Disputa pela Inteligência Artificial e a emergência de novos soberanos globais: os CEOs das big techs

Corrida pela Inteligência Artificial é tema do Ciclo de Estudos promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU neste semestre. Conferência de abertura é ministrada hoje, às 10h, pelo engenheiro informático Mardochée Ogécime, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)

Foto: Pexels

06 Setembro 2025

Entre aqueles que observam o desenvolvimento e, principalmente, as implicações sociopolíticas da Inteligência Artificial (IA), duas são as posições que se sobressaem: a dos temerosos, que denunciam os males gerados pelo desenvolvimento técnico-científico, e a dos entusiastas, que veem na IA a fonte de resolução de todos os problemas da sociedade. Um olhar mais atento à questão, contudo, sugere que, neste campo, nem tudo é preto e branco. O desenvolvimento deste ramo da Ciência da Computação é permeado de tons de cinza, que mesclam interesses financeiros, tecnológicos e políticos, os quais alimentam a disputa pelo controle da IA. 

Enquanto alguns vibram, deslumbrados com as possibilidades geradas, a filósofa espanhola e professora emérita de Ética e Filosofia Política da Universidade de Valência, Adela Cortina, lembra que “a IA é saber científico e técnico que deve ser conduzido para alguma direção. Se quem o controla são grandes empresas que querem poder econômico ou países que querem poder geopolítico, então, não há nenhuma garantia de que será bem utilizado”. 

A IA tem sido utilizada como parceira da destruição nas guerras que assolam a humanidade, possibilitando a criação de drones que permitem “massacres inteligentes” porque tem a capacidade de bombardear os alvos desejados com precisão. Muitos países estão engajados na construção dessas aeronaves “autônomas”, controladas remotamente como se fossem videogames que matam pessoas em tempo real. 

O domínio tecnológico do desenvolvimento desse saber técnico-científico está sendo disputado pelos Estados Unidos e a China. Enquanto o primeiro lidera a corrida e não quer perder o protagonismo internacional, o segundo busca autossuficiência e tem desenvolvido seus gigantes de pagamento com cartão de crédito e de geolocalização. Segundo Stephen Roach, professor de Yale e ex-presidente do Morgan Stanley na Ásia, “somente a China pode desafiar os EUA pela coroa tecnológica”. 

A corrida pela IA, as sociedades sombrias que o conhecimento técnico-científico está ajudando a construir e as resistências aos males causados por esse saber são os temas de reflexão propostos pelo “Ciclo de Estudos A corrida pela Inteligência Artificial. Distopias capitalistas e resistências decoloniais”, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU neste semestre. A videoconferência de abertura do evento, intitulada “Tecnofeudalismo e colonialismo digital. Um olhar a partir do Sul Global”, será ministrada pelo Prof. Dr. Mardochée Ogécime, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), nesta quinta-feira, 04-09-2025, às 10h, e transmitida na página eletrônica do IHU, no YouTube e nas redes sociais. 

O poder dos CEOs das big techs 

A corrida tecnológica também tem gerado transformações em países que, diferentemente da China e dos Estados Unidos, não estão centralmente engajados no desenvolvimento tecnológico, mas são diretamente afetados por seus usos. Se, de um lado, notícias falsas abalam a democracia, buscam influenciar os processos políticos e influenciar o voto dos cidadãos, de outro, os CEOs das big techs estão se transformando nos verdadeiros soberanos globais, com forte influência sobre as presidências nacionais. 

As sanções dos Estados Unidos ao Brasil são exemplo desta influência, segundo Sthefano Scalon Cruvinel, especialista em Direito e Tecnologia e auditor judicial com atuação no Supremo Tribunal de Justiça (STJ). “O abuso de poder econômico e dominante das big techs influencia não apenas a sustentação empresarial mundial, mas também o cenário econômico e político global — o que é altamente preocupante. A retaliação econômica anunciada por Donald Trump contra o Brasil não é apenas mais um episódio das intempéries do comércio internacional. É o sintoma de um problema muito mais profundo e estrutural: a crescente submissão de decisões geopolíticas aos interesses de corporações digitais que hoje detêm mais poder do que muitos Estados soberanos”, explicou recentemente, em artigo reproduzido na página do IHU. 

No segundo governo Trump, a figura pessoal dos proprietários das big techs e as pessoas jurídicas das plataformas, observa Marcelo Chiavassa, professor de Direito Civil e Direito e Tecnologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, se misturam ainda mais e as plataformas, comenta, têm “sido grandes defensoras de Trump”. As big techs, assevera, “constituem uma oligarquia tecnocrática e descentralizada, a qual apesar de não deter o maior capital, controla as formas de poder estrutural”.

Objetivo do Ciclo de Estudos

O “Ciclo de Estudos A corrida pela Inteligência Artificial. Distopias capitalistas e resistências decoloniais” busca compreender, de maneira inter e transdisciplinar, as relações entre os avanços tecnológicos, em especial no campo da inteligência artificial, e as transformações no sistema capitalista, considerando a formação de novos contextos e possibilidades de (in)dependência e exploração tecnológica e socioespacial. 

O evento é gratuito e aberto ao público. Não é necessária inscrição para acompanhar a transmissão. Será fornecido certificado a quem se inscrever e, no dia do evento, assinar a presença por meio do formulário disponibilizado durante a transmissão. Os certificados estarão disponíveis em até 30 dias no portal Minha Unisinos. 

A programação completa do Ciclo está disponível aqui. Todas as conferências estarão disponíveis no canal do IHU no YouTube. 

Sobre o conferencista 

Mardochée Ogecime é doutor em Ciência da Informação pela UFMG, doutorando em Ciência da Computação pela UFOP, mestre em Ciência da informação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), especialista em Segurança Cibernética e em Administração de projetos pela CBTech, pela Universidad Tecnológica Nacional, na Argentina, e graduado em Engenharia pela Universidad Tecnológica de Santiago (UTESA), na República Dominica. Pesquisa Economia política da Informação, do conhecimento e das tecnologias, capitalismo informacional, capitalismo cognitivo e indústrias inteligentes.

 

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