19 Julho 2024
A festa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro foi promovida em Cali em junho de 2023, com membros da Pastoral Afro da Arquidiocese de Cali, Colômbia.
A reportagem é de Eduardo Campos Lima, publicada por Crux, 17-07-2024.
Crédito: Pastoral Afro de Cali.
Um grupo de 170 mulheres negras católicas de diferentes países da América Latina e do Caribe está se reunindo virtualmente esta semana com o objetivo de lançar uma rede inédita na região. O movimento, já chamado de Líderes Afrodescendentes Católicas da América Latina (também conhecido pela sigla em espanhol LACAM), reunirá mulheres negras que já têm uma posição de liderança em suas comunidades eclesiais ou movimentos sociais. A rede será formada por religiosas, ministras leigas e ativistas de base.
O LACAM foi concebido para trabalhar em estreita relação com a Pastoral Afro da América Latina e Caribe. Mas a ideia é dar um lugar especial na Igreja a um dos segmentos sociais mais marginalizados da região.
De acordo com uma estimativa das Nações Unidas, 134 milhões de pessoas se identificam como negras na América Latina e no Caribe. A maior comunidade está no Brasil, com mais de 100 milhões de pessoas de ascendência africana. No Haiti, mais de 95% das pessoas são negras. Comunidades consideráveis também são encontradas na Colômbia, Equador, República Dominicana, Costa Rica e Panamá.
As mulheres negras da região estão entre os grupos sociais com menor escolaridade e menor renda. Tal marginalização, segundo a Irmã Ruperta Palacios, de origem mexicana, que lidera o Ministério Pastoral Afro da América Latina e Caribe, também é sentida na Igreja.
“Mulheres negras são geralmente vistas como aquelas que devem trabalhar na cozinha. Infelizmente, isso também acontece na Igreja”, Palacios disse ao Crux. Talvez seja por isso que muitas delas estão deixando a Igreja Católica. Em países como o Brasil, onde 31% da população é evangélica, as mulheres negras formam o maior grupo entre os cristãos não católicos.
Ao mesmo tempo, inúmeras mulheres negras têm desempenhado papéis centrais em suas comunidades e movimentos eclesiais nas últimas décadas, informou Palacios. “Já é hora de reconhecer o trabalho que essas mulheres vêm fazendo”, completou.
Os organizadores do encontro, que começou em 16 de julho, exigiram que apenas lideranças comparecessem. Devido à desproporção no tamanho das distintas comunidades latino-americanas, houve uma maioria de participantes vindas do Brasil. Mas mulheres de outros 10 países também têm participado do encontro.
“A rede será organizada de acordo com a estrutura da Pastoral Afro, considerando não apenas o número de pessoas, mas também seus territórios”, disse ao Crux a leiga católica panamenha Eunice Meneses, uma das promotoras do encontro.
Palacios visitou o Vaticano em março e disse que o Papa reafirmou a ideia de que as mulheres devem ser protagonistas na Igreja, incluindo as mulheres negras. “Ele tem trabalhado para nós. Mas para nossas igrejas particulares, parece ser muito difícil colocar mulheres em posições de liderança em um ministério pastoral ou qualquer outra instância. Especialmente mulheres negras”, ela disse.
Em sua opinião, a “Igreja latino-americana ainda não assumiu com a profundidade necessária o compromisso com as mulheres negras e outros segmentos sociais marginalizados no que se refere à participação. Uma coisa é o que dizemos, outra coisa é o que fazemos. Levará anos e anos até que as mulheres realmente ocupem posições de tomada de decisão”, acrescentou Palacios.
Meneses disse que a primeira vez que um grupo de mulheres negras católicas discutiu a necessidade de ter um espaço específico para elas na Igreja foi em 2003, durante o 9º encontro da Pastoral Afro. “Desde então, falamos sobre isso em diferentes reuniões, como a que tivemos no México [em 2020]”, disse ela.
Para criar oficialmente a rede, o grupo decidiu convidar a Conferência Latino-Americana e do Caribe de Religiosos (conhecida como CLAR), onde também havia um grupo negro.
“Inicialmente, focaremos no treinamento das lideranças, algo que percebemos que será necessário em nossas pesquisas. Temos que aumentar o potencial do nosso conhecimento ancestral para fortalecer nossas capacidades”, explicou Meneses. Ela disse que a maioria dessas mulheres é “resiliente e ama outras pessoas, mesmo que elas não façam parte de sua família, o que são duas características que a Igreja precisa”. E complementou: “Queremos falar de um feminismo católico influenciado pela nossa cosmovisão africana”.
O LACAM será lançado no fim do encontro, em 18 de julho, no último ano da Década Internacional dos Afrodescendentes, declarada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2014 e “amplamente ignorada pela Igreja”, segundo Palacios.
“Você consegue imaginar se uma mulher negra fosse escolhida para chefiar um dicastério em Roma? Parece distante. Ainda há muito preconceito”, disse Palacios.
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Mulheres negras católicas lançarão rede na América Latina - Instituto Humanitas Unisinos - IHU