01 Outubro 2020
O mundo do trabalho passa por várias transformações tecnológicas que influenciam as empresas a tomarem inúmeras medidas para melhorarem o seu desempenho, estratégias para continuarem forte no mercado e automações que acelerem o processo industrial. Tudo isso ocorre de forma rápida e a tecnologia está avançando enquanto os trabalhadores se desesperam para criar alternativas e se moldarem a essa nova era, conseguindo renda para sobreviverem.
A reportagem é de André Martins, estagiário do Curso de Jornalismo da Unisinos.
Cesar Sanson, professor de Sociologia do Trabalho na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, em entrevista publicada no sítio IHU, afirma que alguns autores importantes já falavam sobre esses novos processos de forma taxativa, destacando que os anos dourados do capitalismo ficaram para trás e a sociedade do pleno emprego, vindo principalmente da revolução industrial, jamais voltará. Todas essas discussões sobre onde podem chegar essas novas ordens de trabalho passam, principalmente, pela classe trabalhadora, se questionando onde terá emprego no meio dessas evoluções.
Outro acontecimento que, para Sanson, interage fortemente com as novas transformações no mundo do trabalho, é a chamada revolução 4.0, que anuncia efeitos ruins sobre o mundo do trabalho. “Essa revolução anuncia efeitos devastadores sobre o mundo do trabalho, particularmente sobre a estrutura ocupacional. Por ora, percebem-se duas posições em debate: Aqueles que acreditam num final feliz (trabalhadores deslocados pela tecnologia encontrarão novos empregos desencadeados pelas novas tecnologias) e aqueles que veem um processo crescente de destruição de empregos”, afirma. Estudos que procuram traçar cenários dessa revolução que ocorre na indústria não são nada animadores. Como já era previsto por alguns estudiosos, a disseminação das tecnologias cada vez mais sofisticadas está acelerando a eliminação de pessoas dos postos de trabalho.
O debate sobre o trabalho é importante para pensarmos em como queremos uma sociedade harmoniosa, já que é a atividade profissional que permite ao ser humano ter um reconhecimento social e uma renda salarial para usufruir dos bens capitalistas.
O exemplo mais claro para Sanson, comparando a revolução industrial, que empregou muitas pessoas, e a revolução 4.0, que preza a tecnologia, é o de duas empresas semelhantes, ícones de cada revolução: GM e Tesla. A primeira gerou produtividade criando empregos e pagando salários, enquanto a segunda teve ganhos de produtividade no mercado financeiro. “Isso porque a Tesla, incorporando tecnologias inovadoras, gera pouquíssimos empregos, logo os ganhos da produtividade acumulados pela incorporação de tecnologia, não retornam para a sociedade, ao contrário, ficam nas mãos dos acionistas”, diz.
Para Luiz Gonzaga Beluzzo, em artigo reproduzido no sítio do IHU, o progresso tecnológico existente a partir da inteligência artificial não remove os trabalhadores por completo da indústria. Há uma dissolução do emprego formal da economia, mas isso não significa que os trabalhadores terão que pensar em alternativas autônomas ou que ganharão mais tempo para o trabalho. Para Beluzzo, ao contrário, aumenta a dependência dos trabalhadores a grandes estruturas criadas na transformação tecnológica. “O fenômeno do surgimento e multiplicação das chamadas plataformas digitais invade o espaço ocupado pelo comércio, pela finança, pelos serviços, pela publicidade e pela produção. As empresas de plataforma têm um papel cada vez mais importante nas economias contemporâneas. Além dos gigantes numéricos, como Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft, as plataformas ocupam outros setores como finança, hotelaria, transportes, comercialização e distribuição de mercadorias, entrega de comida em domicílio”, afirma.
Outro processo dessas novas formas de trabalho e da revolução tecnológica foi a criação da empresa Uber, que virou um termo famoso para a terceirização da mão de obra sem vínculos empregatícios e garantias para o funcionário, a uberização. Em entrevista à Revista IHU On-Line nº 503, Ludmila Costhek Abílio, doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, acredita que é evidente que há uma relação muito forte entre o desenvolvimento tecnológico e a precarização do trabalho. “A uberização deixa muito evidente uma relação facilmente obscurecida, entre desenvolvimento tecnológico e precarização do trabalho, e nos possibilita hoje ver como elementos recorrentemente considerados periféricos, desimportantes, por vezes até mesmo definidos como ‘pré-capitalistas’ em pleno século XXI, estão hoje no centro desta forma de exploração”, menciona. Luciana ainda afirma não ter ideia de onde essa uberização pode parar, mas as perspectivas não são animadoras. As forças de trabalho são atacadas em dimensões cada vez piores.
Segundo Roberto Heloani, mestre em Administração pela Fundação Getúlio Vargas/SP e doutor em Psicologia pela PUC -SP, em entrevista à Revista IHU On-Line nº 416, as mudanças do trabalho afetam também como o jovem se vê dentro de uma empresa. Antes, os jovens entravam numa fábrica imaginando o ciclo que teriam, se afirmando naquele espaço, e tendo como garantia a manutenção de uma renda que possibilitaria a criação de sua família. Hoje o jovem entra na escola recebendo a ideologia da internet, a qual exige proatividade, sendo treinado para responder rapidamente. Quando ele entra na indústria, naturalmente ele permanece, em média, entre 2 e 3 anos na organização. Até mesmo a amizade concebida dentro de uma empresa é profissional e, desde muito cedo, essa ideia é ensinada às pessoas. “Se tem alguém perverso é a própria forma de organizar o trabalho. Essa forma diferenciada de organizar o trabalho tem obviamente benefícios, pontos positivos, mas também tem muitos pontos negativos. Não é à toa que ainda nesta década, até 2020, segundo relatórios internacionais, a segunda causa de afastamento do trabalho será o transtorno mental, sendo que a mais recorrente será a depressão. Isso é gravíssimo. Uma característica muito forte desse modelo de organização do trabalho é a solidão. Encontra-se rodeado de pessoas, mas verdadeiramente se está só”, constata.
Nos últimos anos, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU tem refletido sobre as transformações no mundo do trabalho e suas consequências em diferentes esferas da vida humana. A seguir, veja algumas das entrevistas e revistas publicadas na página do IHU.
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A revolução 4.0 e a uberização anunciam efeitos devastadores no mundo do trabalho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU