30 Novembro 2021
A candidata de esquerda em Honduras supera o conservador Nasry Asfura em 20 pontos percentuais, com 51,4% dos votos apurados.
A reportagem é de Jacobo García, publicada por El País e reproduzida por Jesuítas da América Latina, 29-11-2021.
Honduras amanheceu nesta segunda-feira com a sensação de calma, depois de vários dias segurando a respiração ante o que poderia ocorrer no dia seguinte à votação. Os comércios, desde concessionárias a simples sapatarias, ainda tinham portas e janelas fechadas com madeiras e placas de metal para se proteger do que previam ser uma tensa noite de apuração. As ruas do país, no entanto, foram ocupadas por bandeiras vermelhas e fogos de artifício nos quais milhares de hondurenhos celebraram a muito provável vitória da primeira mulher que chega ao poder no Triângulo Norte da América Central.
Imagem: mapa de Honduras | Foto: Wikimedia Commons
Os resultados oficiais com os quais a população foi dormir confirmaram uma impressionante vantagem de Xiomara Castro por mais de 20 pontos à frente do candidato conservador Nasry Asfura, com 51,4% dos votos contabilizados. Ainda que falte terminar a apuração, sua vitória estaria respaldada por uma participação histórica que superou 68%, uma cifra especialmente alta em uma região apática frente às urnas como América Central. Depois de duas tentativas, tudo indica que Xiomara Castro, de 62 anos, voltará ao poder como presidente, depois de sofrer um golpe como primeira dama em 2009.
O candidato do Partido Nacional e prefeito de Tegucigalpa, Nasry Asfura, ficou em silêncio durante toda a manhã de segunda-feira, ainda que a sede do partido parecia desolada. A esperança da sua equipe, da chegada dos votos desde as zonas eleitorais, se desvanecia a cada hora, ao ver como as zonas afastadas da capital também respaldaram Xiomara Castro. Nesta segunda-feira, o terceiro candidato com alguma possibilidade, Yani Rosenthal, do Partido Liberal, reconheceu a vitória de Castro, assim como o fez o setor empresarial. O presidente do poderoso Conselho Hondurenho da Empresa Privada (Cohep), Juan Carlos Sikaffy, felicitou “a presidente eleita” e se ofereceu a trabalhar de forma conjunta “na reativação econômica”. No entorno do Partido Nacional, um dos principais estrategistas de Asfura, Luis Duque reconheceu a derrota. “Na vitória, os pés na terra. E na derrota, a cabeça erguida”, escreveu nas redes sociais. Em sua mensagem de agradecimento aos colaboradores, reconhece que a derrota foi resultado de um “sentimento de ódio” estendido pelo país.
Na mesma direção, as capas do dia seguinte em Honduras tampouco deixavam espaço para dúvidas. O jornal El Heraldo expressou com uma só palavra, lado-a-lado, em sua primeira página: “Xiomara”. E no jornal La Prensa, a capa era: “Xiomara ganha em jornada cívica”, ressaltando a lisura da votação.
A contagem foi interrompida por mais de quatro horas nas primeiras horas da madrugada porque as atas estavam chegando em caminhões de algumas partes do país. Apesar das suspeitas de fraude que pairavam sobre o processo, dada a experiência de 2017 – em que um apagão elétrico levantou suspeitas –, nesta ocasião, a conselheira do Libre no órgão eleitoral (CNE), Rixi Moncada, mostrou-se confiante no processo: “Temos nas mãos, como plenário da CNE, um cristal, que é o voto das pessoas que votaram em todo o país. Esse cristal tem que ser administrado como tal”, apontou, minimizando a desaceleração na publicação dos resultados.
A maré vermelha liderada por Xiomara Castro rolou não só nas eleições presidenciais, mas também nas de prefeitos e deputados. Em nível nacional, seu partido Libertad y Refundación (Libre) venceu em 17 dos 18 departamentos de Honduras. Em locais como Cortés, no norte do país, a diferença chegou a ultrapassar 40 pontos, obtendo 63,5% dos votos contra 21% de Asfura, na contagem provisória. A esposa do presidente deposto Manuel Zelaya venceu até em regiões tradicionalmente azuis, como Lempira e Intibucá. O único departamento nas mãos do Partido Nacional foi El Paraíso, onde o prefeito de Tegucigalpa alcançou 43,6% ante 41% de Castro. Também na capital, o candidato do Libre, Jorge Aldana, liderou claramente a contagem contra David Chávez.
Em seu discurso de vitória, Xiomara Castro insistiu na ideia de que sua vitória encerra a crise institucional que o país tem vivido desde o golpe de Estado de 2009. “Reverteram-se 12 anos de lágrimas e dor com alegria”, disse. Em suas primeiras palavras como “presidente eleita”, como foi apresentada, dedicou a vitória “aos mártires que ofereceram sua vida para que o povo tivesse liberdade, democracia e justiça”, disse em referência às muitas vezes que se movimento foi reprimido por soldados e policiais. “Deus tarde, mas não esquece, e hoje o povo fez justiça. Revertemos o autoritarismo”, afirmou.
O discurso de Castro foi o de um candidato triunfante que conseguiu convencer o campo e as classes médias, cansados da escandalosa corrupção que vai do presidente a um grande número de deputados. “Nunca mais haverá abuso de poder neste país, porque a partir deste momento, o povo será o eterno vigente em Honduras. Buscamos uma democracia direta e participativa”, destacou, referindo-se à Assembleia Constituinte com a qual promete refundar o país.
“Quero dizer ao povo hondurenho que todas as promessas que fazemos temos a segurança e a confiança de que vamos cumpri-las, não vamos descansar um minuto, vamos dar nossa alma, vida e coração para ser capaz de garantir uma pátria diferente, justa e equitativa”. Em suas poucas referências feministas, ela garantiu que não decepcionará as mulheres, e que exigirá respeito por elas, “assim como por quem elas mais amam: os filhos e a infância”, disse ela.
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Honduras. Governo silencia diante da vitória de Xiomara Castro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU