19 Setembro 2024
Os autores do ataque mortal com a explosão de pagers de membros do movimento pró-iraniano Hezbollah, no Líbano “devem ser responsabilizados”, exigiu nesta quarta-feira (18) o Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk. Para Joseph Bahout, diretor do Instituto Issam Farès de Políticas Públicas ouvido pela RFI, o Hezbollah foi atingido politicamente em sua imagem, mas deve continuar a apoiar o Hamas em Gaza.
A reportagem é de Maria Paula Carvalho, publicada por Rfi, 18-09-2024.
"Essa operação causou um choque no país, pelo caráter audacioso e sofisticado", explica Joseph Bahout, professor da universidade Americana de Beirute, explicando que provavelmente os pagers foram modificados em sua fabricação, via Taiwan, Bulgária ou Hungria. "O Hezbollah continuará a sua guerra em apoio ao Hamas", acredita Bahout. "O grupo ainda está avaliando as consequências desse ataque e há uma paranoia e uma preocupação dentro do grupo para não ultrapassar determinados limites no conflito contra Israel a fim de não empurrar o país para uma guerra global", observa.
As explosões simultâneas de centenas de pagers usados pelo grupo Hezbollah em todo o Líbano são um grande golpe para o sistema de comunicações da poderosa organização pró-iraniana, podendo enfraquecer as suas capacidades de continuar a guerra contra Israel.
O especialista chama a atenção para a vulnerabilidade do grupo islâmico depois do ataque, que aponta para Israel como principal suspeito. "Os quase três mil feridos gravitam no entorno do Hezbollah, mas é muito difícil conhecer o papel de cada um na hierarquia do partido", diz Bahout. "O que é certo é que o partido foi sacudido por este ataque: moralmente, em sua imagem e em sua logística, já que todos se sentem vulneráveis depois do que houve, mas também por causa de muitas baixas de combatentes que perderam a visão ou ficaram gravemente feridos", completa.
Nesta quarta-feira, o Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, falou sobre as características da ação. “O ataque simultâneo a milhares de pessoas, sejam civis ou membros de grupos armados, sem saber quem estava na posse dos dispositivos visados e onde se encontravam no momento do ataque, constitui uma violação dos direitos humanos internacionais e, na medida do aplicável, ao direito humanitário internacional”, sublinhou o representante da ONU em uma declaração.
Este ataque sem precedentes junta-se a outros que visaram o Hezbollah, nos últimos meses, incluindo operações direcionadas contra comandantes ou responsáveis do grupo, como Fouad Chokr, um líder militar morto no ataque israelense de 30 de julho perto de Beirute.
Os pagers são um sistema utilizado por membros do movimento islâmico, combatentes, pessoal de saúde ou executivos administrativos, para evitar o uso de telefones celulares. O ataque sugere que a rede de comunicação libanesa foi infiltrada por Israel, segundo uma fonte de segurança.
Pelo menos 12 pessoas morreram e cerca de 2.800 ficaram feridas nas explosões simultâneas destes dispositivos, na terça-feira (17) nos redutos do poderoso grupo político e militar.
As explosões ocorreram nos subúrbios ao sul de Beirute, que abriga a liderança do partido e as suas principais instituições, no sul do país, onde combatentes enfrentam Israel há quase um ano, e no leste do país, onde as armas mais poderosas do grupo seriam armazenadas.
Uma fonte próxima do Hezbollah sublinha que este é “o maior golpe já desferido na formação” por Israel. Os pagers, alguns dos quais vieram de uma remessa de um novo modelo importado, são usados “para chamar combatentes para a linha de frente, pedir aos executivos administrativos ou ao pessoal de saúde que retornem aos seus postos, mas também alertar sobre um possível sobrevoo de um drone israelense”, disse a fonte de segurança, que pediu para não ser identificada.
Hicham Jaber, um general libanês reformado, contudo, pondera a importância do ataque de terça-feira e assegura que o Hezbollah "tem outros meios secretos de comunicação". Ele explica que o partido construiu, durante muitos anos, “uma rede interna de telecomunicações” paralela à rede telefônica fixa oficial libanesa, “que utiliza para as suas comunicações entre as regiões e com os seus líderes”.
“Esta é claramente uma falha tecnológica e de segurança” para o Hezbollah, acredita o analista Amal Saad, especialista em comunicação. “Seu comando e controle serão afetados e ele certamente terá que encontrar novas maneiras de evitar tais lapsos.”
Heiko Wimmen, responsável pelo Líbano, Síria e Iraque no International Crisis Group, também acredita que o movimento “terá agora de avaliar o seu sistema de comunicação e encontrar soluções de substituição”. Além do impacto no seu sistema de telecomunicações, o custo humano é muito elevado para o Hezbollah, que perdeu mais de 400 combatentes desde o início da guerra contra Israel, em outubro passado. “Estamos falando provavelmente de centenas de pessoas que não serão capazes de cumprir os papéis que ocupam dentro do partido. É claro que isto é muito perturbador”, diz Wimmen.
Para os analistas, estas perdas deverão repercutir no rumo das operações contra Israel. “Em qualquer guerra, a comunicação segura é vital. Se o inimigo conseguir penetrar nas suas comunicações, você estará em apuros”, explica Heiko Wimmen.
Desde o início da guerra na Faixa de Gaza entre o exército israelense e o Hamas, em 7 de outubro de 2023, o Hezbollah lançou ataques contra Israel a partir do sul do Líbano para apoiar o seu aliado palestino.
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Com ataque no Líbano, Hezbollah foi "sacudido moralmente e em sua logística", diz especialista - Instituto Humanitas Unisinos - IHU