir isso, não acredita. Claro que não, né? Alguém andando sobre a água... Então, o que acontece? O que Pedro faz? É muito lindo, prestem atenção.

Como uma criança que vê alguém no parquinho e diz: "Eu também quero ir!", Pedro diz a Jesus: "Senhor, se és tu, manda-me ir ter contigo, andando sobre as águas. Eu também!" Ah, mas eu vou lhes dizer... no lugar de Pedro, eu teria feito o mesmo, não teria resistido! "Jesus, deixa eu andar sobre as águas também!" Jesus o levou ao pé da letra. E simplesmente lhe diz: "Pedro, vem." Então Pedro saiu do barco para tentar andar sobre as águas e — vocês não vão acreditar — ele também começa a caminhar! Dá três ou quatro passos, anda sobre a água! Mas logo em seguida sente medo, se apavora, e pensa: "Ai, o que estou fazendo? Estou andando sobre as águas, não é possível!..." e começa a afundar. E grita: "Senhor, salve-me!"

É exatamente como quando éramos crianças, não é? Quando se aprende a caminhar e nosso pai nos diz: "Vem, vem!" Nós damos dois ou três passos e então, bum!, caímos no chão e nosso pai nos levanta. E, de fato, Jesus o segura pelas mãos e diz: "Homem de pouca fé! Por que duvidaste?"

Pedro é assim: igualzinho a nós. Deixa-se dominar pelo medo! Ele tem fé, sim, porque no início caminha… mas ainda é pouca, como Jesus o repreende. E tem dúvidas! Assim é a fé no início: cheia de dúvidas. Todos nós as temos, como Pedro, mas vou lhes dizer mais: quem não tem dúvidas não tem fé! Parece uma contradição, mas é verdade: não se duvida do teorema de Pitágoras, mas pode-se duvidar de Deus, muito! Aliás, deve-se!

E então, é assim que a carreira apostólica de Pedro começa: quase se afogando!...

E não para por aí, Pedro. Vocês verão o quanto apronta.

Tanto que às vezes Jesus perde a paciência com ele. Por exemplo, quando conta uma parábola e Pedro não a entende. A princípio, ele pensa: "Tudo bem, vamos lhe dar um tempo", mas depois da quarta ou quinta vez, por favor...

Como quando Jesus explica aos discípulos que eles não deveriam se preocupar tanto com o que comem — uma questão que os judeus levavam muito a sério — porque o que torna um homem impuro não é o que entra pela boca, mas o que sai dela: mentiras, hipocrisias, maldades...

Só que Pedro não entende do que se está falando e pergunta: "O que sai da boca?... Em que sentido? O que quer dizer?" Então Jesus responde: "Ah, Pedro, o que sai, ora!... Será que você não consegue entender? Vamos lá, essa era fácil!" Com outras palavras, claro, mas ele responde assim.

Vejam bem, é tudo verdade, não estou inventando nada. É o Evangelho!

E mesmo depois da Última Ceia, no momento mais dramático, Pedro não acerta uma: adormece quando deveria vigiar, faz promessas que não pode cumprir, desembainha a espada sem pensar... E no fim, apronta mesmo, a maior mancada de todos: renega Jesus três vezes! Todos vocês sabem: ele finge não o conhecer. Ou seja, termina em grande estilo! Em resumo, o pobre Pedro não acerta uma.

Mas vocês sabiam que existe até uma teoria, desenvolvida por estudiosos, chamada "critério do constrangimento"? Segundo essa teoria, são justamente os erros de Pedro que comprovam a veracidade do Evangelho. Porque, se alguém tivesse inventado a história de Jesus e dos apóstolos, teria tentado deixá-la bonita, não é? Teria contado os feitos mais admiráveis, os mais grandiosos... certamente não coisas assim.

Não por acaso Jean-Jacques Rousseau, o grande filósofo, àqueles que acusavam os Evangelhos de falsidade costumava responder: "Meu amigo, não é assim que se inventa alguma coisa". Em suma, Pedro é exatamente assim: como nós! Porque ele se assemelha a nós, profundamente. Ele se irrita, age impulsivamente, comete erros, não entende... chora, ri, adormece, sofre, se alegra... se deixa emocionar, assim como nós!

E, de fato, não dá para entender como Pedro, que está sempre cometendo mancadas, que é constantemente repreendido, que é desajeitado, confuso... pode ser o escolhido de Jesus. Mesmo depois daquela lamentável renegação, mesmo depois de ouvi-lo jurar que estava pronto para o martírio, Jesus continua a ter confiança em Pedro, a elevá-lo acima de todos os outros. Até mesmo acima daqueles que nunca cometem erros.

Porque Jesus, para liderar a Igreja, não escolhe João, o apóstolo perfeito, de fé inabalável, não: Jesus escolhe o mais humano, aquele que caiu mais baixo. O último. Talvez seja precisamente por isso que a Igreja conseguiu perdurar por tanto tempo, ao longo dos séculos. Porque a sua força nasce da fragilidade, uma fragilidade profundamente humana.

E, de fato, a história de Pedro não termina com aquela renegação, com o Calvário e a crucificação de Jesus. Aliás, em certo sentido, começa justamente ali.

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