19 Outubro 2024
"Byung-Chul Han nos oferece uma análise profunda da ansiedade por resultados na sociedade do cansaço. Em um mundo onde o indivíduo se autoexplora e se torna prisioneiro de sua própria busca por produtividade, a ansiedade se torna uma constante", escreve o professor Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves, teólogo, filósofo, historiador, graduado em História, Filosofia e Teologia, mestre em Teologia, especialista em Ética e em Inovação e Projetos para a Educação. Também leciona Teologia, Ensino Religioso, Filosofia e Projeto de Vida.
Byung-Chul Han é um filósofo e ensaísta sul-coreano, professor da Universidade de Artes de Berlim. Ele estudou Filosofia na Universidade de Friburgo e Literatura Alemã e Teologia na Universidade de Munique.
Nos últimos anos, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, tem se destacado como um dos principais críticos do modo de vida contemporâneo, particularmente em relação às dinâmicas de produção e consumo na era do neoliberalismo. Em sua obra A sociedade do cansaço (2017), Han argumenta que vivemos em um regime marcado pela pressão constante de produtividade, eficiência e resultados, o que leva à exaustão física e mental. Nesse contexto, a ansiedade por resultados é um dos elementos centrais que caracteriza o sujeito contemporâneo, imerso em um ciclo incessante de autoexploração e fadiga.
Byung-Chul Han apresenta a tese de que a sociedade moderna não é mais disciplinar, como era descrita por Michel Foucault, mas sim uma sociedade de desempenho. Se antes os indivíduos eram moldados por uma disciplina externa, regulada por instituições como escolas, fábricas e prisões, hoje eles são regidos por uma lógica de autoexploração.
“A sociedade disciplinar é uma sociedade da negatividade. (...) A sociedade do desempenho vai se desvinculando cada vez mais da negatividade. (...) No lugar de proibição, mandamento ou lei, entram projeto, iniciativa e motivação” (HAN, 2017, p. 24).
O sujeito da sociedade contemporânea, chamado por Han de "sujeito de desempenho", é alguém que se autoconstrange a ser sempre mais eficiente e produtivo, internalizando essa pressão de maneira profunda. Ao invés de serem forçados a produzir por uma autoridade externa, os indivíduos agora se sentem compelidos a isso por uma motivação interna que visa superar constantemente seus próprios limites.
Esse movimento é impulsionado pela ideologia neoliberal, que transforma o sujeito em empresário de si mesmo, alguém que deve gerir a própria vida como um projeto contínuo. A ansiedade por resultados surge, nesse cenário, como consequência direta da exigência constante de superação e melhoria. O fracasso, nesse contexto, não é apenas um obstáculo profissional, mas uma falha pessoal, gerando sentimentos de inadequação e ansiedade crônica.
Han sugere que vivemos em uma era de "excesso de positividade". O excesso de estímulos, opções, tarefas e informações resulta em uma sobrecarga psíquica, e a pressão para sermos bem-sucedidos em todas as esferas da vida, incluindo a profissional, pessoal e até mesmo nas redes sociais, cria uma forma de cansaço crônico. Esse "excesso de positividade" é o motor da ansiedade contemporânea, pois impõe a ideia de que sempre há algo mais a ser alcançado, algo mais a ser feito. Nessa lógica, o repouso e a contemplação se tornam quase impossíveis, pois o sujeito é constantemente pressionado a agir, a produzir e a obter resultados.
A autoexploração, que é uma característica marcante desse regime, não permite descanso. Ao contrário da exploração clássica, que vinha de fora, o indivíduo agora é explorado por si mesmo, e isso o conduz a um estado de exaustão que, como aponta Han, frequentemente se manifesta em doenças psíquicas como a depressão e o Burnout:
“O que causa a depressão do esgotamento não é o imperativo de obedecer apenas a si mesmo, mas a pressão de desempenho. (...) O que torna doente, na realidade, não é o excesso de responsabilidade e iniciativa, mas o imperativo do desempenho como um novo mandato da sociedade pós-moderna do trabalho” (HAN, 2017, p. 27).
O cansaço extremo, portanto, é uma característica intrínseca ao sujeito de desempenho, que está permanentemente ansioso por alcançar resultados, sem perceber que essa pressão está destruindo sua saúde mental e física.
A ansiedade por resultados é intensificada pela cultura do empreendedorismo, que transforma todas as atividades humanas em projetos mensuráveis e lucrativos. Nesse sentido, o tempo livre, o lazer e até mesmo as relações interpessoais são convertidos em tarefas com metas e prazos, gerando um ciclo vicioso de produtividade e comparação. A busca incessante por sucesso e reconhecimento, alimentada pelas redes sociais e pelos ideais neoliberais, gera uma ansiedade que nunca pode ser plenamente satisfeita, pois o sucesso é sempre medido em relação ao desempenho dos outros.
Essa ansiedade por resultados se torna particularmente evidente no campo profissional, onde as metas impostas são muitas vezes inalcançáveis, levando os indivíduos a sentirem que nunca estão à altura das expectativas. Essa dinâmica cria um ambiente propício para o surgimento de doenças mentais, uma vez que a percepção de fracasso constante abala profundamente o bem-estar psicológico.
Han também critica a ideia de liberdade promovida pela sociedade neoliberal. O sujeito contemporâneo acredita que está livre para escolher seu próprio caminho e que pode alcançar qualquer objetivo através de esforço e perseverança. No entanto, essa liberdade é ilusória, pois está condicionada pelas normas de desempenho e produtividade. O indivíduo está preso a um ciclo de autoexploração e ansiedade por resultados, onde qualquer falha é vista como uma insuficiência pessoal.
A liberdade, segundo Han, deveria estar associada à possibilidade de dizer "não", de se recusar a entrar no ciclo incessante de produção e consumo. No entanto, na sociedade de desempenho, essa recusa é quase impossível, pois o indivíduo é constantemente bombardeado com a necessidade de ser produtivo, eficiente e bem-sucedido. A ansiedade por resultados, nesse sentido, é um reflexo da ausência de verdadeira liberdade no mundo contemporâneo.
“O sujeito de desempenho está livre da instância extrema de domínio que o obriga a trabalhar ou que poderia explorá-lo. É senhor e soberano de si mesmo. Assim, não está submisso a ninguém ou está submisso apenas a si mesmo. É nisso que ele se distingue do sujeito de obediência. A queda da instância dominadora não leva à Liberdade. Ao contrário, faz com que liberdade e coação coincidam. assim, o sujeito de desempenho se entrega à liberdade coercitiva ou à livre coerção do maximizar o desempenho” (HAN, 2017, p. 29-30).
Byung-Chul Han nos oferece uma análise profunda da ansiedade por resultados na sociedade do cansaço. Em um mundo onde o indivíduo se autoexplora e se torna prisioneiro de sua própria busca por produtividade, a ansiedade se torna uma constante.
“O excesso de trabalho e desempenho agudiza-se numa auto exploração. Essa é mais eficiente que uma exploração do outro, pois caminha de mãos dadas com o sentimento de liberdade. O explorador é ao mesmo tempo explorado. Agressor e vítima não podem mais ser distinguidos. Essa autorreferencialidade gera uma liberdade paradoxal que, em virtude das estruturas coercitivas que lhe são inerentes, se transforma em violência. Os adoecimentos psíquicos da sociedade de desempenho são precisamente as manifestações patológicas desta liberdade paradoxal” (HAN, 2017, p. 29-30).
Vivemos em um tempo de excessos: excesso de informações, de tarefas, de estímulos, e isso nos conduz a uma exaustão generalizada. O sujeito da sociedade do cansaço é aquele que, buscando sempre mais, acaba perdendo o essencial: o tempo de descanso, de contemplação e de liberdade. A obra de Han, ao problematizar essas questões, nos convida a refletir sobre o modelo de vida que adotamos e sobre as consequências psíquicas e sociais da pressão por resultados.
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A ansiedade por resultados em 'A sociedade do cansaço', de Byung-Chul Han. Artigo de Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU