18 Fevereiro 2022
Ação penal contra Luiz Nishimori prescreveu em 2017, diante da demora do STF, mas MP do Paraná moveu uma ação civil em 2020 para que ele restitua R$ 2,86 milhões à Assembleia; juíza em Curitiba cobra despesas com assessores entre 2003 e 2011.
A reportagem é de Alceu Luís Castilho e Bernardo Fialho, publicada por De Olho nos Ruralistas, 16-12-2021.
Relator do PL do Veneno na Câmara, o deputado Luiz Nishimori (PL-PR) ainda responde no Paraná a uma acusação de ter contratado funcionários fantasmas na Assembleia Legislativa. De Olho nos Ruralistas constatou que ele chegou a ter R$ 158.981,86 bloqueados pela Justiça, diante de uma ação civil — movida em 2020 — que reivindica a devolução de quase R$ 2,86 milhões ao erário. A ação penal já foi prescrita: o Supremo Tribunal Federal (STF) demorou tanto para aceitar a denúncia, em 2018, que o prazo havia expirado no ano anterior.
O inquérito que deu origem às investigações já tem mais de dez anos. Nishimori, à época no PSDB, e outros ex-deputados estaduais eram acusados criminalmente de, entre 2003 e 2011, contratar irregularmente assessores — um deles era o filho da empregada doméstica de uma das funcionárias da Assembleia acusadas de envolvimento no esquema. Com as prescrições, resta agora a demanda por ressarcimento dos gastos.
Nishimori tornou-se mais conhecido nacionalmente por ter conduzido nos últimos anos o PL 6.299/2002, de autoria do ex-senador Blairo Maggi, aprovado na quarta-feira (09) pela Câmara. O projeto de lei, conhecido como PL do Veneno, é uma das prioridades do governo Bolsonaro e da bancada ruralista — um dos motores do Centrão no Congresso.
O projeto criticado por pesquisadores e organizações ambientalistas retira
os poderes da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) na aprovação de agrotóxicos e aumenta o poder do Ministério da Agricultura, comandado pela ruralista Tereza Cristina, possível candidata à vice-Presidência em chapa com Jair Bolsonaro.
Este observatório começa hoje uma série sobre possíveis conflitos de interesses relativos às tramitações de leis sobre agrotóxicos na Câmara. Nos próximos dias serão descritas várias atividades do político e empresário Luiz Nishimori na Câmara e no seu reduto eleitoral no Paraná: do seu município de nascimento, Marialva, a Maringá, influente município vizinho. O deputado já vendeu agrotóxicos na região e, desde que assumiu o mandato na Câmara, ampliou seus poderes na Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a principal face institucional da bancada ruralista.
Em fevereiro de 2018, o Supremo Tribunal Federal aceitou denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Nishimori por peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro, em inquérito (INQ 3508) que teve origem ainda em 2011, com o Inquérito Policial 0014301-17.2011.4.04.0000. O Ministério Público do Paraná investigava a contratação de funcionários fantasmas em diversos gabinetes da Assembleia Legislativa daquele estado, em um esquema que ficou conhecido como Gafanhoto.
Como Nishimori já ocupava o cargo de deputado federal, com prerrogativa de função, as investigações foram encaminhadas para o Supremo, onde o ministro Alexandre de Moraes decidiu, com base no julgamento da AP 937, de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, que os crimes foram cometidos fora do mandato político, não relacionados a esse mandato.
Assim, o suposto esquema integrado por Nishimori entre 2003 e 2011, quando ainda ocupava cargo estadual, seria julgado pela justiça de ordem comum, neste caso, pelo Tribunal Federal da 4º Região (TRF4).
Apesar da abertura de ação civil, Nishimori se livrou da ação penal cabível por eventuais crimes cometidos no esquema. Somente entre a autuação no STF, em 2012, e o recebimento da denúncia, em 2018, se passaram seis anos, e o prazo prescricional à época era de cinco anos — ou seja, a denúncia na esfera penal já chegou natimorta ao Paraná.
A ação civil corre na 1ª Vara da Fazenda Pública, no Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. Outros nomes citados nas primeiras notícias sobre o esquema Gafanhoto — entre eles o do governador Ratinho Júnior — ficaram pelo caminho e não aparecem mais nas denúncias.
Segundo o Ministério Público, no caso de Nishimori, seu vínculo com a Assembleia Legislativa (Alep) se encerrou em 2011, de modo que as sanções pela prática do ato de improbidade estariam prescritas. Contudo, uma vez que o ato aparentemente causou danos ao erário, permanece a possibilidade de condená-lo ao ressarcimento – que é imprescritível. Com o início da ação civil para restituição ao erário, o MP requereu em caráter liminar o bloqueio das contas bancárias dos envolvidos.
Ao todo, o esquema desviou mais de R$ 32 milhões dos cofres públicos. Nishimori chegou a ter R$ 158.981,86 bloqueados na ação que pede ressarcimento de R$ 2.857.300,54 desviados do estado do Paraná na contratação dos seguintes funcionários fantasmas: Paula Heverli Teixeira Pires, Paulo Henrique de Almeida, Valter Fialho e Elton Theodoro de Castro. Paulo Henrique de Almeida, por exemplo, era filho da empregada doméstica de Silvana Bruel, funcionária da Alep envolvida no esquema.
Os bloqueios referem-se a contas de Nishimori no Itaú/Unibanco, no Banco do Brasil, no Bradesco e em unidades da Caixa Econômica Federal (CEF) em Brasília e, principalmente, em Maringá. O deputado pediu o desbloqueio da conta da CEF em Maringá alegando que os valores eram relativos a “lucros de sua atividade comercial rural”, valores “necessários ao pagamento de despesas das atividades rurais e agrícolas que realiza, incluindo o pagamento do salário dos seus funcionários”. A conta no Banco do Brasil também seria utilizada para “recebimento de pagamentos de sua atividade comerciante agrícola e rural”.
Os advogados de Nishimori tentaram desbloquear todos os valores, mas a juíza só autorizou o desbloqueio de R$ 5.659,30, referentes ao salário do deputado em 2020.
Entre os demais investigados estavam os ex-deputados estaduais Augustinho Zucchi (Podemos), Nelson Garcia (PSDB) e Luiz Accorsi (PSDB). Zucchi é o atual Secretário de Desenvolvimento Urbano do Paraná, nomeado em janeiro pelo governador Ratinho Junior. Garcia teve cinco mandatos na Assembleia e chegou a tentar uma vaga no Tribunal de Contas do Estado. O outro tucano, Luiz Accorsi, foi nomeado por Ratinho Jr. para um cargo de assessor na governadoria, no dia 1º de maio de 2019.
Duas servidoras da Alep acusadas de operar o esquema de contratação de funcionários fantasmas, Silvana Bruel e Alessandra Medeiros Radichewski, figuram ao lado dos quatro ex-deputados no polo passivo da Ação Civil de Improbidade Administrativa (0000286-47.2020.8.16.0004) iniciada em 2020 pelo MP-PR.
Em 2006, ano compreendido nas demandas da Justiça no Paraná por ressarcimento, Luiz Nishimori investiu R$ 159.990 do próprio bolso para se reeleger deputado na Assembleia. Isso significa quase 80% da receita arrecadada por ele na campanha daquele ano, R$ 209.215,50. Na última campanha para deputado federal, em 2018, o deputado arrecadou R$ 2.431.125,00, mais de dez vezes mais. A maior parte, R$ 2 milhões, saiu da direção nacional de seu partido, o PR. Nishimori não gastou nada do próprio bolso na última eleição.
O deputado possuía, em 2018, um patrimônio declarado de R$ 981.949,47, bem mais que os R$ 58.900 informados em 2016. Nas próximas reportagens da série vamos esmiuçar as empresas da família de Nishimori e suas dívidas — inclusive com a multinacional suíça Syngenta, hoje propriedade de uma estatal chinesa. Uma das reportagens voltará ao tema do financiamento de campanha. De Olho nos Ruralistas retoma temas abordados em notícias de 2018, como esta: “Relator do PL do Veneno, Luiz Nishimori vendeu agrotóxicos no Paraná“.
O observatório solicitou esclarecimentos a Nishimori, por meio de sua assessoria de imprensa, mas ainda não obteve resposta.
Os demais deputados paranaenses acusados no esquema Gafanhoto também tiveram prosperidade financeira. Nas últimas eleições que disputou, em 2014 e 2016, Luiz Accorsi declarou um patrimônio de R$ 1,5 milhão. Nelson Garcia tentou se reeleger na Assembleia, em 2010, com R$ 1,7 milhão em bens. Zucchi tinha R$ 452 mil em 2006; dez anos depois, reeleito prefeito de Pato Branco (PR), possuía R$ 1,12 milhão.
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Relator do PL do Veneno teve bens bloqueados em caso de funcionários fantasmas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU