04 Julho 2025
"Os católicos não precisam mais se envergonhar por causa de Galileu. Podemos nos orgulhar de que o Vaticano queira ser um líder na luta em defesa da investigação científica", escreve Thomas Reese, jesuíta, ex-editor-chefe da revista America, em artigo publicado por National Catholic Reporter, 03-07-2025.
Líderes religiosos podem desempenhar um papel importante na restauração da confiança pública na ciência como uma força para o bem.
Em todo o mundo, estamos "testemunhando um aumento alarmante nas tentativas de desacreditar, politizar ou suprimir o conhecimento científico", diz o Vaticano em um novo documento (16 de junho) da Pontifícia Academia das Ciências defendendo a liberdade da ciência.
"Esses desenvolvimentos não apenas colocam em risco a integridade da ciência, mas também colocam em risco o bem-estar das sociedades que dependem da ciência para enfrentar seus desafios mais urgentes, incluindo pobreza, pandemias, assistência médica, mudanças climáticas e uso de inteligência artificial", diz a declaração.
Alguns podem se surpreender ao ouvir a Igreja defendendo a ciência, já que todos se lembram de como Galileu se meteu em encrenca com as autoridades da Igreja. Cristãos fundamentalistas ainda não conseguem conciliar a história da criação em Gênesis com as explicações científicas contemporâneas da cosmologia e da evolução.
Isso não é mais um problema para os teólogos católicos. O Vaticano se dedica à astronomia desde pelo menos 1582, quando astrônomos ajudaram o Papa Gregório XIII a sincronizar o calendário com a rotação da Terra em torno do Sol. Trinta e cinco crateras na Lua têm nomes de cientistas e matemáticos jesuítas.
Cientistas padres católicos desempenharam um papel importante no avanço da ciência: Gregor Mendel (1822-1884), o pai da genética moderna; Georges Lemaître (1894-1966), que propôs pela primeira vez a teoria do Big Bang; e Jean Picard (1620-1682), não de "Jornada nas Estrelas", mas a primeira pessoa a medir com precisão o tamanho da Terra.
Ainda assim, o mito de que bons cristãos devem ser anticientíficos se repete.
Em vez de atacar a ciência, esta nova declaração de preocupação da Pontifícia Academia de Ciências, "Protegendo a Liberdade da Ciência e Prevenindo a Distorção da Verdade Científica", é uma defesa total da ciência, que ela acredita ser "fundamental para o desenvolvimento da humanidade" e precisa ser protegida "de interferência ideológica ou política".
As fontes dos ataques à ciência e à verdade são complexas e interligadas, argumenta a Pontifícia Academia.
"Em muitos cenários, fatos científicos são manipulados ou suprimidos para servir a objetivos políticos de curto prazo", relata a academia. "Líderes ou grupos de interesse podem negar verdades inconvenientes para preservar poder ou interesses econômicos, em vez de abordar realidades difíceis com políticas baseadas em evidências".
Lamenta a rejeição do consenso científico em favor de teorias da conspiração.
"A ciência às vezes é retratada como elitista ou tendenciosa", disse a academia, "apesar de sua natureza autocorretiva, ou seja, a ciência que avança frequentemente corrige a sabedoria estabelecida e sempre deve estar aberta a novos insights".
O documento é especialmente oportuno nos Estados Unidos, onde autoridades governamentais estão dando mais crédito a teorias da conspiração do que ao consenso científico. Por exemplo, universidades americanas de pesquisa, como Harvard, estão sob ataque, e a pesquisa científica está sendo cortada por motivos políticos pela Fundação Nacional de Ciências (National Science Foundation) e pelos Institutos Nacionais de Saúde (National Institutes of Health), administrados pelo governo Trump, que costumavam ser grandes apoiadores da ciência.
O Vaticano também se preocupa com o fato de que "a comercialização da pesquisa e a captura da ciência por indústrias poderosas podem levar a conflitos de interesse. A confiança pública é corroída quando a ciência parece servir principalmente a lucros privados em vez do bem público". E, observa, "as mídias sociais e as plataformas online aceleraram a disseminação de pseudociência e falsidades". Como resultado, "as empresas de mídia social devem tomar medidas mais firmes para limitar a disseminação de desinformação e apoiar fontes autênticas. Transparência e responsabilidade algorítmicas são urgentemente necessárias".
Infelizmente, "governos repressivos foram além da negligência com a ciência e passaram a punir ativamente aqueles que dizem a verdade científica aos poderosos. Instituições científicas foram fechadas e pesquisadores enfrentaram ameaças legais ou físicas", diz o documento.
Quais são as soluções? A academia apela aos líderes políticos para que "defendam a independência das instituições científicas e resistam à politização da pesquisa. O apoio à ciência básica e aplicada deve ser protegido como um investimento no bem público. As decisões políticas devem ser guiadas pelas melhores evidências disponíveis, não por ideologia ou desinformação".
Ao mesmo tempo, afirma: "Os cientistas devem reafirmar seu compromisso com o rigor, a transparência e a responsabilidade ética. Eles devem se envolver ativamente com a sociedade, comunicar suas descobertas com clareza e ouvir respeitosamente as preocupações do público".
A Pontifícia Academia apela às comunidades religiosas para que "reconheçam e promovam a compatibilidade entre ciência e espiritualidade". Acredita que "razão e fé podem coexistir em enriquecimento mútuo. Líderes religiosos podem desempenhar um papel poderoso na restauração da confiança pública na ciência como uma força para o bem", afirma.
Ele também pede uma coalizão global de partes interessadas para defender o direito de buscar e falar a verdade científica.
"Ao fazer isso", afirma, "não apenas protegemos a integridade da ciência, mas também defendemos a dignidade, a justiça e a sustentabilidade do nosso futuro humano comum".
Os católicos não precisam mais se envergonhar por causa de Galileu. Podemos nos orgulhar de que o Vaticano queira ser um líder na luta em defesa da investigação científica.