19 Julho 2021
Quando criança, o Santo Padre foi cinéfilo, viu todos os filmes com Anna Magnani e Aldo Fabrizi. Pelo prazer da tela ou, quem sabe, talvez por nostalgia da Itália. Ele gostou muito de “Roma, cidade aberta”, porque o fez entender a grande tragédia da guerra. O seu filme preferido continua sendo “A estrada da vida”, de Federico Fellini, pela sua inspiração evangélica. E ele aprecia ainda hoje o cinema neorrealista como uma “escola de humanismo”, como uma “catequese de humanidade”.
O comentário é de Aldo Grasso, publicado em Corriere della Sera, 18-07-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Na Itália que emergiu da guerra, sentia-se a necessidade de um renascimento político e social. Cineastas e diretores queriam ser os artífices dessa renovação. Propuseram um cinema que escavava a realidade do presente e do passado mais recente, trazendo à tona histórias, temas e personagens daquele mundo sobre o qual era preciso agir: o cinema neorrealista caracterizou-se imediatamente pelo seu forte compromisso social.
E podemos imaginar o efeito daqueles filmes para quem havia emigrado para o exterior, para fugir da ditadura ou da miséria. Ainda hoje, é difícil de explicar o que foi o cinema neorrealista, criatura polimórfica. Foi uma agregação de fenômenos heterogêneos? O nome de uma batalha? Uma ética da estética? Uma mistura de ideologia e poética? Uma coincidência? Um passeio entre as nuvens ou uma obsessão?
Alguns filmes daquele período continuam sendo extraordinários porque são fruto de um artifício de uma destinação incerta e ironicamente fatal. Eles parecem feitos magicamente por uma única pessoa. Aparentemente claros e determinados, de feliz transparência, são transitáveis em diferentes direções, inesgotáveis e insensatas (que ideia, transformar uma bicicleta em uma máquina narrativa!). É precisamente a sua “ambiguidade” linguística que os torna duradouros.
Para o Santo Padre, o neorrealismo é uma educação ao olhar e, a esse respeito, cita Simone Weil, que dedicou ao tema reflexões de intensa espiritualidade. Em “Espera de Deus”, ela escreve: “Uma das verdades fundamentais do cristianismo, hoje ignorada por todos, é que o olhar é o que salva”. Bastaria hoje redescobrir um pouco da coragem com que Simone Weil se concentrava em um fino feixe de palavras (Amor, Bem, Fé, Beleza, Necessidade, Limite, Sacrifício...), para restituir a elas a sua força incendiária. Muitas páginas dos escritos de Simone Weil são fogo que queima para que os nossos olhos possam ver melhor, em profundidade.
O curioso é que Roberto Rossellini se inspirou justamente na figura de Simone Weil para delinear a personagem de Irene, de “Europa 51”: não basta se deter no visível, que está diante dos olhos, é preciso, a todo o custo, buscar o invisível, que está atrás dos olhos.
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