A ameaça de intervenção militar marca o primeiro encontro presencial entre Trump e Sheinbaum

Foto: @claudiashein/Fotos Públicas

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05 Dezembro 2025

A presidente do México está viajando a Washington para um breve encontro com o primeiro-ministro canadense, tendo como pano de fundo o sorteio da Copa do Mundo.

A reportagem é de David Marcial Pérez, publicada por El País, 05-12-2025.

Nem a guerra comercial, nem a política de imigração, nem mesmo o fantasma do fentanil ou a agenda de segurança. No ano desde que Donald Trump assumiu o cargo, não houve um único encontro presencial entre o presidente dos EUA e a presidente mexicana, Claudia Sheinbaum. Foi preciso o futebol, especificamente o sorteio da Copa do Mundo do ano que vem, para proporcionar a oportunidade do primeiro encontro entre os líderes vizinhos. Nesta quinta-feira, Sheinbaum viajará a Washington para uma breve reunião tripartite no dia seguinte com o primeiro-ministro canadense, Mark Carney.

O encontro ocorre em um momento delicado na relação bilateral, já tensa desde o retorno de Trump à Casa Branca e seus constantes ataques ao México. A insistência do republicano em levantar a possibilidade de intervenção militar no México para combater o crime organizado deixou as autoridades mexicanas em alerta e testou os limites da relação entre os dois parceiros norte-americanos.

Após quase duas dezenas de telefonemas, cartas e algumas alusões e referências veladas, eles finalmente se encontrarão pessoalmente nesta sexta-feira. A revisão do acordo de livre comércio com os Estados Unidos e o Canadá (USMCA) também estará na pauta, como a própria Sheinbaum anunciou. Na coletiva de imprensa da manhã de quinta-feira, ela reiterou que “o México defende sua soberania. Temos um entendimento: não intervenção, cooperação sem subordinação e a soberania de nossos territórios”.

A resposta da presidente aos ataques de Trump tem sido firme nos últimos meses. O México aceitará a troca de informações de inteligência, como vem acontecendo há meses, mas isso de forma alguma implica abrir as portas para operações dos EUA em solo mexicano. "Não é que não queiramos apoio, mas não com tropas estrangeiras", disse a presidente recentemente, lembrando que da última vez que os Estados Unidos intervieram no México, anexaram metade do país.

Desde sua campanha eleitoral e subsequente retorno à Casa Branca, Trump tem recorrido obstinadamente à narrativa de que o México não está fazendo o suficiente para controlar a violência relacionada ao narcotráfico e o fluxo maciço de drogas, especialmente o fentanil, que representa uma epidemia de mortes e crises de saúde pública nos Estados Unidos. Com base nessa retórica, Trump declarou os cartéis mexicanos como organizações terroristas, autorizando-o a intervir em território mexicano, uma situação semelhante à enfrentada por outros países, principalmente a Venezuela.

A abordagem de Trump, que longe de ser marginal se tornou um elemento central da mensagem dos republicanos linha-dura em relação ao México, representa um grande desafio para seu vizinho do sul. Em um país onde a retórica nacionalista permanece central para todos os partidos, essa pressão externa obriga o governo a responder com firmeza para evitar qualquer percepção de fraqueza.

Sheinbaum chegou ao ponto de extraditar mais de 50 chefes do crime organizado para Washington em duas transferências separadas, uma decisão que ela defendeu como "soberana". Antes da reunião de sexta-feira com Trump, o The Wall Street Journal, citando fontes de ambos os governos, informou que outro ponto de discussão seria uma terceira transferência de narcotraficantes de prisões mexicanas para prisões nos Estados Unidos.

O clima político interno no México adiciona outra camada de complexidade. Nas últimas semanas, setores da extrema-direita com claros laços com o movimento MAGA (Make America Great Again) têm tentado capitalizar o descontentamento social. Os recentes protestos contra a presidente Sheinbaum, organizados pela Geração Z, amplificaram a retórica estadunidense que defende ações mais enérgicas. Essas correntes, atualmente minoritárias, encontraram eco em atores internacionais alinhados à agenda MAGA, que têm interesse em retratar o México como um Estado falido que necessita de intervenção externa. Embora não representem a posição dominante na política mexicana, sua presença contribuiu para polarizar ainda mais o debate público.

A dimensão econômica também não escapou da tensão. Desde o início do segundo mandato de Trump, o magnata abalou a relação bilateral ao anunciar a implementação de novas tarifas para o México, o que aumentou a incerteza quanto ao futuro econômico mexicano. Ancorado no acordo de livre comércio (USMCA), que ele pretende renegociar, o republicano impôs tarifas de 25% sobre todos os produtos não incluídos no acordo, tarifas de 25% sobre automóveis e tarifas de 50% sobre aço, alumínio e cobre.

O USMCA tornou-se a questão central e incontornável nas atuais tensões bilaterais. Durante três décadas, México, Estados Unidos e Canadá consolidaram a América do Norte como um poderoso bloco econômico graças à liberalização do comércio. Foi o próprio Donald Trump quem, em 2018, pressionou pela renegociação do acordo e convocou seus parceiros para reformulá-lo. Agora, com a revisão prestes a acontecer, Trump volta a questionar o tratado: ele sugeriu abandonar o USMCA e substituí-lo por acordos bilaterais independentes.

Este será um dos desafios que o México enfrentará em suas reuniões com seu vizinho do norte, que, desde o retorno de Trump, tem seguido uma estratégia de negociar tudo ao mesmo tempo, usando sua posição de poder para trocar uma concessão por outra. Aumentos tarifários, por exemplo, estão sendo usados ​​como punição por supostos esforços insuficientes no controle do narcotráfico ou da imigração.

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