18 Janeiro 2022
"Mantida essa liberalidade ilegal do Governo Federal, que tem insistido que a vacinação de crianças e adolescentes é opcional por parte do juízo das pessoas por elas responsáveis (mães, pais e outras) estaremos, nós todos, sociedade brasileira, autorizando que crianças possam morrer desprotegidas havendo proteção disponível, universal e gratuita. Desprotegendo-as por motivo ideológico, fútil. Alicerçado em desinformação genocida", escreve José Carlos Sturza de Moraes, cientista social, mestre em Educação, especialista em Ética e Educação em Direitos Humanos e especialista em Educação de Jovens e Adultos e Educação de Privados de Liberdade.
No Brasil é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. Essa determinação está expressa no Estatuto da Criança e do Adolescente, no capítulo do direito à vida e à saúde, em seu artigo 14. Logo, após a recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), a chancela dada pela consulta pública e aprovação pelo Ministério da Saúde, a vacinação de crianças contra a COVID-19 é obrigatória e não pode ser opcional.
A decisão política do Ministério da Saúde de deixar livre às mães, pais ou outras pessoas responsáveis por crianças de realizar ou não a vacina contra a maior causa-morte de crianças entre 5 e 11 anos de idade no Brasil nos últimos dois anos (308 óbitos evitáveis [MS, 2022]) é um precedente perigoso. Pois todas as vacinas para crianças são obrigatórias no Brasil. Ainda que profissionais de medicina possam prescrever adiamento ou antecipação de vacina obrigatória frente a um tratamento ou quadro clínico de pacientes de qualquer idade em tratamento ou recuperação de algum agravo específico, não têm o poder de se oporem à lei e se oporem a vacinação de crianças.
Além disso, o acesso à saúde pública universal e, em seu bojo, às vacinações é uma conquista civilizatória. Uma conquista que tem intenso controle público para se evitar que doenças e outros agravos evitáveis vitimem as crianças. Contexto em que escolas têm o dever de exigir a caderneta de vacinação na matrícula e a cada novo ano escolar, verificando se está em dia, e contribuindo na orientação social das famílias. Uma orientação que não implica em qualquer prejuízo ao ensino, pois, havendo qualquer dificuldade da família em dar conta desse direito das crianças, a escola pode acionar algum serviço de saúde para apoiar na orientação e atendimento, assim como, em casos excepcionais, o conselho tutelar. Nas políticas de assistência social e de saúde a vacinação infanto-juvenil é um dos elementos de análise para apoiar as famílias no bom cuidado da criança, sendo parte das obrigações familiares para se ingressar e permanecer em programas sociais como o Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família).
Ou seja, mantida essa liberalidade ilegal do Governo Federal, que tem insistido que a vacinação de crianças e adolescentes é opcional por parte do juízo das pessoas por elas responsáveis (mães, pais e outras) estaremos, nós todos, sociedade brasileira, autorizando que crianças possam morrer desprotegidas havendo proteção disponível, universal e gratuita. Desprotegendo-as por motivo ideológico, fútil. Alicerçado em desinformação genocida.
Além disso, a convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas, determina em seu artigo 24 que: “Os Estados Partes reconhecem o direito da criança de gozar do melhor padrão possível de saúde e dos serviços destinados ao tratamento das doenças e à recuperação da saúde”. E que devem realizar esforços para assegurar que nenhuma criança seja privada do direito de usufruir de cuidados de saúde e que, para serem efetivos, os Estados Partes devem garantir a plena aplicação desse direito por meio da redução da mortalidade infantil e da prestação de cuidados de saúde necessários para todas as crianças, dando ênfase aos cuidados primários de saúde na atenção básica.
Crianças e adolescentes têm dezenas de vacinas obrigatórias no Brasil. Então, é ético se defender que crianças não precisam de vacina, porque poucas crianças internam em hospitais e morrem por COVID comparativamente a população adulta? Se uma só criança morrer, agora já havendo vacina, isto é aceitável em nome da crença das pessoas adultas que a cuidam?
Tal construção discursiva não vai ao encontro de um perigoso adultocentrismo que reifica posse do corpo infantil, inclusive de disposição da vida alheia para dar fim a uma crença ideológica?
Crianças não deveriam gozar de absoluta prioridade e ter direito a todas as oportunidades?
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