10 Outubro 2025
O Papa Leão XIV recebeu mensagens da comunidade imigrante dos Estados Unidos nesta quarta-feira, durante uma audiência privada no Vaticano. Ao bispo Mark Seitz, de El Paso (Texas), e aos representantes do Hope Border Institute, sediado em El Paso, ele disse: “Vocês estão comigo, e eu estou com vocês”.
A informação é de Elise Ann Allen, publicada por Crux, 09-10-2025.
A audiência aconteceu em meio ao aumento das tensões sobre a política e a aplicação das leis de imigração nos Estados Unidos, com relatos de tropas da Guarda Nacional de outros estados se preparando para serem enviadas já na noite de quarta-feira para um centro de processamento do ICE (Imigração e Alfândega) próximo a Chicago (Illinois), cidade onde nasceu o homem que viria a se tornar o Papa Leão XIV.
“Prefiro não comentar neste momento sobre as decisões tomadas, escolhas políticas dentro dos Estados Unidos”, declarou o Papa Leão aos jornalistas na terça-feira, um dia antes da audiência privada, ao ser questionado sobre os planos do presidente Donald Trump de usar forças militares na cidade natal do próprio pontífice.
A audiência privada ocorreu pouco mais de uma semana depois de o Papa Leão XIV ter feito declarações à imprensa sobre uma polêmica nos Estados Unidos, refletindo sobre o que significa ser pró-vida.
O Hope Border Institute é uma organização inspirada na doutrina social católica que realiza pesquisas, formação de lideranças, ações de incidência pública e estratégias humanitárias para líderes religiosos atuantes na fronteira entre os Estados Unidos e o México.
Durante o encontro, o pontífice expressou seu apoio a todos os imigrantes em suas legítimas aspirações e manifestou sua oposição a políticas que negam a dignidade humana daqueles que migram.
Seitz, que preside o Comitê de Migração da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos, conversou com o Crux Now sobre a audiência.
A seguir, trechos da conversa, editados por clareza.
Eis a entrevista
Bem, foi uma situação que se desenvolveu ao longo do tempo. Recebi um convite para participar de um painel no Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral. Pensei bastante e decidi aceitar.
Para o Jubileu dos Migrantes?
Sim, para o Jubileu dos Migrantes. Organizamos para poder participar do Jubileu no sábado, da audiência e depois da missa no domingo, e então participei do painel na segunda-feira (e de outro na quarta à tarde). Pensei: “Já que estaremos lá — talvez, quem sabe — possamos marcar uma reunião com o Santo Padre?”
O apoio dele significa muito neste momento no nosso país: muito para os imigrantes, muito para a Igreja. Então, decidimos ao menos tentar. O Hope Border Institute foi extremamente útil para comunicar esse desejo, e conseguimos organizar a reunião.
Quando percebemos que seria possível, começamos a recolher cartas que levaríamos a ele — e decidimos convidar um pequeno grupo de pessoas que trabalham no atendimento a imigrantes em El Paso. Tudo foi se organizando e crescendo de forma muito rápida, de última hora.
É assim que o Espírito Santo costuma agir.
Amém.
Imagino que as pessoas tenham compartilhado seus testemunhos e experiências no trabalho com migrantes na linha de frente. Como foi a conversa com o Papa? Ele deixou alguma mensagem para vocês?
A reunião não aconteceu exatamente como havíamos imaginado porque o Papa Leão estava atrasado. Ele tinha compromissos antes do nosso, marcado para 8h30, mas que só começou por volta das 9h. Seus secretários sugeriram que talvez ele entrasse, cumprimentasse rapidamente e fosse embora — o que às vezes acontece —, mas o Santo Padre foi muito atencioso. Não demonstrou pressa.
Ele cumprimentou cada pessoa, apresentou-se, e cada um contou um pouco de sua história. Entre os 11 presentes, havia imigrantes, meu bispo auxiliar, alguns padres da diocese, líderes leigos e um representante do Departamento de Serviços de Migração e Refugiados da Conferência dos Bispos dos EUA, David Spicer.
Vários membros do grupo tiveram oportunidade de falar com ele.
A primeira coisa que fizemos foi entregar a caixa de cartas e dizer que havia imigrantes de todo o país — crianças e adultos — que escreveram ao Santo Padre. Em seguida, perguntamos se poderíamos mostrar a ele um vídeo de quatro minutos.
Eu esperava que ele dissesse que não tinha tempo, mas respondeu: “Claro”.
Ele pareceu bastante comovido com o vídeo. Mais tarde, pediu que o compartilhássemos com o Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral. Faremos isso. Em um momento no início da reunião, quando ficou claro que ele permaneceria conosco por alguns minutos, o Papa disse: “Lamento que não possamos sentar.” E eu respondi: “Estamos muito felizes em ficar de pé com o senhor, Santo Padre.” E depois, ele disse: “Eu ficarei com vocês”.
O que significa esse apoio? A imigração é um dos temas mais polêmicos nos Estados Unidos atualmente, especialmente com o atual governo. O que representa essa mensagem do Papa?
Significa tudo. Nós sabemos que o que fazemos é justo, que está profundamente enraizado no ministério e no ensinamento de Jesus Cristo. E, por sermos católicos, por escutarmos Jesus, sabemos que se trata de um imperativo evangélico. Ainda assim, é sempre bom ter uma confirmação, e não há confirmação maior do que a que vem do Vigário de Cristo.
O Papa Francisco foi extremamente afetuoso e solidário comigo e com todos os que atuam nesse trabalho. Receber esse mesmo apoio de seu sucessor — o novo Sucessor de Pedro — significa mais do que posso expressar em palavras.
O Papa Leão recentemente respondeu de improviso a perguntas sobre a questão pró-vida, relacionando-a também com a imigração. Ele afirmou — inclusive em entrevista para meu livro — que quer trabalhar diretamente com os bispos, não necessariamente com o governo. O que você espera dessa parceria? Como transmitir a mensagem pró-vida de forma mais abrangente?
Para mim, unir essas questões não é difícil. Estou envolvido no movimento pró-vida desde os tempos de seminário. Eu era seminarista quando o caso Roe vs. Wade foi decidido. Fiquei horrorizado e me engajei desde então. Foi assim que aprendi a ter um coração voltado aos mais vulneráveis.
Vi de perto as realidades que as mulheres enfrentavam, sentindo que não tinham a quem recorrer além de interromper a gravidez. Depois, como bispo de El Paso, percebi a coerência entre esse amor por pessoas que talvez eu nunca conhecesse, mas que são meus irmãos e irmãs — pessoas que Deus me chama a amar em Cristo, a ver o rosto de Cristo nelas.
Não foi um esforço juntar esses temas. Essa ética consistente da vida é uma das mais belas doutrinas da nossa Igreja: não fazemos parte de uma ideologia que divide a moral em pedaços.
Amamos todo ser humano que Deus chamou à vida. Ponto.
Acreditamos que cada pessoa deve ser respeitada, amada e cuidada. Ponto.
Acreditamos que mesmo alguém que cometeu um crime deve ser tratado com respeito por sua dignidade humana fundamental. O mesmo vale para pessoas inocentes que fizeram exatamente o que qualquer americano faria se estivesse em sua situação — fugir para salvar a própria vida, proteger a família, evitar a fome. Essas pessoas, as mais inocentes e vulneráveis, merecem amor e respeito.
É daí que partimos.
E, a partir desse princípio, aplicamos as leis relativas à ordem pública e ao controle de fronteiras. Mas começamos com esse fundamento.
O que você espera da colaboração com o Papa nesse tema? Você mencionou que ele quer trabalhar diretamente com os bispos.
Pelo que entendi, ele está dizendo que a Igreja continuará a ensinar sobre essa questão. Não é um ensinamento novo, mas continuará a reforçá-lo — essa é sua missão. Mas [o Papa Leão] também espera que os bispos, em suas organizações nacionais e em suas dioceses, falem sobre essas questões fundamentais da doutrina da Igreja. Ele deixou claro que gostaria de ver mais isso acontecer. Esperamos poder corresponder a esse chamado.
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