16 Março 2021
"Quando você ouve os clamores e as vicissitudes do próximo, e guarda-os no escrínio da quietude, você presta dois ambivalentes serviços: o primeiro, permitir que as descargas emocionais se esvaiam pelo para-raios daquele que ouve, numa espécie de polo de “descarrego”; o segundo, torná-lo receptivo à reflexão para retorno ao equilíbrio comportamental." escreve José Carlos Gentili, membro da Academia das Ciências de Lisboa, da Academia Brasileira de Filologia e da Academia de Letras de Brasília.
Carta ao estimado Doutor Antônio Paulo Filomeno, apreciador das taínhas de Laguna, da antiga Província de Santa Catarina, cuja capital foi Desterro, hoje Florianópolis.
Meu cardiologista, como dizemos nós míseros moribundos clientes cardiovasculares!
Sua costumeira generosidade e seu senso humanitário não foram compreendidos por alguns de seus pares, mais preocupados com o vil metal e esquecidos do alcance do juramento de Hipócrates.
Recebi sua inquietante mensagem e dei-lhe resposta metafórica, aguardando paz e reflexão.
Agora, na mansidão do trato justo e perfeito, digo-lhe, pela via do gênero epistolar, desde os tempos colegiais no vetusto educandário tedesco – o centenário Deutscher Hilfsverein –, quando se aprendia caligrafia e português culto e que o Tempo é o senhor das ações.
E, por falar na Grécia Antiga, devo dizer-lhe que desde cedo absorvi as reflexões aristotélicas, que tratam da catarse – efetiva purificação filosófica.
Saber ouvir e guardar silêncio é exercício da maior magnitude a integrar o universo infinitesimal da amizade sincera.
Quando você ouve os clamores e as vicissitudes do próximo, e guarda-os no escrínio da quietude, você presta dois ambivalentes serviços: o primeiro, permitir que as descargas emocionais se esvaiam pelo para-raios daquele que ouve, numa espécie de polo de “descarrego”; o segundo, torná-lo receptivo à reflexão para retorno ao equilíbrio comportamental.
Num dos meus livros – José Carlos Gentili, um cidadão do mundo –, que é a primeira fotoautobiografia do país, secundada pela obra de Clarice Lispector, inicio com um meu aforisma, assim: “cultivo amigos e poesia, que mantêm viva as nossas ilusões”.
Nos ritos de passagem, as ilusões são as últimas emanações a deixarem nossa alma!
Os oragos helenos sempre exerceram esta função neuro-terapêutica, quando as pitonisas em seus oráculos, após ouvir as ansiedades dos viandantes, proporcionavam orientações que, muitas vezes, tornaram-se, com o passar do tempo, inequívocas predições. O Oráculo de Delfos, na época de uma pandemia, orientou a exumação dos cadáveres e o sepultamento na ilha próxima de Reneia.
Agora, meu caro amigo, após o processo catártico, você examinará a questão sob outro prisma, verificando que a estratégia comanda as ações na busca de atingimento de objetivos.
Acompanha-se seu belíssimo projeto, oportunidade em que lhe ofereço a edição na Revista Científica e Cultural – RCC, distribuindo-a a gregos e troianos, em português, espanhol e inglês, afim de que suas ideias sejam divulgadas, erga omnes, como diziam os latinos.
A telemedicina avança a passos largos com o desenvolvimento da inteligência artificial, deixando estratificados aqueles médicos consolidados em estruturas arcaicas, corporativistas, associativas, alienadas dos princípios basilares da fraternidade, oportunidade em que reavivo a Carta aos Filipenses, de seu homônimo Paulo, apóstolo do Rabi.
Esta pandemia tem mensurado espíritos na órbita do servir ao próximo.
O Tempo dirá!
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Medicina e seus novos rumos pós-pandêmicos. Artigo de José Carlos Gentili - Instituto Humanitas Unisinos - IHU