02 Julho 2024
O artigo é de Consuelo Vélez, teóloga colombiana, publicado por Religión Digital, 01-07-2024.
O processo sinodal continua o seu caminho, embora a maioria do povo de Deus não se sinta envolvida. Uma comissão de teólogos (sempre menos mulheres, como é o caso em todas as áreas de tomada de decisão na Igreja) já se reuniu para preparar um primeiro esboço do Instrumentum Laboris para a próxima assembleia sinodal.
Conforme anunciado pela secretaria do Sínodo, este documento foi enviado a setenta pessoas (que não participam do Sínodo) para contribuírem. Em todo caso, este processo, pela magnitude que envolve – toda a Igreja universal –, é muito difícil de difundir como seria necessário e, muito mais, de envolver o "povo de Deus", aquele povo "comum", que só vai à celebração eucarística ou que mantém apenas algumas devoções mas está imerso na vida cotidiana com todas as suas dificuldades, avanços e retrocessos, muito distante daquilo que vive a igreja institucional e das estruturas organizacionais em que se move.
Fora dos órgãos próximos do Sínodo, existem outras estruturas eclesiais de diferentes continentes que organizam encontros de especialistas para refletir sobre o Sínodo e, na medida do possível, enviar alguma contribuição à secretaria sinodal. Recentemente participei de um, mas a maioria das propostas que foram feitas me pareceram ser do tipo “despejar vinho novo em odres velhos”. Daí esta reflexão.
Por um lado, houve uma grande ênfase na promoção dos conselhos pastorais que deveriam existir em todas as dioceses. Segundo algumas investigações realizadas, estes conselhos funcionam pouco ou, embora tenham esse nome, mantêm a preeminência do clero e pouca participação leiga. É claro que em alguns lugares funcionam melhor e, então, afirma-se que ali existem experiências sinodais. No entanto, pessoalmente acredito que insistir no que já existe (ou existe fracamente) para promover a mudança sinodal a partir daí é como deitar vinho novo em odres velhos e o evangelho já nos alerta para o que acontece: os odres velhos rebentam, o vinho derrama-se e os odres estragam; o vinho novo deve ser colocado em odres novos e assim ambos serão conservados (Mt 9, 17).
Na realidade, tentar viver a sinodalidade é aventurar-se numa experiência muito diferente da forma como a Igreja foi estabelecida até agora. É viver literalmente a “pirâmide invertida”, como disse o Papa Francisco, desde o início do seu pontificado, porque envolve a conversão do clero a um ministério que não é de poder mas de serviço – e por isso não tem medo à escuta da comunidade que serve – e de um leigo que assume a sua dignidade batismal e a vive com plena responsabilidade, sem pedir permissão ao clero para fazer ou dizer qualquer ação eclesial. A sinodalidade exige uma “conversão” e isso é muito mais do que “um verniz superficial” (como disse Evangelli Nuntiandi, de Paulo VI), em que, por exemplo, um conselho pastoral se abre para incorporar mais leigos, reúne mais ou suscita mais coisas. A conversão envolve a busca de novas estruturas, novos processos, novos acontecimentos. Mas, definitivamente, a igreja institucional não está disposta a fazer isso e está tentando disfarçar o que já existe para afirmar que isto é sinodalidade.
Outro dos temas abordados no encontro teológico em que participei foi o dos ministérios ordenados e, claro, o ministério ordenado para mulheres. Os fundamentos bíblicos, patrísticos, teológicos, pastorais, etc., são evidentes para os exigir e tornar realidade. Mas não falta “prudência” teológica para fazer apelos à moderação, para trabalhar com “mais cuidado” com as fontes porque talvez “elas não sejam históricas” – como se para outros temas não houvesse o mesmo provisório em tudo o que se refere às origens cristãs.
Sobre esta questão, a instituição eclesial também está decidida a silenciá-la, a “domesticá-la” com a típica frase de que as mulheres desempenham muitas tarefas na Igreja e sem elas a igreja quase não existiria, portanto, não é necessário pedir muito mais (vale dizer que para muitas mulheres isso é suficiente). É difícil assumir um verdadeiro compromisso com uma experiência ministerial que reconheça a participação dos leigos e, claro, das mulheres, e que se configurem comunidades eclesiais sinodais onde todos os ministérios estejam ao serviço, mas sem o detrimento de alguns devido à preeminência de outros.
Outro aspecto a comentar, a respeito do Sínodo, são as dez comissões de estudo, convocadas por Francisco para estudar algumas das questões que surgiram nas consultas destes dois anos, cujos resultados serão entregues no próximo ano. Alguém se lembrará daqui a um ano o que estava sendo estudado e a que conclusões se chegou? Para dar um exemplo, Francisco convocou uma “segunda” comissão para estudar o diaconato feminino e não se sabe o que aconteceu com ela. Agora haverá um “terceiro” – dentro dessas dez comissões –, com a agravante de que Francisco já disse que com ele não podemos esperar que exista um diaconato feminino como um ministério “ordenado”. Essas comissões fazem sentido? Podemos esperar algo deles? Não parece haver muita esperança nesse sentido.
Definitivamente, a sinodalidade é algo diferente da “maquiagem” do que existe. Envolve conversão eclesial, ministerial, sacramental, litúrgica, processual, social, etc. E isto é mais do que as “mesas redondas” que vimos na primeira assembleia sinodal de 2023 – embora já seja um símbolo poderoso, mas não suficiente – ou o “diálogo no espírito”, como método, que alguns tanto elogiam muito, mas que outros também demonstraram a sua insuficiência para produzir uma reforma eclesial. Sinodalidade significa que estamos dispostos a sair dos nossos próprios lugares. Reconhecer que, até agora, a Igreja viveu muito pouco da experiência sinodal e que precisamos lançá-la, promovê-la, procurar caminhos, métodos e meios para torná-la realidade. Enquanto continuarmos a falar tanto de sinodalidade sem insistir em fornecer “odres novos” para o “vinho novo” do Espírito, haverá muitos encontros, muitas reflexões, muitos encontros, mas nada terá mudado, tanto é verdade que precisa mudar urgentemente.
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Para tornar possível a sinodalidade, o vinho novo está em odres velhos? Artigo de Consuelo Vélez - Instituto Humanitas Unisinos - IHU