20 Outubro 2025
O cessar-fogo vacila na fronteira com o Egito. Quarenta palestinos morrem. Smotrich e Ben Gvir: "Retomemos a guerra." As chancelarias estão em polvorosa.
A reportagem é de Gabriella Colarusso, publicada por La Repubblica, 20-10-2025.
A onda de choque que abalou a trégua em Gaza ocorreu às 10h, quando o exército israelense anunciou ter atingido vários alvos no sul, em Rafah, em resposta ao que descreveu como um ataque do Hamas: "terroristas" emergindo de um túnel "lançaram um míssil antitanque e dispararam contra as tropas". Dois soldados da Brigada Nahal foram mortos: Yaniv Kula, de 26 anos, e Itay Yavetz, de 21. O Hamas nega qualquer envolvimento: "Não temos informações sobre incidentes ou confrontos ocorridos na área de Rafah, que está sob controle da ocupação", escreveram os militantes em seu canal no Telegram.
"Nosso contato com os grupos presentes foi cortado desde março passado. Não temos nenhuma conexão com qualquer evento ocorrido naquela área e não temos como nos comunicar com nossos combatentes presentes lá, presumindo que algum deles ainda esteja vivo". Parece ser um distanciamento de uma "célula" enlouquecida, com alguns agentes contestando os acordos. Há também rumores de que o ataque foi contra o clã Shabab e não contra israelenses, mas não há evidências que confirmem isso. O Shabab, armado por Israel, controla uma área de Rafah e, durante a guerra, chegou a distribuir ajuda a parte da população para obter seu apoio. Não é o único grupo armado na Faixa de Gaza, mas o Hamas é de longe a organização mais poderosa e bem treinada e, desde o cessar-fogo, lançou um expurgo violento contra todos os oponentes.
A reação de Israel foi imediata. Netanyahu convocou as forças de segurança e ordenou ao exército que "agisse com força total". O grupo de extrema direita liderado por Ben Gvir e Smotrich pediu a "retomada da guerra". O exército bombardeou dezenas de alvos em toda a Faixa de Gaza com "mais de 120 bombas". Até mesmo os túneis onde os reféns, que até então haviam sido poupados, foram alvos. Um ataque destruiu um café na cidade de Deir Al-Balah, no centro de Gaza, matando pelo menos cinco pessoas. O alvo era Yahya al-Mabhouh, comandante das forças Nukhba, a unidade de elite do braço militar do Hamas responsável pelo ataque de 7 de outubro. A força aérea também atingiu Beit Lahia, no norte, que antes era uma cidade e agora é um campo empoeirado de escombros. Ao pôr do sol, a Defesa Civil Palestina contabilizou mais de 40 mortos.
Os ministérios das Relações Exteriores no Cairo, Doha e Washington estão em estado de agitação. Os americanos tentam apagar o fogo. O enviado americano Witkoff e Kushner conversam com o ex-ministro israelense Dermer. O pedido da Casa Branca é claro: Israel deve responder, mas sem interromper o cessar-fogo. Os israelenses anunciam o fechamento das passagens de fronteira e a suspensão da ajuda, mas foram forçados a recuar.
Witkoff e Kushner são esperados em Israel hoje, enquanto o vice-presidente americano J.D. Vance deve chegar na terça-feira, enquanto uma delegação do Hamas liderada por Khalil al-Hayya desembarcou no Cairo. Muitos problemas estão dificultando o início da chamada fase dois, começando com a abertura da passagem de Rafah, na fronteira com o Egito, que Israel manterá fechada até que o Hamas devolva os corpos dos reféns mortos, deixando assim os palestinos feridos e doentes presos aguardando a evacuação.
Por trás do impasse estão outras dificuldades, sendo a principal delas o desarmamento do Hamas. "Se eles não fizerem o que têm que fazer, faremos por eles", reiterou Trump ontem, mas os mediadores sabem que isso levará tempo. O grupo alerta que só entregará suas armas a uma entidade árabe e quando houver perspectivas de um Estado palestino.
A composição e o mandato da força de estabilização também são incertos: o Egito poderia liderá-la, mas os EUA querem que ela tenha um mandato da ONU. O silêncio dos sauditas pesa sobre tudo, pois desconfiam do protagonismo catariano e turco. Bin Salman voará para a Casa Branca em novembro. As condições para retomar as negociações de normalização com Israel são duas: um Estado palestino e um pacto de defesa mútua com os EUA, como o que Trump concedeu a Al Thani, o emir do Catar.
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