"Com São Judas Tadeu e São Paulo, é impossível não ficar calado diante da pobreza que assola, da falta de profetismo das igrejas que se aliam aos poderosos para tirar benefícios financeiros e políticos. Impossível é não perceber que a Igreja está longe de sua origem profética", lamenta Jacir de Freitas Faria, OFM.
Frei Jacir é doutor em Teologia Bíblica pela FAJE (BH), mestre em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma e professor de Exegese Bíblica. É membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB), padre Franciscano e autor de dez livros e coautor de quinze. Youtube: Frei Jacir Bíblia e Apocrifos.
O texto sobre o qual vamos refletir hoje é Fl 1,1-11. Trata-se da saudação de Paulo aos cristãos de Filipos, cidade localizada na Macedônia, atual Grécia. Fundada por Alexandre, o Grande, em homenagem a seu pai, Filipo II, Filipos, na época de Paulo, era uma colônia romana de soldados romanos aposentados, um centro militar e econômico. Paulo esteve em Filipos entre os anos de 49 e 52, quando ele começou a evangelização da Europa (At 16,11-14). Amigo de uma comerciante de púrpura, Lídia, Paulo tinha muito apreço por Filipos.
A evangelização de Paulo em Filipos tem relação com outros apóstolos evangelizadores, dentre os quais celebramos, em 28 de outubro, Judas Tadeu e Simão. Muito popular no Brasil, São Judas é considerado o santo das causas perdidas e impossíveis de serem realizadas. Você conhece a história de São Judas e São Simão? Quais são essas causas impossíveis, em nossos dias? Por que Paulo escreveu uma carta aos Filipenses, entre os anos 55 e 60?
São Judas Tadeu foi o penúltimo apóstolo escolhido por Jesus. Ele era irmão de Tiago Menor (Lc 6,16; Mt 10,3; Mc 3,18). Seu pai era Alfeu ou Cleofas, irmão de José, o esposo de Maria e o discípulo, ao qual Jesus ressuscitado apareceu a caminho de Emaús. A mãe de Judas Tadeu era Maria de Cleofas, prima de Maria, a mãe de Jesus. Trata-se, portanto, de uma família extensiva, na qual o primo também poderia ser chamado de irmão. Daí que Judas Tadeu foi também considerado pela tradição como irmão de Jesus ou do Senhor (Mc 6,3), o que justifica a sua popularidade.
Após a morte de Jesus, São Judas Tadeu pregou o evangelho na Mesopotâmia, na Síria, na Arménia e na Pérsia, atual Irã, onde teria se encontrado com Simão, que, antes, estava pregando no Egito. A partir daí, eles evangelizaram juntos, expulsaram demônios, curaram doentes, fundaram comunidades, consagraram Abdias como bispo etc. Os seus atos apostólicos se encontram registrados no apócrifo Memórias apostólicas de Abdias ou Atos apócrifos dos Apóstolos.[1]
Judas Tadeu e Simão morrem martirizados a golpes de bastões, machados e lanças a mando de sacerdotes da religião persa, no dia 28 de outubro do ano 70, por isso, na sua imagem tem um machado nas mãos.
Entre os anos de 1303 e 1373, Jesus teria aparecido a Santa Brígida da Suécia, e a aconselhado a invocar São Judas Tadeu para resolver os seus problemas. Ela foi atendida e, desde então, nasceu a devoção a São Judas Tadeu como santo das causas perdidas, desesperadas e difíceis de serem resolvidas, assim como doenças incuráveis, o que fez, também, de São Judas Tadeu o padroeiro dos hospitais.
São Paulo, após ser perseguido, insultado e preso em Filipos, fugiu para Tessalônica. Mais tarde, ele escreveu cartas aos filipenses por causa dos conflitos entre os apóstolos sobre os vários modos de compreender a missão e a mensagem do evangelho que eles deviam transmitir ao povo. Rivalidades e autoridade apostólica estavam em jogo. Eles se perguntavam sobre quem teria autoridade para pregar e o que deveriam dizer. Paulo se dirige aos bispos e diáconos da comunidade de Filipos. Ele tinha medo de outros pregadores que se diziam cristãos, mas não pregavam o verdadeiro evangelho. Esse é o tema central da epístola, o verdadeiro evangelho, aquele que tem a cruz como caminho de salvação, de libertação de todas as injustiças, sem o desejo de poder pelo poder.
Olhando para as igrejas no Brasil, nesse tempo de eleições, a partir da Carta aos Filipenses, contatamos, com tristeza, que estamos também divididos e imersos numa ‘guerra santa’ nas redes sociais, nas comunidades e famílias. Há muitas lideranças falsas nas igrejas, há muitos políticos, lideranças de comunidades, padres, pastores e até bispos ensinando inverdades, propagando Fake News, manipulando as verdades evangélicas. Percebe-se uma volta ao tradicionalismo religioso até mesmo entre a juventude. Aliás, a religião nunca teve tanta predominância nas discussões políticas.
Muitos estão preocupados em defender a sua Igreja e se esquecem dos empobrecidos. E nesse quesito sobram as inverdades. Fulano é abortista, comunista, vai acabar com a Igreja etc. Quanta discussão vã e sem fundamentos. Esses se esquecem de que a principal mensagem do evangelho é a defesa dos pobres, dos injustiçados.
Com São Judas Tadeu e São Paulo, é impossível não ficar calado diante da pobreza que assola, da falta de profetismo das igrejas que se aliam aos poderosos para tirar benefícios financeiros e políticos. Impossível é não perceber que a Igreja está longe de sua origem profética.
Ajude-nos, São Judas Tadeu a mudar o rumo de nossa história. A causa dos empobrecidos, do evangelho não está perdida! Ajude-os, São Paulo, a fazer com que o amor cresça entre nós, de modo que possamos discernir o que é melhor. Paz e bem a todos e todas!
[1] FARIA, Jacir de Freitas. A Vida Secreta dos Apóstolos e Apóstolas: à Luz dos Atos Apócrifos. Petrópolis: Vozes, 2005. 326p