Por: João Conceição e Marilene Maia | 07 Mai 2020
Como disse o economista Luiz Gonzaga Belluzzo em entrevista à IHU On-line, “os trabalhadores, assalariados ou informais, são o grupo de risco da pandemia econômica”. Na Região Metropolitana de Porto Alegre, 26% dos trabalhadores ocupados não contribuem para seguridade social e 23% estão na informalidade. Dos empregos formais criados no ano passado, mais de 60% são contratos intermitentes.
O Observatório da realidade e das políticas públicas do Vale do Rio dos Sinos - ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, acessou os dados do mercado de trabalho para Região Metropolitana de Porto Alegre. Disponíveis na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD, Síntese de Indicadores Sociais - SIS e no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED relativos ao período de 2019, sendo os últimos dados divulgados do mercado de trabalho.
A média dos rendimentos dos trabalhadores na Região Metropolitana de Porto Alegre alcançou R$ 2.434 no ano de 2019. O valor recebido é maior que a média do Rio Grande do Sul. Este fato pode ser explicado por serem os municípios mais próximos da capital, classificada como um dos centros econômicos do estado, onde a média dos rendimentos no município chegou a R$ 4.046.
As trabalhadoras domésticas sem carteira assinada constituíram a ocupação com o menor rendimento em 2019, R$ 1.045. A diferença desta mesma ocupação para trabalhadoras com carteira assinada aumenta o rendimento em R$ 468. A diferença também é significativa entre os trabalhadores do setor privado que possuem carteira assinada e aqueles sem carteira assinada. Os valores recebidos pelos formais são maiores em 20%.
Em relação à taxa de desocupação na Região Metropolitana de Porto Alegre, em 2019 ela atingiu 8,8% e a taxa de subutilização chegou a 15,2%. A última taxa é resultado do número dos trabalhadores desocupados, subocupados – aqueles que trabalham menos de 40 horas por semana e gostariam de trabalhar mais – e força de trabalho potencial, que é formada por pessoas que gostariam de trabalhar, mas não procuraram, ou procuraram, mas não estavam disponíveis para trabalhar.
No caso da força de trabalho potencial, consideram-se, por exemplo, as mães que estão fora do mercado para criar filhos. A soma desses três itens que formam a taxa de subutilização representa o número de trabalhadores que poderiam estar no mercado de trabalho. Neste caso, como será visto abaixo, os mais afetados pela subutilização são mulheres e jovens, ambos com a taxa de desocupação acima da média.
Como consequência, 26% dos trabalhadores ocupados não contribuíam para Previdência Social em 2019, um dos maiores percentuais da série histórica iniciada em 2012. O ano que teve mais trabalhadores contribuindo foi no terceiro trimestre de 2014, quando a taxa de desocupados era de 5,7%. De 2014 para 2019, com o aumento do desemprego para 8,8%, elevou-se também o número de trabalhadores que passaram a não contribuir para seguridade social, representando uma variação de 20%.
Esses números crescentes ao longo dos últimos anos têm como um dos seus determinantes o aumento do trabalho informal. No ano de 2019, 23% dos trabalhadores ocupados estavam na informalidade.
Os dados do ano de 2019 mostram uma frágil recuperação na contratação de trabalhadores formais, quando comparado com o início da crise econômica em 2015. A melhora no mercado de trabalho justifica-se pela contratação dos trabalhadores intermitentes, medida aprovada em 2017 durante o governo de Michel Temer na chamada reforma trabalhista.
Dos 4,9 mil postos de trabalho criados, pouco mais de 3 mil foram na modalidade intermitente. Isso significa que 61% das contratações em 2019 na Região Metropolitana de Porto Alegre foram intermitentes, sendo 1,9 mil trabalhadores contratados na modalidade não intermitente.
A média salarial dos trabalhadores intermitentes não passou de 3 salários mínimos mensais (R$ 2.964), sendo que 45% ganhavam até 2 salários mínimos (R$ 1.976) e apenas 677 trabalhadores ganhavam 3 salários mínimos em 2019.
Em relação à jornada de trabalho, todos foram contratados para uma carga horária de até 12 horas semanais, desempenhando atividades principalmente nos setores de serviços e comércio, especificamente em atividades ligadas a alojamento, alimentação, reparação e manutenção.
A escolaridade dos trabalhadores intermitentes é formada por 59% com ensino médio completo. Os trabalhadores com até ensino médio incompleto representam 33%. Apenas 242 trabalhadores estão cursando ou concluíram o ensino superior. Já a faixa etária desses trabalhadores é composta majoritariamente por pessoas com idade entre 18 e 24 anos.
A desigualdade de renda se manifestou nos dados relacionados aos trabalhadores no mercado de trabalho formal e informal, assim como em relação a sexo, cor e raça. Na Região Metropolitana de Porto Alegre, os homens recebiam no ano de 2019, em média, R$ 3.475 enquanto as mulheres registravam uma renda de R$ 2.434. Esta diferença representa 30% ou R$ 1.041 a menos que os trabalhadores do sexo masculino.
Se analisadas estas informações a partir da cor e raça, a desigualdade de rendimentos aumenta. Os trabalhadores brancos ganhavam aproximadamente R$ 3.210, ao mesmo tempo que assalariados autodeclarados pretos recebiam, em média, R$ 1.832 ou 43% a menos que os brancos.
Na comparação da taxa de desocupação entre homens (7,1%) e mulheres (10,6%), a diferença chega a 3,5 pontos percentuais, descrito acima. Analisando a taxa de desocupação jovem, o percentual foi de 17,2% no ano de 2019. Portanto, uma diferença de 8,4 pontos percentuais da média.
A quantidade de jovens porto-alegrenses que não estudavam nem trabalhavam aumentou de 2016 para 2018. No primeiro ano o valor era de 14% e passou para 16%. Em termos absolutos, 49 mil porto-alegrenses entre 15 e 29 anos não estudavam nem trabalhavam em 2018.
Observa-se que, em 2018 no município de Porto Alegre, os 10% da população que possuíam os maiores rendimentos recebiam 15,2 vezes mais que os 40% com os menores rendimentos. Em termos absolutos, a população com maiores níveis de renda recebia, em média, R$ 16.405 enquanto os cidadãos com os menores rendimentos recebiam R$ 1.080.
A desigualdade de rendimentos é um dado histórico para a capital. Em 2012, por exemplo, os ricos chegaram a receber 16 vezes mais que os mais pobres. Apenas no ano de 2015 a média de rendimento do grupo mais rico era 12,5 vezes maior que o grupo com os menores rendimentos, isto é, as médias se encontravam entre R$ 1.054 para o menores rendimentos e R$ 13.227 para os maiores rendimentos.
A pandemia vivenciada globalmente expõe inúmeras realidades que são estruturais e que determinam a vulnerabilidade ainda maior de alguns grupos populacionais. O Brasil escancara ameaças maiores da pandemia por conta deste flanco histórico que se revela pela renda. A análise dos dados disponíveis sobre os rendimentos da população antes ainda da Covid-19 pode contribuir para o planejamento de políticas públicas a serem garantidas na emergência e pós-pandemia.
A crise do trabalho é uma das áreas orientadoras da reflexão e ação do Instituto Humanitas Unisinos - IHU. Confira aqui algumas de nossas publicações sobre o tema.
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A desigualdade de renda antes da pandemia de Covid-19 na Região Metropolitana de Porto Alegre - Instituto Humanitas Unisinos - IHU