11 Novembro 2023
"Mesmo que seja louvável a intenção de Spong de revisitar criticamente muitos aspectos da fé católica – do pecado das origens à virgindade perpétua de Maria, da eternidade do inferno ao ministério ordenado, até a estrutura hierárquica e androcêntrica da Igreja – ainda assim os argumentos não convencem. Sandri não nega que existe, na Igreja de hoje, a necessidade de reformas profundas e o processo sinodal, bem como a celebração da primeira parte da assembleia do Sínodo dos Bispos, alargado a muitos não galardoados com o carácter episcopal, diz muito sobre isso", escreve Simone Caleffi, sacerdote e e doutor em Teologia Moral, em artigo publicado por L'Osservatore Romano, 08-11-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Acreditar no Deus errado é o maior desastre que possa acontecer: ainda mais se acontecer com toda uma religião e uma inteira civilização". Vão direto ao coração as palavras do Padre David Maria Turoldo que Luigi Sandri cita na introdução do seu Dire oggi il Dio di Gesù. A 1700 anni dal concilio di Nicea (Falar hoje do Deus de Jesus. 1700 anos depois do Concílio de Nicea, em tradução livre, Paoline, Milão, 2023, 360 pág., 26 euros), que recebe o número 97 da série de ensaística dessas edições. De fato, depois do prefácio de Cristina Simonelli, o autor, no que poderia ser definido o capítulo zero, se pergunta se tem fundamento a visão de John Shelby Spong, um Bispo episcopaliano, que, com suas doze teses pós-teístas, investiga se estão certos ou não aqueles que acreditam que, face às consciências e aos conhecimentos de hoje, está irremediavelmente ultrapassada a perspectiva teísta com a qual se fala de Deus desde o Concílio de Niceia.
Dire oggi il Dio di Gesù. A 1700 anni dal concilio di Nicea, de Luigi Sandri (Foto: Divulgação)
Assim como definido no capítulo XIII, o caminho que conduziu a um “além” o teólogo estadunidense foi um verdadeiro toque de trombeta. Comecemos, por exemplo, pela tese 11: “A esperança da vida após a morte deve ser para sempre separada da moralidade do prêmio e do castigo, que nada mais é do que um sistema de controle da conduta humana”. É exatamente isso? (nos perguntamos). Mesmo que seja louvável a intenção de Spong de revisitar criticamente muitos aspectos da fé católica – do pecado das origens à virgindade perpétua de Maria, da eternidade do inferno ao ministério ordenado, até a estrutura hierárquica e androcêntrica da Igreja – ainda assim os argumentos não convencem. Sandri não nega que existe, na Igreja de hoje, a necessidade de reformas profundas e o processo sinodal, bem como a celebração da primeira parte da assembleia do Sínodo dos Bispos, alargado a muitos não galardoados com o carácter episcopal, diz muito sobre isso.
Porém, tentar falar de Deus com palavras humanas continua sendo o único caminho possível se não se quiser renunciar à fé na Palavra de Deus feito homem.
Como é importante expressar com gestos e palavras a mesma fé? Certamente, muito. Mas “não basta ter a mesma fé para estar em comunhão, se a divergência for sobre como deveria ser a autoridade na Igreja", que hoje é muitas vezes invocada, atribuindo-a a um Papa que agrada, por exemplo, em detrimento de outro. Como pode ser resolvido o dissidio? Além disso, o exemplo dado insere-se no âmbito da mesma confissão.
E quando devemos nos confrontar entre duas confissões diferentes? O autor, após um interlúdio, no capítulo XV “Primeira, segunda, terceira Roma: mesma fé, mas...”, não pode deixar de dar importância ao diálogo.
Falando do encontro entre Paulo VI e Atenágoras, “o primeiro, desde 1439, entre um bispo da primeira Roma e um bispo da segunda Roma", observa que "os dois protagonistas, depois de se terem abraçado com grande afeto, manifestaram pesar pelos conflitos do passado em matéria de doutrina, liturgia e disciplina, e a esperança de que, com o diálogo, eles poderiam ser resolvidos."
Regozijamo-nos com os consensos, prenúncio de esperanças. Diante dos dissensos, a coisa mais sensata a fazer é invocar o Senhor, que como último desejo, antes da execução da sentença, pede ao Pai a unidade dos seus discípulos. “E nós, homens e mulheres do século XXI, que recitamos a oração ensinada por Jesus com alegria e esperança, não somos crédulos”. Rezando, como recordado o capítulo XXII, Marana Tha, os cristãos de hoje pretendem continuar aquela missão impossível de tornar conhecido o Deus de Cristo, não tanto mistério nebuloso e energia, mas inefável e amoroso “Tu”.
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Invocar hoje o Deus de Jesus. Artigo de Simone Caleffi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU