15 Setembro 2020
Pesquisa mostra avanços e retrocessos do sistema público e crescimento do privado.
A reportagem é de Viviane Tavares, publicada por EPSJV/Fiocruz, 10-09-2020.
Divulgada no dia 4 de setembro, a primeira etapa da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2019, realizada pelo convênio entre o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Ministério da Saúde, abordou dados de acesso e cadastro das Unidades de Saúde da Família, de acesso aos serviços de saúde, cobertura de planos de saúde, entre outros temas. Realizada a cada cinco anos, a pesquisa contou com uma amostra de 108 mil domicílios em todo o país.
Entre os pontos abordados da pesquisa é possível destacar o aumento do uso de planos de saúde. Em 2013, 27,9% da população brasileira utilizava algum plano de saúde médico ou odontológico. Em 2019, o número chegou a 28,5%, o correspondente a 59,7 milhões de pessoas. “As estimativas da PNS 2019 apontam, também, uma relação direta entre a cor ou raça e nível de instrução e a cobertura de plano de saúde, destacando-se, nesse sentido, as pessoas brancas ou com ensino superior com as maiores proporções de cobertura. As proporções também se mostram bastante díspares quando considerada a condição de ocupação e as faixas de rendimento, o que pode ser um tanto previsível, dado que é necessário rendimento, poder de compra, para arcar com a despesa de saúde suplementar”, diz o relatório.
Para Ligia Bahia, sanitarista e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é interessante avaliar o dado de aumento de pessoas com planos de saúde em 2019 porque foi justamente um período de crise no país. “Isso é um fator preocupante que é preciso ser levado em conta. Estamos diante de uma crise e o uso de plano de saúde aumentando, enquanto o SUS com avanços a passos lentos”, aponta.
Outro fator que chama a atenção na pesquisa é que, apesar de 60% dos domicílios brasileiros estarem cadastrados em alguma Unidade de Saúde da Família, - um aumento de 6,7% em relação a 2013, quando eram 53,3%, - o número daqueles que receberam visita mensal de um agente comunitário de saúde ou membro da equipe de Saúde da Família diminuiu de 47,2% para 38,4%. “Apesar de os domicílios terem aumentando as equipes permanecem as mesmas ou diminuíram, o que representa, portanto, uma menor cobertura em números proporcionais”, explica o técnico do IBGE Leonardo Quesada.
De acordo com o estudo, dentre os domicílios cadastrados há um ano ou mais em uma unidade de Saúde da Família, pode ser observado que, em 2019, aproximadamente 23,8% nunca receberam visita de um agente comunitário de saúde ou de membro da Equipe de Saúde da Família, o que retrata um declínio de cobertura em comparação a 2013, quando esse percentual era 17,7%. “Esse aumento foi observado em todas as grandes regiões, destacando-se a região Sudeste, que atingiu 30,0% (quase 1 /3) de domicílios cadastrados que nunca receberam tal visita. O percentual da região Sul (28,6%) também foi superior à média nacional, enquanto, nas demais, variou de 16,4%, na região Nordeste, a 19,1%, na região Norte”, indica o relatório.
De acordo com o técnico do IBGE, em geral, a pesquisa mostrou a importância do SUS para a população brasileira, mas que seu crescimento está a passos lentos. “É possível perceber que alguns serviços do SUS não têm acompanhado o crescimento populacional”, avalia.
Ligia Bahia concorda com essa avaliação: “O que podemos interpretar é que o número populacional tem aumentado, enquanto o SUS não tem acompanhado esse mesmo movimento. De maneira geral, em relação ao SUS, tem pequenos avanços e recuos. O principal recuo é que diminui o número de visitas dos agentes. O que isso significa é que tem um impacto na qualidade da Saúde da Família. O número de pessoas com acesso é maior, mas os agentes visitam menos. Isso pode representar um certo grau de desorganização do sistema”, explicou Ligia.
A pesquisa mostra ainda que 86,1% das pessoas que procuraram algum atendimento de saúde conseguiram efetivá-lo, sendo que 73,6% afirmaram ter obtido na primeira vez em que procuraram. Esse número em 2013 era de 95,3%. A obtenção de todos os medicamentos receitados também declinou. Em 2019, apenas 30,5%, aproximadamente 6,2 milhões de pessoas, conseguiram obter, no serviço público de saúde, pelo menos um dos medicamentos prescritos no último atendimento de saúde, sendo que esses números apresentam variações entre as regiões. No Centro-Oeste essa taxa é de 24,9%, no Nordeste 28,9%, ambos com as menores proporções, enquanto a Sul apresenta a maior taxa, chegando a 36,2%. Em 2013 esse número nacional era de 33,2%.
Para Ligia, a redução do acesso imediato aos medicamentos significa um certo encolhimento do SUS. “No geral, temos que olhar com preocupação porque se pensarmos na última pesquisa, que é de 2013, o intervalo temporal é grande e os avanços, pequenos”, explica e conclui: “Se continuarmos no ritmo desses avanços nem no século 22 chegaríamos a uma situação razoável. A PNS permite que a gente veja grandes tendências, mas também que a gente veja se estamos dando conta de políticas específicas existentes”.
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SUS avança a passos lentos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU