02 Novembro 2024
Nova Roma é a grande cidade do futuro, habitada por tipos como Cesar Catilina, o cientista e arquiteto utópico que sonha com a construção de uma nova sociedade, o prefeito corrupto Frank Cícero, que se equilibra nos mecanismos da política tradicional, e o banqueiro Hamilton Crassus III, que tem um sobrinho, Clodio Pulcher que é a mais perfeita tradução do populista fascista com um lado influencer.
O comentário é de Neusa Barbosa, jornalista e crítica de cinema, publicado por CineWeb, 25-09-2024.
É difícil saber o que pensar de Megalópolis, o filme que Coppola sonhava fazer há 40 anos anos e finalmente entregou, com todas as pompas em Cannes, deixando meio mundo perplexo.
Neste que pode muito bem ser um filme-testamento, há o melhor e o pior do diretor que trouxe ao mundo A Conversação, Apocalypse Now - suas duas Palmas de Ouro até aqui - e a trilogia O Poderoso Chefão.
De melhor, há a ambição de se jogar de cabeça num projeto arriscado, futurista, caro (divulga-se que o diretor gastou US$ 120 milhões do próprio bolso), com um visual arrojado, um desenho de produção que visivelmente investiu tudo para criar esse universo de uma Nova Roma, dominada pela ambiguidade de tipos como Cesar Catilina (Adam Driver), o cientista e arquiteto utópico que sonha com a construção de uma nova sociedade, o prefeito corrupto Frank Cícero (Giancarlo Esposito), que se equilibra nos mecanismos da política tradicional, e o banqueiro Hamilton Crassus III (John Voight), que tem um sobrinho, Clodio Pulcher (Shia LaBeouf) que é a mais perfeita tradução do populista fascista com um lado influencer que vem assolando vários países do mundo. Muitas referências latino-americanas virão à mente, a mais próxima delas, no momento, a do presidente argentino Javier Milei.
Mas, aos 85 anos, a memória de Coppola explora referências mais longínquas, levando-o a evocar figuras de um passado mais ou menos recente, como Adolf Hitler e Benito Mussolini. Coppola não esconde que sua ambição é fazer uma reflexão política sobre o mundo onde vivemos, seu esgotamento sócio-ambiental, sobre os pioneiros utópicos - que não raro são incompreendidos e podem também ser autoritários - e uma gama imensa de temas.
Pode-se criticá-lo por alguns excessos e por não ter conseguido dar conta de todas as suas ambições, mas não de ter deixado de tentar com todas as suas forças. O esforço artístico de Coppola é para respeitar.
De todo modo, esse mundo que se vislumbra em Megalópolis não é propriamente uma visão de futuro, é claramente uma metáfora ácida sobre os EUA de hoje, um sucessor do Império Romano mergulhando rapidamente na decadência, ameaçado por tendências autoritárias, pela amoralidade de suas lideranças, pelo desprezo a valores humanos. Neste sentido, destaca-se a jornada que aproxima Cesar Catilina de Julia Cicero (Nathalie Emmanuel), a filha do prefeito, criando um romance que humaniza uma narrativa em que muitas vezes a empolgação pelo excesso rouba um pouco da consistência e da energia.
Outras presenças de destaque no elenco são Aubrey Plaza, como a ambiciosa jornalista e arrivista Wow Platinum, Talia Shire, como a mãe de Cesar, Constance Crassus Catilina, e Dustin Hoffman, como o duvidoso Nush Berman. Laurence Fishburne comparece igualmente como um coadjuvante de valor, Fundi Romaine, o motorista e protetor de Cesar Catilina a quem cabe a função de narrador e comentarista do vendaval de acontecimentos turbulentos que se sucedem ao longo das 2h13 do filme. Que chega às telas para causar perplexidade, revolta, admiração ou raiva, mas não deve deixar ninguém indiferente.
Nome: Megalópolis
Ano: 2024
País: EUA
Gênero: Drama
Duração: 138 minutos
Classificação: 14 anos
Cor da filmagem: Colorido
Direção: Francis Ford Coppola
Elenco: Adam Driver , Aubrey Plaza , Giancarlo Esposito , Shia LaBeouf , Jason Schwartzman
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Megalópolis. Comentário de Neusa Barbosa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU