25 Junho 2021
“A direita ultradireitista do século XX, na Argentina, nem imagina com qual tipo de Povo irá se encontrar no século XXI”, escreve Jorge Alemán, psicanalista e escritor, em artigo publicado por Página/12, 21-06-2021. A tradução é do Cepat.
Em relação à ultradireitização da direita argentina, não há muito mais o que falar. Segue a guinada transgressora, desinibida e furiosa das ultradireitas atuais. Não possuem nenhum pudor, nem vergonha de atacar tudo o que é digno de um ponto histórico. Em todo caso, a guinada mundial negacionista das ultradireitas na Argentina atinge limites medonhos.
Com efeito, a concentração monopólica dos meios de comunicação engendrou monstros que parecem competir em crueldade, cinismo e em incompetência jornalística. Tudo isto seria a reprodução de uma matriz mundial que se expande, mas o que se destaca na passagem ao limite da reação argentina é que se instalou na guerra fria dos anos 70 do século passado.
É possível que no ponto de partida do delírio esteja a vacina Sputnik V. A partir daí, surgiram envenenamentos da população, excrescências provocadas, espiões russos se encontrando em Cuba com políticos kirchneristas, negociações secretas sobre centrais nucleares, etc.
Estes delírios segundo diferentes variantes são relançados. A direita espontaneamente apreendeu um valor agregado no delírio: em primeiro lugar, supõe uma mudança de registro no discurso de tal modo que não pode ser refutado. Uma notícia pode ser contrastada, o delírio é pronunciado com uma certeza absurda, não podendo nem mesmo ser refutado, não é possível responder ao que nunca existiu.
Por sua vez, o delírio aponta para uma construção paranoica da realidade que indica um mito constitutivo do sujeito, em suas primeiras teorias infantis: somos manipulados por forças anônimas que jogam conosco, pois nos falta a substância necessária para sermos amados, somos material disponível para que as forças ocultas nos devorem. O próprio lobo que irá nos destroçar, anuncia que o lobo está chegando.
É um plano de infantilização da população de curto alcance. Isso não é calculado apenas pelas direitas, tocou a uma civilização neoliberal onde o estímulo ao ódio não encontra barreiras de sublimação na sociedade. As vidas precárias se multiplicam, não só precárias economicamente, também precárias no amor e na ética.
Por isso, na política atual, além da necessária vocação transformadora, trata-se de gerar confiança, confiança de que somos merecedores do amor que impede que sejamos tratados como bonecos de um filme ruim.
Na Argentina, isso se reforça em uma coreografia espetacular, estamos nos anos 70, a guerra fria está presente em toda a sua identidade e o inimigo interno infiltrado deve ser exterminado. Não é necessário nomear o inimigo interno. Mas a direita experimenta a metodologia que em 76 a permitiu “formatar” a Argentina de forma autoritária.
O limite de toda esta operação é que a mediocridade imbecil dos que conduzem estas políticas é que já são zumbis (é o caso de Macri) e aqueles que os seguem falam uma língua morta, um disco riscado que a Pandemia ainda cobre.
Em meio à confusão reinante, com o pesadelo dos anos 70 e a guerra fria que compulsivamente repetem, convenceram-se do próprio delírio maligno que não tem mais retorno. A repetição se fecha com o sinistro, mas não abre nenhuma porta histórica porque a humanidade começou a pensar e buscar outra vida que lhe permita habitar este mundo de forma digna. E por isso se esqueceram do povo que vem novamente pela verdade da justiça, a única coisa que tornou possível a convivência em comum. A direita ultradireitista do século XX, na Argentina, nem imagina com qual tipo de Povo irá se encontrar no século XXI.
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A direita argentina vive nos anos 70 do século XX - Instituto Humanitas Unisinos - IHU