24 Julho 2025
Em parecer histórico, a corte internacional sinalizou a possibilidade de países afetados pela crise climática reivindicarem reparações de nações ricas.
A informação é publicada por ClimaInfo, 24-07-2025.
Os Estados têm o dever legal de agir contra a mudança do clima, e a inação pode ser passível de responsabilização sob o Direito Internacional. Essa é a opinião do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), formulada em um parecer consultivo divulgado nesta 4a feira (23/7).
A sinalização abre novas perspectivas para a litigância climática internacional, inclusive abrindo para nações afetadas pela crise climática a possibilidade de reivindicarem reparações dos governos de países desenvolvidos.
O documento de 133 páginas assinado pelos 15 integrantes do TIJ reconheceu o que a ciência já afirma há décadas: o mundo vive um processo de mudança climática causada pelas emissões crescentes de gases de efeito estufa liberadas pelas atividades econômicas, especialmente a queima de combustíveis fósseis. Para a Corte, os países têm responsabilidade de evitar danos ao clima e, nesse contexto, de agir para combater suas causas.
A omissão dos governos, de acordo com o parecer, pode ser passível de responsabilização sob o Direito Internacional. “As consequências legais resultantes da prática de um ato internacionalmente ilícito podem incluir reparações integrais aos Estados lesados na forma de restituição, compensação e satisfação”, pontuou o TIJ.
Segundo a Corte, o fato da crise climática ser um problema global não isenta os Estados individuais de responsabilidade, e aqueles que foram prejudicados podem, em tese, mover ações judiciais relacionadas ao clima contra aqueles que causaram o problema. Os juízes reconheceram que o estabelecimento de um nexo causal é mais difícil do que no caso de poluição local, mas assinalaram que isso não seria impossível e que avanços científicos podem facilitar esse processo.
Os juízes do TIJ também criticaram os países que não fazem parte dos acordos climáticos internacionais, afirmando que estes ainda precisam demonstrar que suas políticas e práticas são consistentes com outras partes do Direito Internacional. Esse argumento é uma indireta aos EUA do negacionista Trump, que retirou os EUA pela 2a vez do Acordo de Paris.
O parecer é fruto de um esforço de pequenas nações insulares, lideradas pelo governo de Vanuatu, que logrou aprovar uma requisição formal por parte da Assembleia Geral da ONU em 2023. Os integrantes do TIJ foram consultados sobre dois aspectos: se os Estados têm obrigação de garantir a proteção do sistema climático e do meio ambiente contra as emissões antropogênicas de gases de efeito estufa para seus cidadãos e para as gerações presentes e futuras; e quais seriam as consequências legais que os Estados enfrentariam sob essas obrigações em caso de danos decorrentes de atos e omissões desses atores.
No final de 2024, o TIJ realizou audiências na sua sede, em Haia (Países Baixos), ocasião em que os governos foram convidados a apresentar seus argumentos relativos às questões feitas pela Assembleia Geral. Enquanto representantes de países como EUA, Austrália, Arábia Saudita e China rejeitaram qualquer responsabilização sob o Direito Internacional fora do âmbito da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), os pequenos países insulares argumentaram que a abordagem da crise climática sob o Direito Internacional não pode ficar isolada a esse regime, destacando que os impactos da crise climática são existenciais para essas comunidades.
“As questões levantadas pela Assembleia Geral representam mais do que um problema jurídico”, afirmou Yuji Iwasawa, presidente do TIJ, durante a apresentação do parecer. “É um problema existencial de proporções planetárias que põe em risco todas as formas de vida e a própria saúde do nosso planeta”.
O parecer consultivo do TIJ teve grande repercussão nas imprensas nacional e internacional, com destaques em AFP, Al-Jazeera, Associated Press, BBC, Bloomberg, Deutsche Welle, Euronews, Financial Times, Guardian, NY Times e Reuters, além de CNN Brasil, Folha, g1 e O Globo