14 Outubro 2020
“As últimas palavras que disse? "Estou morrendo feliz porque não desperdicei minha vida." Ele me disse que eu teria outros filhos. Assim foi. E que ele estaria perto de mim me enviando sinais. Já recebi muitos”.
Antonia Salzano é a mãe de Carlo Acutis, o jovem milanês que morreu em 2006 de leucemia fulminante e que hoje é beatificado em Assis, onde o corpo é exposto após tratamento com técnicas de conservação. Nascido em Londres em 1991, filho de Andrea Acutis, presidente da Vittoria Assicurazioni, Carlo tinha quinze anos quando adoeceu e morreu.
A entrevista Antonia Salzato é de Paolo Rodari, publicada por la Repubblica, 10-10-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Como ele viveu os últimos dias?
Ele parecia ter uma gripe normal. No colégio Leone XIII, muitos colegas estavam com gripe. À mesa saiu com uma frase estranha: ‘Ofereço os meus sofrimentos ao Papa e à Igreja, para não ir ao purgatório, mas diretamente ao paraíso’. Estávamos acostumados com essas esquisitices, não demos peso a isso. Após quatro dias de febre, ele foi atingido por astenia. No hospital, tivemos o diagnóstico em minutos: leucemia fulminante. Ele disse: ‘O Senhor deu-me um belo despertador’.
Como você reagiu?
Foi um golpe duro.
Você era uma pessoa de fé?
Na minha vida só tinha ido à missa três vezes, no dia do batismo, da confirmação e do matrimônio. Mas com Carlo eu tive necessariamente que me reconectar com a fé. Ele sempre falava de Jesus, por isso não cheguei totalmente despreparado para a sua morte.
Onde ele morreu?
No San Gerardo de Monza. Quando ele entrou, disse-me: ‘Não vou sair daqui’. Em poucos dias ele nos deixou. Lembro que ele sorria, estava tranquilo, apesar dessa leucemia causar uma dor terrível. ‘Existem pessoas que sofrem mais do que eu’, disse-me ele. Ele estava preocupado com as enfermeiras. Não conseguia se mexer e tinham que movimentá-lo, tinha 1,85 de altura, pesava 70 quilos.
O que aconteceu após sua morte?
Houve o funeral. Havia muita gente, até alguns sem-teto e imigrantes que eu nunca tinha visto. Eram amigos de Carlo. Ele conhecia todo mundo. Ajudava os sem-teto e era amigo dos porteiros da zona, na sua maioria imigrantes.
Por quê?
Costumava andar de bicicleta pelo nosso bairro do centro de Milão. Ele cumprimentava todos os imigrantes. Dizia que muitas vezes pensava no quanto sofreram por terem deixado seu país para vir até nós. Era amigo deles.
E quanto aos sem-teto?
Muitos dormiam no Arco da Paz. À noite, ele levava comida, às vezes parte do seu jantar. Ele também me pediu permissão para comprar cobertores para eles, e foi o que ele fez.
Onde ele aprendeu essa generosidade?
Era inata. Ele frequentou uma paróquia jesuíta perto de casa. Ela tinha uma relação particular com Jesus, para ele era uma pessoa viva, com quem dialogar. Ele quis fazer sua primeira comunhão aos sete anos. Ia à missa todos os dias. Em seguida, ele parava na igreja em frente ao Santíssimo para dialogar com ele. Ele realmente acreditava que o corpo e o sangue de Cristo estavam ali. Quando viajávamos para o exterior, a primeira coisa que fazia no hotel era perguntar sobre a igreja mais próxima para ir à missa.
Como surgiu a beatificação?
Desde o dia do funeral, Carlos era um santo para muitos. Os testemunhos de milagres começaram a chegar. Uma criança no Brasil, durante uma novena dirigida a Carlo, se recuperou de uma malformação do pâncreas. O órgão se regenerou. Isso raramente acontece. Mas, nesse caso, aconteceu. Foi esse o milagre que abriu o caminho para a beatificação.
Fala-se que a Igreja poderia torná-lo patrono da Internet, por quê?
Ele era muito bom com computadores. Ele o usou para criar exposições que depois deram a volta ao mundo, uma foi a milhares de paróquias americanas. Evangelizava pela web.
Muitos repetem uma frase sua: Todos nascem originais, muitos morrem fotocópias.
Dizia que existe um projeto único e irrepetível para cada um de nós. Basta encontrá-lo e ser fiel a ele. Dizia que até as impressões digitais dizem que somos únicos e irrepetíveis.
Ele tinha muita fé?
Jesus disse que se você acreditar, pode mover montanhas. Ele acreditava nisso. Ele sempre falava com seu anjo da guarda. Pedia-lhe ajuda.
É verdade que ele pensava que morreria em breve?
Depois de sua morte encontrei um vídeo, uma espécie de testamento. Ele disse que estava destinado a morrer. Em Milão, no primeiro dia do ano, no catecismo, costuma-se pescar um santinho em uma cesta como acompanhamento para todo o ano. Em 2006 pescou Santo Alexandre Sauli, bispo de Pavia de 1500. Morreu em 11 de outubro, no mesmo dia em que foi decretada a morte encefálica ao meu filho.
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“Ele vivia para os últimos. O segredo do meu filho que será beato aos 15 anos”. Entrevista com Antonia Salzato - Instituto Humanitas Unisinos - IHU