06 Mai 2024
"Juntamente com vários colegas, tenho trabalhado no tema da dependência da internet há quase duas décadas. Não é possível elencar a infinidade de propostas e iniciativas nesse sentido de que ouvi falar e em que estive envolvido. Gostaria de declarar que foram inúteis, mas em vez disso revelaram-se deletérias, contraproducentes. A dissociação de uma sociedade que continua a testemunhar às crianças que o sucesso pessoal, social, profissional e econômico em todos os setores, assim como a explicitação do próprio papel parental, passa pela utilização cotidiana das redes sociais, nada mais fez do que confirmar quão frágeis são os adultos de hoje, levando os adolescentes a recorrer à internet, vista como interlocutor mais confiável do que os adultos, constantemente conectados", escreve Matteo Lancini.
Matteo Lancini é psicólogo e psicoterapeuta com formação psicanalítica. Presidente da Fundação “Minotauro” de Milão e professor do Departamento de Psicologia da Universidade Milão-Bicocca e da Faculdade de Ciências da Educação da Universidade Católica de Milão. É diretor do Mestrado “Prevenção e tratamento do vício em internet na adolescência” e leciona na Escola de Formação Minotauro em Psicoterapia para adolescentes e jovens.
O artigo foi publicado por La Stampa, 03-05-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Num relatório elaborado por especialistas franceses, sugere-se a introdução de normas que limitem o uso de dispositivos e internet para os menores. Entre outras: nada de internet no smartphone até aos 13 anos, nada de redes sociais antes dos 15 anos, depois a possibilidade de utilizar apenas aquelas "éticas" e, portanto, proibição de utilizar Instagram e Tik Tok antes dos 18 anos. Aqui estamos com mais uma proposta que pretenderia regulamentar o uso excessivo da Internet pelos jovens e que suscitará desmotivado entusiasmo em muitos adultos.
Juntamente com vários colegas, tenho trabalhado no tema da dependência da internet há quase duas décadas. Não é possível elencar a infinidade de propostas e iniciativas nesse sentido de que ouvi falar e em que estive envolvido. Gostaria de declarar que foram inúteis, mas em vez disso revelaram-se deletérias, contraproducentes. A dissociação de uma sociedade que continua a testemunhar às crianças que o sucesso pessoal, social, profissional e econômico em todos os setores, assim como a explicitação do próprio papel parental, passa pela utilização cotidiana das redes sociais, nada mais fez do que confirmar quão frágeis são os adultos de hoje, levando os adolescentes a recorrer à internet, vista como interlocutor mais confiável do que os adultos, constantemente conectados. As iniciativas que focam na proibição do consumo na adolescência sempre foram destinadas ao fracasso, imaginem aquelas não realmente implementáveis e relativas à utilização da internet, sem a qual você está impossibilitado de se realizar, pessoal e profissionalmente, hoje e no futuro.
No que me diz respeito, concordo plenamente com a proibição da utilização do Instagram e do Tik Tok, desde que o Facebook também seja proibido e que a proibição não se limite aos 18 anos de idade, mas se estenda até aos 80 anos, completos. Também concordo com a proibição da utilização de um smartphone conectado à internet até os 13 anos de idade, mas desde que, paralelamente, mamãe e papai estejam proibidos de entregar para os filhos qualquer celular da velha geração; filhos desconectados, mas sempre rastreáveis, obrigados a atender os telefonemas de mamãe e papai que ligam do local de trabalho preocupados pelo atraso do filho no trajeto da escola até casa: “onde você está?”.
Continuar a defender que o mal-estar juvenil depende da chegada ao mundo do smartphone é uma operação de limpeza de consciência por parte de adultos que não consideram as controvérsias científicas sobre o assunto e que não aceitam que, mesmo que assim fosse, isso provavelmente seria que ser atribuído, em primeiro lugar, a uma utilização excessiva feita por todos os adultos.
O desconforto das novas gerações depende do fato de as controlarmos demais, que colocamos seu corpo sob controle, que passamos a vida na frente de um smartphone e trabalhando.
Estamos dispostos a renunciar a alguma coisa, a deixar de gerir a vida escolar e humana cotidiana dos filhos através do WhatsApp e promover a nossa existência e atividade profissional através das redes sociais?
Proibir às novas gerações comportamentos que governam as nossas vidas todos os dias irá empurrar os meninos e as meninas a pensar que a internet tem realmente mais autoridade do que nós, adultos: pais, professores, educadores e psicólogos.
Não seria melhor dedicarmos o nosso tempo à organização de alguma iniciativa educativa adicional, em vez de privada, para finalmente fazer com que os nossos filhos e estudantes percebam que estamos pensando neles e não em nós próprios?
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Inútil proibir as redes sociais a crianças frágeis. Artigo de Matteo Lancini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU