Por: MpvM | 20 Novembro 2020
"Cristo: Rei do Universo: com esta festa se conclui o ano litúrgico e nos despedimos das comunidades de Mateus que encerram o ciclo das parábolas com esta visão grandiosa: a vinda do Filho do Homem come rei, pastor, juiz, que se identifica com os ‘mais pequeninos’, protagonistas e destinatários da Boa Notícia do Reino. Isso me leva a fazer conexão com Jesus na montanha das Bem-aventuranças, cantando sua utopia e programa e a compreender o significado desta festa à luz da bem-aventurança da misericórdia."
A reflexão é de Tea Frigerio, mmx, religiosa da Congregação Missionárias de Maria-Xaverianas. Ela possui graduação em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma - PUG e pós-graduação em assessoria bíblica pela Escola Superior de Teologia - EST e pelo Centro de Estudos Bíblicos - CEBI, São Leopoldo/RS. Atualmente atua em assessoria bíblica pelo CEBI e é assessora nacional das Comunidades Eclesiais de Base - CEBs.
1ª Leitura - Ez 34,11-12.15-17
Salmo - Sl 22,1-3.5-6
2ª Leitura - 1Cor 15,20-26.20
Evangelho - Mt 25,31-46
Cristo: Rei do Universo: com esta festa se conclui o ano litúrgico e nos despedimos das comunidades de Mateus que encerram o ciclo das parábolas com esta visão grandiosa: a vinda do Filho do Homem come rei, pastor, juiz, que se identifica com os ‘mais pequeninos’, protagonistas e destinatários da Boa Notícia do Reino. Isso me leva a fazer conexão com Jesus na montanha das Bem-aventuranças, cantando sua utopia e programa e a compreender o significado desta festa à luz da bem-aventurança da misericórdia.
“Em Jesus, Deus se humaniza”: esta afirmação nos revela que Deus se reveste de ternura, se faz Misericórdia.
Nasceu um Menino: apareceu a ternura e a doçura do Deus que salva. No rosto de uma criança se torna visível a Misericórdia, a Divindade desce sempre mais abaixo, nasce no ventre de uma gruta e se faz terra fértil.
Misericórdia carregada de humanidade: energia que faz tudo existir, discreta presença expansiva que ilumina todas as expressões de vida, rosto que desvela todos os rostos e a todos dignifica.
A Misericórdia “desce” nos rincões da humanidade; uma intensa Luz brilha no ventre da terra e nos convida a olhar contemplativamente todo o universo e descobrir o significado do mundo. “Deus se fez mundo”. As grutas sempre despertaram fascínio nos seres humanos; elas possuem uma força atrativa e guardam segredos em seu interior. Ao mesmo tempo simbolizam o desejo permanente de retornar ao ventre materno, lugar de segurança, de aquecimento...
A contemplação do nascimento de Jesus nos impulsiona a fazer a travessia para o interior de uma Gruta: ali o Grande Mistério se faz visível e revelador do sentido da existência humana.
Trata-se de “entrar” nela com suavidade, de percebê-la e fazê-la descer até o coração, de convertê-la em matéria de consideração e oração silenciosa e surpreendida.
A contemplação desse Rei-Menino na Gruta revela que Deus, na sua Misericórdia, assumiu a aventura humana desde seus começos até seu limite (vida, amor e morte). Deus se fez “tecido humano”, revestiu o ser humano de sua própria glória, plenificou-o de sentido e de finalidade. No nascimento de Jesus é revelada a grandeza, a dignidade, o mistério inesgotável do ser humano. Nossa humanidade foi divinizada pela “descida” de Deus. “Sendo rico, Cristo se fez pobre para que nós participássemos de sua riqueza” (2Cor 8,9).
Acolhido pela natureza, presente na Gruta, Deus se deixou impactar por tudo aquilo que o rodeava: Deus na nossa carne quente e mortal. Um Deus que “adentrou” na humanidade e de onde nunca mais saiu; um Deus que agora pode ser buscado em nossa interioridade e em tudo o que é humano. Na pobreza, na humildade da própria história pessoal, inserida na grande história da humanidade, torna-se possível acolher o dom do amor de Deus visível na Criança de Belém.
Quando confessamos que a Palavra se fez carne, cremos que o desejo do ser humano de se tornar divino se concretizou, o utópico se tornou tópico. Cremos que o ser humano chegou a Deus porque Deus chegou primeiro ao ser humano. O ser humano se “divinizou” porque Deus se “humanizou”. Ao humanizar-se Deus não mutilou o ser humano, mas divinizou-o.
O palácio e a manjedoura, o imperador e a criança, Augusto e Cristo, Herodes e os pastores... esses são os pontos mais distantes entre si, os polos extremos de toda a história humana. Esse abismo nos ajuda a compreender o modo de agir de Deus Misericordioso.
Ele não irrompe na história pelo lado mais alto e forte; prefere revelar sua presença no reverso da história. Para encontrar Deus temos de empreender o caminho de “descida”, dirigir o olhar e o coração para o mundo da exclusão.
Lá em “cima” não há lugar para a Maria pobre, nem para o José sem recursos, nem para a criança sem títulos. O Filho de Deus apareceu nos grotões da humanidade, justamente lá onde ferve a luta pela sobrevivência, onde se acotovelam os esquecidos, os náufragos da vida, os migrantes, os sem-terra, os nus, os presos, os que tem fome e sede de pão e de justiça. Deus se faz “clandestino” entre os clandestinos desta terra de exclusão. Porque viveu a experiência da exclusão é que Jesus inclui. Porque foi marginalizado é que Ele acolhe. Porque foi ignorado que se identificou.
Com a ação ousada e surpreendente de Deus, a periferia se põe em efervescência, os pobres e excluídos se agitam, uma alegria contagia a todos. Uma novidade foi introduzida por Deus na história da humanidade: chegou a vez do protagonismo dos últimos, dos pequenos, da “massa sobrante”; quem estava “fora” ocupa o centro das atenções; o olhar de todos se dirige para a periferia da história, onde em Jesus, Deus se faz “margem”. Na Encarnação e Nascimento de Jesus esvaziou-se o céu. Deus abandonou o trono altíssimo, exilou-se nas entranhas profundas da humanidade, da mãe terra e assumiu tudo o que é radicalmente humano, toda a criação.
Se a história da Encarnação começa lá “embaixo”, na periferia, quer dizer que a fé em Deus implica prestar atenção na manifestação do amor materno e na frágil beleza do recém-nascido.
É por esse caminho que podemos chegar à descoberta e à experiência de Deus; é também por este caminho que podemos chegar ao conhecimento de nós mesmas. No momento em que a Palavra de Deus assume um rosto, todo ser humano chega à plenitude de sua realização: entra em comunhão com o Infinito e recebe uma dignidade infinita.
Em Jesus, Deus não só se humanizou, senão se fez “pequenino, pobre e humilde”. Na “vida oculta em Nazaré” encontramos os “nomes” e “verbos” nos quais Deus falou em Jesus e onde continua nos falando hoje.
Ali Ele se faz “um entre tantos”, vizinho com os vizinhos, trabalhador com os que trabalham, acolhendo a vida cotidiana em toda sua riqueza e limitação. Ele é “o filho do carpinteiro”.
Conheceu a dor real do povo, na escola de Deus, que é a escola da vida humana, em contato com as necessidades dos mais pobres e excluídos, em solidariedade laboral. Assim aprendeu a ser humano, ouvindo os gritos dos homens e mulheres de seu entorno, expulsos, oprimidos, desgarradas como ovelhas sem pastor. Não teve que entrar a partir de fora no lugar da dor; cresceu ali, o cotidiano o levava dentro.
Jesus nos ensina, o valor das coisas cotidianas quando são feitas com dedicação e carinho.
Nesta ocultação a “Divindade escondida” estava assumindo a condição da imensa maioria dos mortais deste mundo, dos homens e mulheres “comuns”, dos que vão trabalhar ou estão sem emprego, dos que tem que “ganhar a vida” porque na vida não encontram seu lar, daqueles que são puras estatística.
Na escola da vida, comum e cotidiana, Jesus também foi aprendiz. Portanto, Jesus viveu a vida como um processo lento e progressivo, a partir da própria condição humana no meio dos seus, no meio do povo e em vista do Reino de Deus, graças a uma criatividade transformadora.
Na sua vida em Nazaré Jesus nos convida a entrar na sua casa para aprender d’Ele e com Ele os valores do Evangelho. É difícil compreender a “normalidade” da vida de Jesus Cristo; parece até que o Reino não tem exigências sobre a sua Vida. Identificando-se com a vida de todo mundo revelava que a salvação não consiste em coisas extraordinárias e em gestos fantásticos, mas na identificação com os pequeninos. O Reino se revela no pequeno, no anônimo e não no espetacular, no grandioso.
Nazaré é o sinal da “epifania” de Deus nas pequenas coisas, é o sinal da Palavra Divina escondida nas vestes humildes da vida simples, é o sinal do sorriso de Deus para a rua de nossa casa, é presença de um rei no avesso da história.
O reinado de Jesus nos pedem tempo, presença, assombro... para deixar-nos afetar por ele, então:
• Descer nos humanizando, mergulhando na humanidade de Jesus;
• Descer e com Jesus Filho do Homem, nos identificar com os mais pequeninos;
• Descer e com Jesus Cristo, Rei do Universo orar.
Os pobres e a terra clamam:
Senhor, leva-nos com a tua força e a tua luz,
para proteger toda a vida,
para preparar um futuro melhor,
para que
venha o teu reino de justiça, paz, amor e beleza.
Laudato si'!
Amém.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
34º domingo do tempo comum - Ano A - Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU