29 Novembro 2023
Não festejar o Natal precisamente na cidade onde, segundo a tradição cristã, nasceu Jesus? O paradoxo é enorme, mas não tão grande como a tristeza e a dor que pairam nas ruas de Belém, na Cisjordânia, e que se revelam nos semblantes dos poucos que as percorrem. “Belém, como qualquer outra cidade palestina, está de luto e triste… Não podemos comemorar enquanto estivermos nesta situação”, afirma Hanna Hanania, presidente da câmara cessante. O município decidiu, assim, cancelar os eventos de Natal e retirar todas as decorações da cidade. Unindo-se ao apelo dos Patriarcas e Líderes das Igrejas em Jerusalém, Hanania pede a todos que se concentrem na oração: “Rezaremos a Deus para que haja paz na terra da paz”.
A reportagem é de Clara Raimundo, publicada por 7Margens, 27-11-2023.
Assim, a Praça da Manjedoura não terá a habitual árvore de Natal gigante, que no início do Advento atraía milhares de pessoas para assistir à sua iluminação, e as decorações que já se encontravam montadas no centro da cidade estão agora a ser retiradas, como dá conta a jornalista Marinella Bandini, numa reportagem publicada este domingo, 26, pela Catholic News Agency (CNA).
A poucos passos da Basílica da Natividade, as persianas de quase todo o comércio local estão corridas. São, na sua maioria, lojas de souvenirs e artesanato local, que sem peregrinos não têm clientes. Desde o início da guerra, os principais pontos de entrada na cidade foram fechados e a deslocação entre diferentes cidades palestinas é muito difícil devido aos postos de controlo e às estradas bloqueadas. A produção também parou: não é prudente assumir custos sabendo que a época do Natal – normalmente a mais movimentada na cidade – está perdida.
Num ano em que se esperava “um pico” de visitantes, particularmente vindos dos Estados Unidos, a guerra mudou tudo. Das 15 mil pessoas que trabalhavam no setor do turismo, 12 mil estarão agora desempregadas. “Posso estimar que 90% delas são cristãs”, adianta Majed Ishaq, diretor-geral do departamento de marketing do Ministério do Turismo e Antiguidades da Palestina, à CNA.
Lina Canavati é cristã, mas não trabalha na área do turismo: é assistente social num hospital pediátrico da cidade e explica que os poucos que chegam ao hospital “não têm dinheiro para pagar”, embora se trate de uma instituição de caridade e as taxas sejam simbólicas. Além disso, acrescenta, “há famílias que vêm pedir apoio financeiro”.
O Natal aproxima-se, assim, “com tristeza, dor e sofrimento”, lamenta Lina. E até mesmo nas famílias que não estão a atravessar dificuldades financeiras, “os pais têm vergonha de comprar presentes para os filhos, quando muitas famílias não conseguem suprir as necessidades básicas deles”.
Contrastando com as ruas quase desertas, a igreja latina de Santa Catarina, ao lado da Basílica da Natividade, tem estado cheia, em sinal de que os apelos dos Patriarcas e Líderes das igrejas em Jerusalém e da presidente da câmara foram ouvidos.
“Estamos a aproximar-nos do tempo do Advento”, disse à CNA o pároco de Belém, padre Rami Asakrieh. “Decidimos concentrar-nos mais no significado do Natal do que em mostrá-lo, pelas roupas ou pelas festas e mercados. Todas essas coisas são lindas, mas não são o verdadeiro significado do Natal”.
Lina acrescenta que, aconteça o que acontecer, os cristãos que vivem na Terra Santa não desistirão de celebrar o nascimento de Jesus Cristo “porque é isso que traz esperança” às suas vidas. “Acredito que o maior presente que Deus nos deu é o dom da esperança e com o Natal alimentamos esta esperança nos nossos corações”. Mesmo no meio de uma guerra que, apesar do cessar fogo vivido por estes dias, não tem fim à vista.
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Na cidade onde Jesus nasceu o Natal foi cancelado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU