13 Março 2025
Pouco mais de um mês após o início de seu segundo mandato, o presidente Donald Trump já estabeleceu grande parte da base necessária para cumprir sua promessa de realizar “a maior operação de deportação doméstica da história dos Estados Unidos”.
A reportagem é de J.D. Long García, publicada por America, 11-03-2025.
Uma publicação feita em 20 de fevereiro no X pelo Departamento de Segurança Interna detalha alguns desses passos. Trump declarou emergência nacional na fronteira sul, retomou a construção do muro fronteiriço e assinou a Lei Laken Riley, que exige a detenção de imigrantes indocumentados condenados por crimes.
O governo até começou a usar a Baía de Guantánamo para facilitar deportações e negociou novos acordos com alguns países latino-americanos que antes se recusavam a aceitar deportados. A secretária do D.H.S., Kristi Noem, relata uma queda significativa no número de travessias ilegais desde a posse de Trump.
Até agora, no entanto, a administração permaneceu em silêncio sobre o destino dos imigrantes indocumentados que chegaram aos Estados Unidos quando crianças. Eles ficaram conhecidos como “Dreamers”, em referência ao Dream Act (Development, Relief, and Education for Alien Minors Act), que tentou, pela primeira vez em 2001, criar um caminho para a cidadania dessa população.
“We want justice you say how! Free Mahmoud Khalil now!”.
— Luis.Documents🧢 (@mfsgottenshook) March 11, 2025
A hundred students from NYU and other schools March throughout canal street in Manhattan demanding the release of the political prisoner Mahmoud Khalil. NYPD still watching closely and frequently talking with legal team. pic.twitter.com/BqiHyTVqZm
Muitos, mas não todos, os Dreamers são beneficiários do programa Ação Deferida para Chegadas na Infância (DACA), instituído pelo presidente Barack Obama em 2012, que protege cerca de 690 mil Dreamers da deportação. O programa também lhes concede autorização de trabalho.
“Sempre dependi do DACA”, disse Alma, uma beneficiária do programa e graduada por uma universidade jesuíta, que pediu para não ter seu sobrenome revelado. Ela teme se tornar um alvo caso a política da Casa Branca sobre os Dreamers mude. “O DACA me permitiu ter uma carteira de motorista… viver sem medo e trabalhar”.
Mas Alma também se sente frustrada com a constante incerteza sobre seu futuro nos Estados Unidos e com o fato de ter que gastar mais de 500 dólares a cada dois anos para renovar sua inscrição no programa. Ela recebeu o benefício pela primeira vez aos 15 anos e descreve sua situação legal como um limbo.
“Os beneficiários do DACA sempre estiveram esperando um caminho para a cidadania”, explica Alma à revista America. “Mas penso em todos os outros estudantes que estão em situação semelhante e que não podem viver à luz do dia. O DACA me deu uma forma de não viver nas sombras”.
Ao longo dos anos, os americanos demonstraram grande compaixão pelos Dreamers. Em 2018, uma pesquisa da CBS revelou que 87% dos entrevistados acreditavam que os Dreamers deveriam ser autorizados a permanecer nos EUA. Mas, à medida que o governo Trump intensifica seu foco na política de imigração, a opinião pública está mudando? Uma pesquisa recente da NPR/Ipsos revelou que menos da metade dos americanos apoia permitir que os Dreamers fiquem no país.
A diminuição do apoio, somada à intensa ênfase do governo Trump na imigração, tem deixado os beneficiários do DACA inseguros sobre seu futuro.
“O DACA deveria ser como um curativo temporário”, disse Jorge Palacios, coordenador de migração para engajamento juvenil na Ignatian Solidarity Network. “Ninguém achou que o DACA seria uma solução séria e de longo prazo”.
Na verdade, Palacios destaca que os Dreamers não podem mais se inscrever no DACA. O Departamento de Segurança Interna está processando apenas renovações para os beneficiários atuais. Para se qualificar, os candidatos precisavam estar nos EUA antes de 1º de janeiro de 2007. Isso significa que a maioria dos universitários Dreamers hoje não é elegível para o status protegido.
Palacios diz não conhecer um único estudante de graduação que seja beneficiário do DACA, mesmo que sua experiência de imigração tenha sido semelhante à dos Dreamers “oficiais”. “Se alguém tem 18 anos e está no primeiro ano da faculdade, teria que ter um ano de idade quando chegou aos Estados Unidos”, explica.
O DACA criou uma falsa sensação de esperança, segundo Camila, que também pediu para não ter seu sobrenome revelado por precaução. Ela está envolvida com a Ignatian Solidarity Network desde sua graduação na Universidade Loyola Marymount, em Los Angeles.
Atualmente, sem autorização de trabalho, recém-formados indocumentados enfrentam dificuldades para encontrar emprego, diz Camila. Novas iniciativas lideradas por universidades, como bolsas e auxílios financeiros, ajudaram alguns graduados indocumentados que não têm permissão de trabalho.
“O primeiro instinto [entre os beneficiários do DACA] é o medo ou a preocupação, e com razão, porque… muitas coisas que estão sendo ditas [pelo governo Trump] ameaçam o sustento das pessoas”, disse Camila. “Mas, ao mesmo tempo, também vemos as pessoas se unindo”.
Camila tem sido uma peça-chave para essa mobilização na Loyola Marymount. Ela imigrou do Peru com sua família quando criança e estava no último ano da universidade quando participou pela primeira vez do Ignatian Family Teach-in for Justice, um evento anual da Ignatian Solidarity Network em Washington. Foi lá que percebeu que muitos estudantes imigrantes não tinham o apoio necessário em suas faculdades.
Na L.M.U., no entanto, encontrou um ambiente acolhedor, incluindo auxílio financeiro, conexão com outros estudantes em situação similar e professores e funcionários dispostos a ajudar. Camila fez parte da liderança de um grupo chamado Resilience, uma organização estudantil voltada para os direitos dos imigrantes.
A UnDocu Network também realiza cúpulas anuais. A mais recente aconteceu em janeiro e reuniu cerca de 50 estudantes e ex-alunos de universidades jesuítas de todo o país, incluindo residentes nos EUA que cresceram sem documentos, em famílias de status misto ou em comunidades imigrantes.
“Ouvir alguém compartilhar sua experiência e sentir que estou sendo ouvido é algo incrível”, disse Jonathon Mora, da UnDocu Network, destacando as histórias comuns entre os beneficiários do DACA. “Não estamos passando por isso sozinhos e não somos os únicos lutando por isso”, disse à America. No último mês de maio, Mora se tornou o primeiro de sua família a se formar na faculdade.
Mora, que busca uma carreira jurídica, é cidadão americano, mas cresceu em um bairro imigrante. Para ele, às vezes basta fazer uma pergunta e ouvir a resposta para transformar a vida de alguém.
“Se queremos ser defensores, precisamos permitir que a pessoa que queremos apoiar fale e amplificar sua voz”, afirmou.
Palacios, que cresceu em uma família de status imigratório misto, acredita que a UnDocu Network, iniciativa liderada por estudantes, tem sido essencial para conectar aqueles diretamente afetados pelas mudanças na política migratória e para fortalecer o trabalho da Ignatian Solidarity Network.
Com o governo Trump intensificando suas políticas de imigração, “a nossa mensagem fundamental é sobre o que podemos fazer para cuidar uns dos outros”, disse ele. “No meio de todo esse medo, há uma clareza de esperança que impulsiona tudo o que fazemos”. Uma esperança que, segundo ele, surge em um momento “extremamente adverso” para os migrantes.