23 Abril 2025
"O álibi da eficiência não reflete os serviços privatizados de Manaus! A cidade, assim como toda a região amazônica, é vista como um meio de exploração para os olhos gananciosos dos capitalistas que pouco se interessam pelo bem da população e pela preservação da biodiversidade. Tudo é transformado em mercadoria para servir ao mercado de capitais às custas da devastação cultural e do colapso socioambiental. As alternativas são perseguidas e eliminadas cruelmente para não oferecer resistências", escreve Sandoval Alves Rocha.
Sandoval Alves Rocha, doutor em Ciências Sociais pela PUC-Rio, mestre em Ciências Sociais pela Unisinos, bacharel em Teologia e bacharel em Filosofia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), membro da Companhia de Jesus (jesuíta), trabalha no Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (Sares), em Manaus.
A capital amazonense vive um eterno drama com os serviços públicos geridos por empresas privados, mostrando que o bem-estar da população é um princípio cada vez mais esquecido. Empresas instaladas em Manaus e muitas vezes sedeadas em outros Estados, não se empenham em oferecer serviços qualificados, mas buscam somente lucrar com benefícios públicos, tarifas exorbitantes e a precariedade materializada em empreendimentos ineficientes.
O transporte público, serviço essencial em uma cidade de grandes proporções como Manaus, é um exemplo de que a privatização não é a solução para resolver os nossos problemas urbanos. A crise do transporte público não é um fenômeno recente na capital amazonense. A greve dos motoristas é somente um episódio sintomático para mostrar o drama vivido há décadas pela omissão dos poderes públicos que ignoram a sua missão de construir uma cidade mais agradável, justa e sustentável.
Tarifas exorbitantes que impedem o acesso da população a um direito fundamental. Ônibus caindo aos pedaços e sem segurança desmotivam o uso do transporte público e provocam uma corrida aos transportes alternativos. Falta de profissionais preparados e bem remunerados para lidar com a população também caracteriza o transporte oferecido pelas linhas de ônibus na cidade. Estradas esburacadas e exaustivas horas de trabalho dos motoristas provocam acidentes fatais que consolidam uma tradição de violência no trânsito. Frotas reduzidas e transportes superlotados evidenciam uma sociedade autoritária e escravagista.
O álibi da eficiência não reflete os serviços privatizados de Manaus! A cidade, assim como toda a região amazônica, é vista como um meio de exploração para os olhos gananciosos dos capitalistas que pouco se interessam pelo bem da população e pela preservação da biodiversidade. Tudo é transformado em mercadoria para servir ao mercado de capitais às custas da devastação cultural e do colapso socioambiental. As alternativas são perseguidas e eliminadas cruelmente para não oferecer resistências.
O abastecimento de água e esgotamento sanitário são outros serviços que mostram a trágica atuação da iniciativa privada na cidade. Com um baixo desempenho, estes serviços são regularmente lembrados pela sua precariedade e irregularidade que provocam intervenções políticas, judiciais e legislativas de diversas proporções. Tarifas exorbitantes e abusivas, falta de água nas comunidades, serviços mal concluídos, ausência do esgotamento sanitário, metas não cumpridas e rompimento de adutoras. Muitos relatos mostram que a população está exausta e não suporta mais a concessionária de água e esgoto da cidade!
Três Comissões Parlamentares de Inquéritos (CPIs 2005, 2012 e 2023), dezenas de audiências públicas, centenas de protestos populares e milhares de processos judiciais são algumas das ações que mostram que os serviços de água e esgoto também seguem a lógica da iniciativa privada, que busca lucrar o máximo, reduzindo investimentos e protelando o cumprimento de metas contratuais.
A má qualidade dos serviços oferecidos pode ser também notada em outras áreas largamente conhecidas pela sua ineficiência enquanto estão nas mãos das empresas privadas: os serviços telefônicos e a iluminação pública. As empresas que controlam estes serviços sempre estão nas primeiras colocações no ranking das empresas mais reclamadas da cidade. A dificuldade de fiscalização é um dos fatores que mais influenciam na qualidade dos serviços oferecidos.
Estes problemas estão na raiz das inúmeras reestatitazações ocorridas no mundo. O Estado resgata os serviços, ensejando oferecer serviços mais acessíveis a todos. Estas crises dos serviços privatizados são oportunidades de a sociedade repensar os modelos de serviços e reestrutura-los aos modos de operação em que a população seja mais beneficiada e o bem comum seja mais valorizado.