07 Agosto 2025
Trump ignora a expansão militar israelense nos territórios onde quase dois milhões de habitantes de Gaza estão reunidos, muitos dos quais estão em um "ponto de ruptura", de acordo com fontes humanitárias no local.
A reportagem é de Joan Cabasés Vega, publicada por El País, 06-08-2025
Miroslav Jenca, subsecretário-geral das Nações Unidas, alertou na terça-feira que o plano israelense de ocupar toda a Faixa de Gaza teria "consequências catastróficas". O alerta, feito perante o Conselho de Segurança da ONU, ocorre horas antes de o Gabinete de Segurança de Israel, liderado pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, se reunir na quinta-feira para tomar uma decisão sobre a tomada do enclave.
"Isso representaria riscos para milhões de palestinos e colocaria ainda mais em risco a vida dos mantidos em cativeiro em Gaza", enfatizou Jenca. O funcionário da ONU denunciou perante o Conselho de Segurança as condições "desumanas" sofridas pelos palestinos na Faixa de Gaza e criticou Israel por "continuar a restringir severamente a entrada de ajuda humanitária em Gaza", acrescentando que os suprimentos recebidos são "extremamente insuficientes".
O presidente Donald Trump descartou na noite de terça-feira a possibilidade de líderes israelenses apoiarem a expansão da ocupação. Trump, o líder com maior influência sobre Netanyahu, afirmou que a decisão de ocupar todo o enclave "caberá a Israel".
As intenções israelenses estão angustiando a população civil e a comunidade humanitária. Olga Cherevko, membro do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), disse ao EL PAÍS de Deir al-Balah, no centro do enclave, que a população está "exausta" e "chegando a um ponto de ruptura em muitos aspectos".
Parte do establishment político israelense teria concluído que a falta de progresso na mesa de negociações para chegar a um cessar-fogo com o Hamas deixa a Israel a ação militar como única alternativa para resgatar os reféns. Paradoxalmente, o chefe do exército, Eyal Zamir, assim como alguns ministros israelenses, acreditam que a expansão da ocupação coloca em risco a vida dos reféns que permanecem no enclave. A influência da ala mais radical do governo, que almeja a ocupação e anexação total da Faixa e que pressiona o restante do governo com sua capacidade de derrubar a coalizão, deverá ser decisiva.
O líder da oposição israelense, Yair Lapid, disse a Netanyahu na quarta-feira que ocupar toda a Faixa de Gaza é uma "péssima ideia", segundo uma reportagem do Times of Israel. "Não se pode enviar o Estado de Israel à guerra a menos que se tenha o apoio da maioria dos israelenses", teria dito Lapid a ele. "E o povo de Israel não está interessado nesta guerra", acrescentou. Alguns analistas especulam que o primeiro-ministro esteja propondo o anúncio de uma ocupação total como forma de pressionar o Hamas.
A aprovação da expansão militar levaria o exército israelense a assumir o controle dos poucos territórios onde não tem presença contínua e onde quase dois milhões de habitantes de Gaza estão amontoados, fracos e famintos. Nas últimas 24 horas, o Ministério da Saúde de Gaza registrou cinco novas mortes por inanição. Desde outubro de 2023, 193 pessoas morreram por essa causa, a maioria em julho.
Diante da onda de indignação internacional provocada pelas imagens de crianças reduzidas a pele e ossos, Israel aprovou medidas para aliviar a emergência humanitária. Anunciou que, a partir de 27 de julho, implementaria "pausas humanitárias" em várias áreas do enclave e garantiria "rotas seguras" para os comboios das agências da ONU.
Dez dias depois, a área humanitária não viu os resultados esperados. Durante esse período, um total de 853 caminhões — cerca de 85 por dia — entraram no enclave por meio de travessias controladas por Israel, segundo dados do Centro Palestino para os Direitos Humanos, sediado em Deir al-Balah. O centro coleta dados do governo e de grupos internacionais. O número representa 14% do mínimo de 600 caminhões por dia exigido por fontes humanitárias para evitar a escalada da fome.
Tampouco há a percepção de existência de rotas seguras. A chegada gradual da ajuda e a incerteza sobre sua continuidade alimentam os saques devido à falta de proteção do exército de ocupação. Isso impede que a maioria dos caminhões chegue aos armazéns da ONU, cujo sistema de distribuição garante que a ajuda também chegue a crianças, idosos, feridos e doentes — os mesmos grupos vulneráveis que engrossam a lista de mortes por fome.
Gangues armadas, preenchendo o vácuo deixado pelo Hamas em algumas áreas da Faixa de Gaza, também participam dos ataques, às vezes até sequestrando caminhões, cujos motoristas denunciam o perigo do trabalho humanitário em meio ao caos. Na noite passada, pelo menos 20 pessoas morreram e dezenas ficaram feridas quando um caminhão capotou perto do campo de refugiados de Nuseirat, no centro do enclave. A informação foi confirmada por Mahmoud Bassal, porta-voz da defesa civil, que afirmou que "centenas de civis" aguardavam ajuda.
O exército israelense controla atualmente diretamente 75% da Faixa de Gaza. A área total sob presença militar israelense ou ordens de evacuação desse mesmo exército é de 87%, segundo dados do OCHA. Isso significa que quase dois milhões de pessoas estão amontoadas em 12% do território. "As condições são horríveis", protesta Cherevko, da mesma organização: "Eles não permitem a entrada de materiais para a construção de abrigos, as pessoas dormem ao relento e muitas passam dias sem comer."
Cherevko insiste em denunciar as restrições e os atrasos que, segundo ela, as autoridades israelenses estão usando para torpedear a ação humanitária. Ela acrescenta que estão sendo oferecidas rotas "perigosas e congestionadas". Tudo isso, lamenta, levou as comunidades locais "a perder a confiança de que receberão ajuda por meio dos mecanismos humanitários normais".
O porta-voz do exército israelense em árabe, Avichay Adraee, emitiu novas ordens de evacuação — ou "ordens de expulsão", como os moradores de Gaza as chamam — para várias áreas na manhã de quarta-feira, empurrando a população civil de volta para o mar. Ordens foram emitidas em Khan Yunis, onde o exército afirma estar agindo "vigorosamente", e em alguns bairros da Cidade de Gaza, uma das áreas da Faixa que o gabinete de segurança israelense poderia considerar invadir nesta quinta-feira.
Enquanto isso, a ofensiva militar continua. O Ministério da Saúde de Gaza informou na quarta-feira que as hostilidades israelenses causaram 138 mortes e 771 feridos no último dia. A maioria, segundo a mesma contagem, morreu enquanto aguardava ajuda. O exército israelense, por sua vez, declarou em comunicados que atacou "locais de produção de armas" do Hamas e que o fez após tomar "medidas para mitigar o risco de danos à população civil". Em outra operação em Tuffah, ao norte do enclave, o exército relatou uma operação na qual destruiu uma "célula terrorista" composta por "aproximadamente 10 terroristas".