16 Setembro 2020
Vice-reitora do Angelicum, formada em engenharia de gestão em Cambridge, especialista em ética e gestão, a dominicana foi nomeada em 4 de setembro por Francisco como membro da Pontifícia Academia de Ciências Sociais. À mesa da Pontifícia Academia das Ciências Sociais, o think tank à sombra do Cupolone presidido por Stefano Zamagni que trata de economia, política e sociedade para desenvolver a doutrina social da Igreja, ao lado de grandes nomes do cenário econômico mundial como Mario Draghi e Joseph Stiglitz, a partir de 4 de setembro por indicação do Papa vai estar uma freira dominicana. Trata-se da irmã Helen Alford, religiosa nascida em Londres, em 1964, vice-reitora do "Angelicum", a universidade pontifícia que leva o nome de Santo Tomás de Aquino, da qual foi a primeira mulher decano de 2001 a 2013. Graduada em engenharia de gestão em Cambridge, a religiosa é uma autoridade no campo da responsabilidade social de empresa, da ética econômica e da história do pensamento social cristão. Temas sobre os quais fala com paixão e realismo, à luz do difícil período histórico pós-Covid pontuado por crises e incertezas.
A entrevista com Helen Alford é editada por Salvatore Cernuzio, publicada por Vatican Insider, 14-09-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Irmã Helen, o que significa para você a nomeação para um importante órgão da Santa Sé?
É uma grande honra estar ao serviço do Papa e ajudá-lo a resolver os problemas atuais na companhia de personalidades reconhecidas. É também uma honra para a Pontifícia Universidade Santo Tomás de Aquino, onde trabalho há 25 anos. Vivi uma experiência importante nessa faculdade que privilegia os estudos interdisciplinares para as ciências sociais. Foi uma boa preparação para entrar na Academia, onde a Igreja se coloca em diálogo com o mundo intelectual.
Que contribuição você acha que pode oferecer?
Sempre tratei da relação entre ética e economia que considero fundamental no período pós-Covid. Ainda vivemos as consequências da crise financeira e estamos no meio de uma pandemia global que tem representado um choque para a economia dos cinco continentes. Nessa conjuntura devemos pensar em como reestruturar a economia, como melhorar os problemas de antes: da injustiça social e as exclusões, à falta de uma relação sustentável com o meio ambiente. Nos perguntamos: o que mudar? Que contribuição oferecer? Temos que recomeçar pela ética, que é o viver bem uma boa vida. Esse será um tema que abordaremos durante uma assembleia em meados de outubro da Pontifícia Academia, na qual tentamos pensar sobre uma retomada econômica no pós-pandemia. Acredito, aliás, espero poder dar uma contribuição importante também em virtude da preciosa tradição intelectual da ordem dominicana.
Você falou de retomada econômica. Como concretizá-la mantendo a visão do "homem no centro" promovida pelo Papa sem ser devorado pelas lógicas de mercado que, neste tempo de incertezas, também se tornam necessárias?
Duas, em minha opinião, são as coisas fundamentais. Em primeiro lugar, a visão de uma economia em função dos propósitos humanos. Sobre esse ponto, avançamos. Isso é demonstrado pela responsabilidade social de empresa, que é bastante difundida. A ideia é que a empresa e os atores econômicos levem em consideração os aspectos sociais, o work life balance, a visão de trabalhadores como membro de famílias. Em outras palavras, conjugar o “homem como homem” com o “homem como trabalhador”. O mundo econômico já se encaminhou nessa direção: os produtos que oferecemos ajudam as pessoas a crescer. Nesse sentido, o desenvolvimento da inteligência artificial é fundamental, sem cair no clichê do efeito negativo nos postos de trabalho. É um tema sobre o qual trabalhamos na Academia de Ciências Sociais.
Um tema espinhoso devido ao medo de que as máquinas tomem o lugar do homem. A notícia recente de um editorial no “The Guardian” inteiramente escrito por um robô fez tremer vários jornalistas ...
Eu acredito, ao contrário, que a relação homem-tecnologia precisa ser aprofundada. É uma questão que me é cara, também a ela dediquei a minha tese de doutorado. Estou convencida de que o desenvolvimento tecnológico centrado no ser humano é possível.
Como?
Digo três palavras: motivação, convicção, incentivo para as políticas certas. A tecnologia deve ser usada para estimular o emprego e não o prejudicar, é claro, mas somos nós que orientamos o desenvolvimento tecnológico. Precisamos pensar no que nós, britânicos, chamamos de “skill”, a competência dos seres humanos. Por exemplo: no Museu da Ciência de Londres estão expostas máquinas têxteis que datam da Revolução Industrial. Parecem iguais, mas têm orientações "filosóficas" e "políticas" diferentes: uma máquina era construída para tornar a competência humana mais produtiva, a outra para tirá-la. Ou seja, servia para aumentar a produção e era utilizada pelos donos de fábricas que queriam pagar o mínimo aos trabalhadores. Isso para explicar que não é a tecnologia que nos domina, somos nós que determinamos seu uso, que fazemos as escolhas.
Pandemia, crise econômica, inteligência artificial. Como a Igreja em tudo isso se posiciona, onde se coloca?
Desde a Rerum Novarum até hoje, a Igreja sempre promoveu o bem comum. Um conceito interessante, essencial para esta época que vive problemas sociais, sistêmicos, ecológicos, científicos. Problemáticas que não poderão ser resolvidas enquanto pensamos em cada um como indivíduo. Temos que pensar em nós mesmos como uma comunidade para mudar o mundo e impulsionar o desenvolvimento da história. A Doutrina Social da Igreja oferece perspectivas para o presente e o futuro, acima de tudo a convicção de que o ser humano pode ser colocado no centro, mesmo que às vezes pareça uma meta inatingível.
Entre as perspectivas para o futuro, o Papa indicou o desarmamento nuclear e a abolição do comércio de armas. O que pensa a respeito?
O Papa indica uma perspectiva, precisamente, que é a de um mundo mais justo e melhor. É o que todos desejamos, mas as ideias esbarram na realidade do investimento. Portanto, antes de alcançar os resultados almejados pelo Santo Padre, é necessário um longo e difícil processo. Se forçarmos muito o passo, teremos apenas resistência e poucos progressos.
Em novembro, você participará do “The Economy of Francesco”, encontro de economistas under 30 de todo o mundo organizado pelo Papa, inicialmente programado para Assis e agora em streaming mundial. Qual resultado você gostaria deste evento?
Vejo o encontro como um grande campo que fará florescer flores e frutos para o futuro. Está subdividido em 12 aldeias temáticas, estarei na "Vocação e lucro". Há um grande surgimento de ideias "de baixo", isto é, dos jovens, que podem trazer importantes novidades para os próximos anos. Algumas no nível global, outras no nível local ou na vida dos próprios jovens. Cito uma como exemplo: um sistema de serviços para as faixas sociais pobres e não apenas para as abastadas. Outra ideia que me impressionou é aquela de alguns jovens da América Latina que gostariam de criar uma B-Corp (Benefit-Corporation, empresas com fim lucrativo que visam maximizar o impacto positivo para a sociedade e o meio ambiente, ndr) no nível internacional. Atualmente não há nenhuma: a B-Corp é um status jurídico admitido em 35 países, incluindo a Itália. O desenvolvimento de tal projeto teria efeitos positivos em todo o mundo.
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Helen Alford, a freira economista no think-tank do Papa entre Draghi e Stiglitz: “Colocar o ser humano de volta no centro da economia pós-Covid” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU