15 Julho 2021
O presidente brasileiro quer abrir os territórios indígenas à exploração econômica.
A reportagem é publicada por Religión Digital, 14-07-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
O presidente brasileiro Jair Bolsonaro quer abrir os territórios indígenas à exploração econômica. Isso teria consequências dramáticas, escreve o bispo emérito de Altamira, no Brasil, Erwin Kräutler, em um chamado aos meios de comunicação realizado no último final de semana.
A exploração não apenas seria uma punhalada no coração dos povos que ali vivem, mas sobretudo um “novo e grave ataque ao ecossistema da Amazônia com consequências que não param na fronteira do Brasil”, disse Kräutler.
As consequências da pandemia, que causou muitas mortes entre os povos indígenas, já são bastante graves, disse: “Os garimpeiros de ouro propagaram o coronavírus e outras doenças entre os povos indígenas, o que causou muitas mortes. Sim, inclusive utilizam armas para conseguir o precioso metal. Graças a Deus, os índios não cedem em seu empenho e viajaram em centenas de pessoas à capital federal para insistir em suas demandas para que se respeitem os artigos constitucionais”, disse a carta do bispo.
Durante a Assembleia Constituinte dos anos 1980, a Igreja, junto com os representantes dos povos indígenas, exigiu energicamente que se consagrassem seus direitos fundamentais no texto da Constituição e havia pressionado para que as demandas se baseassem nos Direitos Humanos Universais, disse.
“Naquela época eu era presidente do Conselho dos Povos Indígenas da Conferência Episcopal. Naquele momento nos abraçamos com os indígenas após a votação de 30 de agosto de 1988, quando foi aprovado o capítulo dos povos indígenas com 437 votos a favor e apenas 8 votos contra e 8 abstenções. Foi uma vitória clara que também teve grande reconhecimento internacional. Agora, como em 1988, somos chamados novamente a lutar, junto com os povos indígenas, por seus direitos”, lembra Kräutler.
Desta vez, não se trata mais de ancorar os direitos indígenas na constituição. O que está em jogo agora é a manutenção desses direitos no texto da Constituição.
O Papa Francisco reconheceu acertadamente as organizações internacionais e associações da sociedade civil “que sensibilizam as populações e colaboram de forma crítica, inclusive utilizando legítimos mecanismos de pressão, para que cada governo cumpra o dever próprio e não-delegável de preservar o meio ambiente e os recursos naturais do seu país, sem se vender a espúrios interesses locais ou internacionais” (Laudato Si', 38).
Em sua encíclica, Francisco também defende com firmeza os povos indígenas: “Não são apenas uma minoria entre outras, mas devem tornar-se os principais interlocutores, especialmente quando se avança com grandes projetos que afetam os seus espaços. Com efeito, para eles, a terra não é um bem econômico, mas dom gratuito de Deus e dos antepassados que nela descansam, um espaço sagrado com o qual precisam de interagir para manter a sua identidade e os seus valores. Eles, quando permanecem nos seus territórios, são quem melhor os cuida” (Laudato Si', 146).
Segundo dom Kräutler, estes dois parágrafos da encíclica são o resultado de uma audiência privada concedida pelo Papa Francisco em 4 de abril de 2014: “Durante esta, ele me contou sobre seu projeto de escrever uma eco-encíclica, e eu lhe pedi que enfatizasse nesta carta sobre os direitos fundamentais dos povos indígenas a seus territórios ancestrais, e também lhes envio os documentos correspondentes sobre este assunto”.
Se há muita coisa errada no Brasil, disse ele, é certo que o reconhecimento dessa trágica realidade será o prelúdio para a mudança. Porque “os milhares e milhares de pessoas que saem às ruas de todas as capitais e grandes cidades, inclusive da Europa, exigindo a destituição de Bolsonaro não podem ser simplesmente ignoradas. A Ordem dos Advogados do Brasil, a Conferência Episcopal e inúmeras organizações civis e políticas se manifestam repetidamente. A organização guarda-chuva dos povos indígenas APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) planeja este mês acusar o presidente perante o Tribunal Penal Internacional de Haia de genocídio e ecocídio”, conta Kräutler.
A Igreja e os povos indígenas já tiveram sucesso neste sentido: o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, perdeu seu cargo ministerial. “Ele é uma figura especialmente pitoresca e ele próprio está implicado no comércio ilegal de madeira. Como ‘ministro contra o meio ambiente’, sua conduta no cargo há muito tempo estava desacreditada”. O juiz do Supremo Tribunal Federal ordenou que a Polícia Federal revogasse seu passaporte para que ele não pudesse fugir para o exterior e evitar um julgamento.
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Dom Erwin Kräutler chama à resistência contra o presidente Bolsonaro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU