18 Setembro 2025
"Leão continua o caminho de Francisco, mas com sua própria voz." É o que diz o jesuíta italiano Antonio Spadaro, considerado um confidente próximo do Papa Francisco, falecido na segunda-feira de Páscoa. Hoje, o padre, com grande conhecimento da mídia, é subsecretário do Dicastério para a Cultura e a Educação do Vaticano; anteriormente, dirigiu por muitos anos a tradicional revista jesuíta La Civiltà Cattolica. Seu livro "Da Francesco a Leone" foi publicado recentemente – apresentando uma extensa entrevista na qual Leão, ainda Cardeal Prevost, fala sobre sua visão da Igreja e seu relacionamento com Francisco. Como Spadaro vivenciou a transição de Francisco para Leão, que continuidade ele vê e como vê o Caminho Sinodal Alemão. O jesuíta discute isso em uma entrevista com katholisch.de.
A entrevista é de Mario Trifunovic, publicada por Katholisch, 17-09-2025.
Eis a entrevista.
Como o senhor descreveria a transição de Francisco para Leão?
A transição de Francisco para Leão XIV foi, acima de tudo, uma transferência espiritual. Se o elo comum entre Bento XVI e Francisco era o desafio da "mudança rápida", entre Francisco e Leão a palavra-chave é inquietação. Bergoglio a havia chamado de "inquietação sadia, a única que traz paz" e a recomendou precisamente aos agostinianos quando Prevost era seu geral. Leão XIV aceitou essa transferência: sua primeira homilia como papa começou precisamente com essas palavras. Seu ministério brota do coração inquieto de Agostinho, que "não encontra descanso enquanto não repousa em Deus".
Então não há intervalo?
A transição é menos uma ruptura do que um continuum de sensibilidade espiritual: do transbordamento franciscano ao inquieto coração agostiniano — ambos confrontados por um mundo que está se desintegrando.
Quais diferenças estilísticas entre Francisco e Leão lhe parecem mais significativas?
As diferenças são evidentes no tom e no contexto biográfico. Francisco era um jesuíta, com um forte senso inaciano do discernimento e uma concepção de liderança como exercício espiritual. Leão, por outro lado, é agostiniano: seu caráter é caracterizado pela interioridade missionária, capaz de combinar inquietação e amor. Francisco sacudiu o barco, provocou tremores, forçou a Igreja a sair de si mesma; Leão parece mais flexível, mais gentil. Francisco falava com gestos fortes e imagens radicais; Leão prefere um estilo desarmado e desarmante, longe de qualquer comunicação muscular. Sua dupla origem — estadunidense e peruana — o tornou sensível ao veneno da polarização, e seu estilo é mais de escuta paciente do que de choque imediato.
Leão está continuando o caminho de Francisco?
Sim, Leão continua o caminho de Francisco, mas com sua própria voz. O fio condutor entre os dois é ininterrupto. Francisco deixou um método, não uma receita; Leão o retoma e o continua com suas raízes agostinianas, enfatizando que a verdadeira autoridade brota do amor e da participação. Quando Leão XIV fala de uma "Igreja extrovertida", ele se refere a algo semelhante à "Igreja de mente aberta" de Francisco.
O que isso significa?
Uma igreja extrovertida não é apenas uma comunidade que se estende ao mundo: é uma comunidade que não guarda nada para si, que não guarda a verdade como uma posse, mas a compartilha como um dom. É uma igreja que não vive em defesa ou autopromoção identitária, mas em abertura. Isso significa que a igreja não se isola para se proteger, mas se deixa ferir pela realidade para moldá-la no espírito do Evangelho.

Livro "Da Francesco a Leone" de Antonio Spadaro
Quais são as consequências concretas?
Isso tem implicações de longo alcance: pastoralmente, porque a unidade não nasce da uniformidade, mas da escuta e do diálogo; e geopoliticamente, porque a diplomacia não é um exercício de poder, mas um testemunho de proximidade e responsabilidade global. Nesse sentido, Leão assume o fogo de Francisco e o leva adiante, embora de uma forma diferente.
Como a sinodalidade continuará em nível global?
Leão XIV já deixou claro que a sinodalidade não é um método de organização, mas uma forma de amor. Significa caminhar juntos, ouvir uns aos outros, mesmo em nossas diferenças. Sua experiência internacional — nos EUA, no Peru, na Cúria Romana — o tornou muito consciente de que o que importa em uma Igreja pode não ser o mesmo em outra. Ele afirmou isso explicitamente: o que pode ser importante na Igreja dos Estados Unidos pode não ser relevante na Coreia do Sul. Portanto, a sinodalidade global não será uniformidade, mas sim a coexistência das diferenças, a paciência do amor, uma coexistência inquieta. É uma visão que se entrelaça com o ecumenismo e até mesmo com a geopolítica: Leão propõe decisões que emergem da troca e do consenso, não de equilíbrios de poder, poder...
O senhor já falou de "inquietação". No seu livro "Da Francesco a Leone" (De Francisco a Leão), o senhor a chama de "eixo comum". O que isso significa exatamente?
A inquietação é a consciência de que o coração humano nunca encontra descanso a não ser em Deus: uma tensão evangélica que não se contenta, que impele a Igreja a não viver dos frutos do passado, mas a pôr-se a caminho. Francisco deixou isso como legado a Leão. E Leão imediatamente o tornou seu, expressando-o em sua primeira homilia e enfatizando que a verdadeira unidade não anula as diferenças, mas as acolhe. Até mesmo seus gestos — como o encontro com o Padre James Martin e o incentivo para continuar — refletem essa inquietação inclusiva e pastoral.
Na Alemanha, existe o Caminho Sinodal. O Cardeal Prevost participou das reuniões com os representantes alemães. Como Roma encarará isso sob Leão XIV?
Prevost já acompanhou de perto a experiência alemã como bispo prefeito. Sua visão é clara: tensões, mesmo as fortes, devem ser aceitas como sinais de catolicidade. Não se trata de suavizar as diferenças, mas sim de ouvi-las com o coração aberto, porque "a sinodalidade é a forma do amor". Ele não aplicará a lógica do controle ou do medo, mas buscará transformar polarizações em diálogo – dentro do horizonte mais amplo da Igreja universal. Como ele mesmo disse: "O povo de Deus é mais numeroso do que vemos. Não definamos seus limites."
O que isso significa para a igreja na Alemanha?
Nesse sentido, Roma, sob Leão, não verá o Caminho Sinodal Alemão com suspeita preconceituosa, mas sim como parte de um processo eclesial mais amplo que deve ser mantido com paciência e discernimento.
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