18 Março 2023
A discussão sobre o socialismo ficou quase interditada desde o fracasso, não só econômico, do bloco liderado pela União Soviética e devido às contradições que prosseguem em países como China, Cuba e Venezuela. A social-democracia europeia, por sua vez, se descaracterizou bastante por ter aderido, em grande medida, aos ditames neoliberais. Partidos daquele continente mantêm o termo socialista em seus nomes, mas quando alcançam eleitoralmente os governos de seus países deixam de lado tal perspectiva ou não conseguem implementar grandes políticas condizentes com sua nominação. No Brasil há duas legendas contendo esse termo: PSB e PSOL, mas foi o PT, formado também com tal ideal, que chegou à Presidência da República e repetiu parcialmente a experiência europeia.
O artigo é de André Ricardo de Souza, doutor em sociologia pela USP, professor associado do Departamento de Sociologia da UFSCar, pesquisador do CNPq e organizador com Paul Singer do livro A economia solidária no Brasil (Editora Contexto, 2000).
Entretanto o ideal do socialismo democrático não desapareceu no país, estando presente, com destaque, nos escritos do saudoso docente de economia da USP Paul Singer, algo que foi ressaltado em relevantes publicações recentes do cientista político, também uspiano e seu filho, André Singer. Faz-se presente ainda através de dois “implantes socialistas” inseridos na sociedade capitalista, nos termos daquele professor. Trata-se de dois tipos de experiências que eram bastante valorizadas por ele. O primeiro deles, originariamente brasileiro, é o orçamento participativo, que foi adotado por algumas cidades grandes com prefeituras de esquerda, destacadamente Porto Alegre, mas se desvaneceu na maioria delas por falta de vontade política. Já o segundo é a economia solidária, composta por autogestionárias cooperativas e associações de trabalhadores, que se espalharam nacionalmente e se tornaram objeto de política pública federal conduzida por uma secretaria própria no Ministério do Trabalho, antes chefiada por Singer e, agora, pelo ex-ministro Gilberto Carvalho.
Entre 21 e 24 de março, data esta em que Paul Singer faria 91 anos e será homenageado, acontecerá o seminário “O Governo Lula e o potencial da Economia Solidária”, organizado por um núcleo de apoio a políticas públicas ligado à Fundação Perseu Abramo, em parceria com 16 entidades nacionais de trabalhadores. Participarão do evento a ex-ministra e diretora social do BNDES Tereza Campello, Carvalho e demais secretários de outros ministérios, além de pesquisadores e ativistas dedicados à economia solidária. Cada sessão do seminário ocorrerá às 18h e será transmitida pelo Canal de YouTube da Fundação Perseu Abramo. Também com transmissão pela internet (Canal Resistentes) e enfoque especificamente no socialismo democrático, ocorrerá em 13 de abril outra atividade contando com a participação, igualmente, de Gilberto Carvalho e de pesquisadores do tema.
A busca da edificação do socialismo democrático passa, evidentemente, pela organizada ampliação do acesso populacional à tomada de decisões relevantes, algo que vai além das eleições a cada dois anos, e mediante o fortalecimento dos conselhos de representação da sociedade civil junto a diversos órgãos públicos. Segundo o falecido literato Antonio Candido, grande amigo de Singer, tal modelo deve ser uma espécie de “bússola ideológica” para partidos e governos de esquerda. Considerando-se a economia solidária como uma parte relevante dessa busca, o referido seminário enseja nos perguntarmos se não é chegada a hora do diálogo efetivo sobre caminhos para o socialismo democrático.
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Podemos falar de socialismo democrático? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU